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Entrevista

Gerardo Strada Sáenz, professor de Relações Internacionais e Ciências Políticas na Universidade Nacional de Lanus

Com a morte de Kirchner o partido Justicialista (governista, fundado por Perón) fica mais fraco?

Não, mas existe uma interrogação importante porque Kirchner, além de fundar o "kirchnerismo", também foi um líder que manejou toda a estrutura do que nós chamamos de "armação política", o que gera expectativa sobre quem vai encarar agora a construção política.

Cristina delegou essa responsabilidade ao ex-presidente, e agora pode haver disputas reais de poder entre os seguidores de Kirchner sobre quem vai dar essa nova direção e conduzir o partido.

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Milhares de argentinos se despediram na quinta-feira do ex-presidente Néstor Kirchner, peronista que dominou a política nacional na última década e cuja morte sacudiu o governo de sua esposa Cristina, de quem era o principal estrategista.

Kirchner, que governou a Argentina de 2003 a 2007, está sendo velado na Casa Rosada, onde uma multidão entristecida passa respeitosamente pela Sala dos Patriotas Latino-Americanos do palácio presidencial.

Cristina, vestindo luto rigoroso e ao lado dos filhos, Máximo e Florencia, passou horas de pé diante do caixão, recebendo gritos de solidariedade, aplausos e abraços de admiradores, mandatários e até do ex-jogador Diego Maradona.

Como uma guarda pretoriana, ministros, governadores, sindicalistas, artistas, legisladores, altos funcionários e dirigentes de organizações de direitos humanos rodearam o ataúde, assistindo à lenta passagem de milhares de admiradores.

Analistas políticos especulam que a morte dele - ocorrida na quarta-feira, aos 60 anos, por causa de um ataque cardíaco - abrirá uma luta pelo controle do Partido Justicialista (peronista), do qual ele era líder, e pode também começar uma surda batalha pela influência no governo de Cristina.

"Na frente política, o país entrou, do nosso ponto de vista, num período de incerteza significativa, enquanto os atores políticos chaves e os bastiões do poder político se realinham para preencher o vazio que deixou esse "peso pesado" da política, sem um herdeiro aparente", disse o economista Alberto Ramos, do Goldman Sachs.

A Casa Rosada ficará aberta ao público durante toda a noite para o velório. Na manhã de sexta-feira, o corpo será levado para a cidade de Río Gallegos, ao sul do país, onde Kirchner nasceu e começou sua carreira política.

Nos arredores da Praça de Maio, onde fica a Casa Rosada, manifestantes gritavam e pintavam frases de apoio à presidente, eleita com apoio do marido em 2007, e com mandato até dezembro de 2011. Especulava-se que Kirchner seria candidato a sucedê-la, e, agora, é possível que Cristina tente um segundo mandato.

"Néstor, sempre presente. Força Cristina", dizia um cartaz próximo a uma das portas do palácio, por onde entraram também líderes da oposição.

"Com ele se podia fazer tudo, ele deu trabalho, deu salário, ajudou os aposentados... Que Cristina não abaixe os braços, que continue como está indo", disse Ramona Delgado, dona de casa de 20 anos, vestida com uma camisa azul com os dizeres "Movimento Evita" (em alusão a Evita Perón).

Um telão na praça mostrava a imagem de Cristina, várias vezes aplaudida por pessoas de todas as idades - de crianças a idosos.

Apoio de líderes sul-americanos

Vários presidentes sul-americanos já chegaram a Buenos Aires para o velório de Kirchner, que era também secretário-geral do organismo regional da União das Nações Sul-Americanas (Unasul). O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a Buenos Aires no início da noite.

"A perda do companheiro Néstor é uma dor para mim, para o povo boliviano... a perda nos deixa órfãos", declarou, desolado, o presidente boliviano Evo Morales.

Rafael Correa, do Equador, disse que "a maior homenagem que podemos fazer a Néstor é ratificar nosso compromisso de construir esta pátria grande, esta América unida".

Os presidentes do Uruguai, o socialista José Mujica, e do Chile, o conservador Sebastián Piñera, acompanhados das respectivas primeiras-damas, também deram um caloroso abraço em Cristina. O colombiano Juan Manuel Santos chegou em seguida.

Considerado o político mais poderoso da Argentina nos últimos anos, Kirchner morreu na quarta-feira em El Calafate, na província de Santa Cruz.

Apesar de ele ter passado por duas cirurgias cardíacas nos últimos meses, a notícia da sua morte causou surpresa e consternação para os argentinos. A última internação dele havia ocorrido havia 45 dias.

"Fique tranquilo, Néstor, Cristina não está só. Estão os trabalhadores, que vamos cuidar dela", cantou um grupo de sindicalistas na Praça de Maio, cenário de históricas manifestações e festejos do povo argentino.

As bandeiras tremulam a meio-mastro, e o governo federal decretou luto oficial de três dias.

Durante seu governo, Kirchner colocou a Argentina no caminho de uma recuperação após uma profunda crise econômica entre 2001 e 2002. Implementou políticas estatistas e planos sociais, e teve os direitos humanos como prioridade, num país traumatizado por ditaduras militares.

Mas seu estilo agressivo, conflituoso e classificado como autoritário por seus adversários foi desgastando sua imagem desde que ele passou a faixa presidencial a Cristina, com quem se casou em 1975.

Refletindo as restrições dos mercados financeiros às políticas dele, os títulos da dívida argentina tiveram alta de 2 por cento na quinta-feira, depois de uma expressiva alta na véspera, após a notícia da morte de Kirchner. Analistas, no entanto, preveem uma reacomodação nos próximos dias.

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