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Vista da vazia Plaza de Mayo no 44º aniversário do golpe de 1976 em Buenos Aires, em 24 de março de 2020| Foto: JUAN MABROMATA / AFP

Já faz uma semana, quando o relógio marca 9 horas da noite em Buenos Aires, milhares de pessoas se dirigem às janelas de suas casas e apartamentos para aplaudir. Aplausos seguidos do hino da Argentina, uma forma de agradecer aos médicos, enfermeiros e todo mundo que está na linha de frente do combate ao novo coronavírus.

Os aplausos precisam ser de dentro de casa, porque desde a última sexta-feira (20/03) a Argentina está em quarentena, o chamado isolamento social obrigatório. O decreto do presidente Alberto Fernández tem como principal objetivo conter a transmissão e o contágio em massa do coronavírus. A princípio vai durar até o dia 31 de março, mas o próprio presidente já sinalizou que pretende postergar o fim da quarentena em mais duas semanas.

Com isso, os argentinos tiveram que voltar a conviver com uma cena que assusta a muitos. Dezenas de controles policiais espalhados pelas cidades, homens do exército e da gendarmeria fiscalizando quem está na rua, imagens que remetem ao passado mais sangrento do país, a última ditadura militar, de 1976 a 1983.

Controle policial nas ruas da Argentina em tempos de coronavírus | Foto: Raphael Sibilla
Controle policial nas ruas da Argentina em tempos de coronavírus | Foto: Raphael Sibilla

O decreto presidencial prevê que apenas algumas pessoas possam circular livremente: agentes de saúde, pessoas que trabalhem com o abastecimento de alimentos, jornalistas, entre outras profissões. Os demais cidadãos só podem sair de casa para ir a mercados e farmácias próximos às suas residências. Ter a permissão não nos exime da abordagem policial. Por três vezes já tive os documentos solicitados para averiguar se não estava burlando a determinação. Em uma semana 6.430 pessoas foram detidas, e ao todo 201 mil pessoas foram flagradas descumprindo a quarentena, que além de serem multadas em até 79.180 pesos (R$6.200), poderão responder a um processo penal. A detenção ocorre em casos mais graves, pessoas que já foram identificadas com sintomas ou que são reincidentes.

Para evitar o ingresso de pessoas à capital, 59 dos 110 acessos à Buenos Aires estão com controles policiais, todas as principais autopistas estão bloqueadas. Mesmo assim, muita gente ainda tenta vir do conurbano bonaerense, região metropolitana de Buenos Aires, à capital. Filas com mais de 4 quilômetros de congestionamento já foram registradas nos controles policiais, mais de 600 carros foram apreendidos. Para evitar que médicos e enfermeiros passem horas na fila, eles têm uma faixa especial de circulação. “Nos primeiros dias médicos chegaram a ficar duas horas no congestionamento, por conta dos irresponsáveis que ainda vão pra rua”, disse Horacio Rodríguez Larreta, prefeito de Buenos Aires em entrevista ao canal Todo Notícia.

Rodríguez Larreta não foi o primeiro a usar um termo mais duro com quem não fica em casa, Alberto Fernández, presidente da Argentina, chamou de “tolos” os 20 mil argentinos que deixaram o país, quando ele já havia anunciado que havia um estado de emergência por conta do coronavírus. “O que mais me preocupa é a incompreensão das pessoas. Me preocupa que existam tolos que não entendam o risco que estamos passando”, até esta sexta-feira (27) são 587 casos confirmados no país e 13 mortes.

O reflexo dessa declaração é o rigor nas medidas anunciadas pelo governo. Além de ter sido o primeiro país da América do Sul a fechar as fronteiras, agora o governo suspendeu os voos de repatriação, ou seja, nem a Aerolíneas Argentinas e nem outras companhias poderão ir buscar os cidadãos que estão em outros países. Para isso o governo estuda uma maneira de ajudar financeiramente quem está fora da Argentina. Assim como já anunciou que no mês de abril irá disponibilizar 10 mil pesos (R$781) para quem trabalha na informalidade – calcula-se que 40% dos argentinos não têm emprego formal. O governo também irá pagar um auxílio de 5 mil pesos (R$390) para todos os profissionais da área de saúde, público ou privado, que estão trabalhando nessa crise.

 Avenida 9 de Julio praticamente sem carros | Foto: Raphael Sibilla
Avenida 9 de Julio praticamente sem carros | Foto: Raphael Sibilla

Apesar da insistência de alguns, a diferença nas ruas de Buenos Aires é gritante. A Avenida 9 de Julio, a mais famosa da Argentina, está praticamente sem carros; a Calle Florida, rua com centenas de lojas e que recebe milhares de turistas por dia, está há uma semana com as lojas fechadas, estima-se que o movimento na cidade caiu de 7 milhões de pessoas circulando diariamente para 250 mil. Alguns casos curiosos viraram notícia, como o de um cidadão chinês que foi notificado pela polícia por estar “caçando” Pokémon, no jogo virtual Pokémon Go, no centro da cidade, em plena quarentena.

Brasileiros na Argentina

Desde o fechamento das fronteiras, no dia 15 de março, muitos brasileiros têm encontrado dificuldades para voltar ao país. O Consulado do Brasil em Buenos Aires informou que mais de 200 pessoas já solicitaram ajuda para regressar. A princípio, quem tinha passagem comprada estava conseguindo voltar, mas agora com a suspensão total de todos os voos comerciais, muita gente está preocupada sem saber quando poderá deixar o país.

É o caso da estudante Emanuelle Reiznautt, do Rio Grande do Sul. Ela está em Buenos Aires estudando espanhol, tinha passagem comprada para o dia 10 de abril, tentou antecipar, mas não conseguiu, e agora não sabe até quando ficará na capital argentina.

“Depois que essa pandemia começou, minha mãe e eu tentamos fazer com que eu retornasse ao Brasil, mas não conseguimos. Ela ligou para a Gol, que foi a empresa que compramos a passagem, e para a Aerolíneas Argentinas, e nenhuma das empresas a atendeu. Até com o Ministério das Relações Internacionais do Brasil tentamos, mas não houve nenhuma resposta”, contou a estudante. Emanuelle cogitou voltar de ônibus, são 1.100km de estrada entre a capital argentina e Camaquã, no interior do Rio Grande do Sul, mas as fronteiras terrestres estão fechadas e as viagens de ônibus suspensas.

A cônsul-adjunto do Brasil em Buenos Aires, Paula Alexim, explicou que as autoridades brasileiras no país estão buscando uma solução. “O Consulado e a Embaixada do Brasil estão em permanente contato com as companhias aéreas e agências de aviação civil de ambos os países para informar aos brasileiros sobre a oferta de voos. Insistimos na importância de todos os brasileiros não residentes se cadastrarem em nossa página para serem constantemente informados sobre procedimentos, voos e os últimos desdobramentos dessa difícil situação”.

Conteúdo editado por:Isabella Mayer de Moura
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