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A presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen
A presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen| Foto: Reprodução / Facebook / Tsai Ing-wen

Taiwan conseguiu controlar as infecções por coronavírus desde o início da pandemia, tendo passado mais de 200 dias no ano passado sem registrar um único caso de Covid-19 em seu território. Mas um surto que começou no final de abril elevou o número de casos da doença no país para mais de 5 mil, resultando em um total de 78 mortes. Nesta sexta-feira, as autoridades de Taiwan registraram 19 mortes causadas pelo coronavírus, um número recorde para a nação.

O aumento de casos gerou mais demanda por vacinas anti-Covid, mas o governo de Taiwan relata dificuldades para comprá-las: além da escassez mundial do produto, há pressão por parte da China. Até o momento, a ilha de 24 milhões de habitantes recebeu cerca de 700 mil doses do imunizante da AstraZeneca, por meio do consórcio Covax, e menos de 1% de sua população foi vacinada.

Interferência de Pequim no contrato com a Pfizer/BioNTech

A presidente da ilha, Tsai Ing-wen, denunciou nesta semana que uma intervenção do governo da China impediu um acordo de Taiwan para a compra de vacinas contra Covid-19 da Pfizer/BioNTech. Segundo uma autoridade local, o acordo teria sido prejudicado por uma referência a Taiwan como "país" no contrato – a China alega que Taiwan faz parte de seu território.

"Taiwan estava perto de fechar o acordo com a fábrica alemã [BioNTech], mas por causa da intervenção da China, nós ainda não conseguimos assinar o contrato", denunciou Tsai em reunião do partido do governo na quarta-feira (26).

A presidente informou que Taiwan já havia fechado acordos com a AstraZeneca e a Moderna, e estava negociando com a farmacêutica alemã BioNTech para a compra das vacinas anticovid produzidas em parceria com a Pfizer. Essa é a primeira vez que Taiwan acusou Pequim diretamente de bloquear o acordo com a fabricante alemã, após especulações de que o governo chinês estava atrapalhando o processo.

Quando consultada pela imprensa sobre a questão, a BioNTech disse: "Nós geralmente não comentamos sobre discussões potenciais ou em andamento para o fornecimento de doses de vacinas".

A farmacêutica Shanghai Fosun assinou um acordo com a BioNTech no ano passado para o fornecimento das vacinas da Covid-19 à China continental, e ofereceu, em março deste ano, o suprimento de parte dessas doses para Taiwan, segundo noticiou o South China Morning Post. O acordo estabelecia que a Fosun teria direitos exclusivos de comercializar as vacinas na China continental, Hong Kong, Taiwan e Macau.

Nesta quinta-feira (27), o ministro de saúde de Taiwan, Chen Shih-shung, deu mais detalhes sobre o fracasso do acordo. Ele disse que Taiwan assinou o contrato com a BioNTech em janeiro, e que em seguida a empresa publicou um comunicado à imprensa sobre o acordo. Mas, horas mais tarde, a farmacêutica pediu que a referência a Taiwan como "país" fosse retirada do documento. Uma semana depois, a BioNTech disse que havia problemas com a cadeia de produção e que precisava de tempo para fazer ajustes, noticiou o jornal britânico The Guardian.

Em entrevista coletiva à imprensa na quarta-feira, o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, não comentou sobre as acusações de Tsai, mas disse que não havia impedimentos da China continental para que Taiwan obtivesse as vacinas. Pequim também acusou os líderes de Taiwan de sacrificar a saúde de sua população por causa de política.

Em um comunicado emitido pelo Escritório chinês de Assuntos de Taiwan nesta segunda-feira, as autoridades chinesas afirmaram que estavam preparadas para tomar “providências rápidas” para fornecer suas vacinas à “grande maioria dos compatriotas de Taiwan”. Porém, o governo independente da ilha, que também briga com a China para entrar na OMS, recusa a ajuda porque a vê como uma tentativa de Pequim de dividir a população local.

"O acesso de Taiwan a vacinas continua a ser atrasado pela interferência chinesa, enquanto eles insistem que devemos comprar as vacinas feitas na China", disse uma porta-voz do governo taiwanês.

Taiwan tem participado de negociações com os Estados Unidos para buscar receber parte das 20 milhões de doses que o país americano se comprometeu a doar ao mundo até julho. Porém, o representante dos EUA em Taiwan, Brent Christensen, em evento na quarta-feira indicou que o bom gerenciamento da pandemia em Taiwan faz com que a ilha não seja prioridade em relação a outros locais mais atingidos.

Por que os casos aumentaram e quais as medidas preventivas adotadas

Os casos de Covid-19 começaram a aumentar em Taiwan no fim de abril, em grandes cidades. De acordo com o levantamento da plataforma Our World in Data, da Universidade Oxford, em duas semanas, o registro de casos aumentou quase quatro mil porcento, embora os números absolutos sejam baixos, assim como a taxa de infectados diariamente (23 por milhão de habitantes – no Uruguai, por exemplo, são registrados mil casos por milhão de habitantes).

Especialistas afirmam que o aumento de casos provavelmente está ligado a um surto que ocorreu em maio em um hotel, onde uma equipe de pilotos chineses estava em quarentena. A variante britânica do coronavírus, B.1.1.7, foi identificada em amostras coletadas destes pacientes. Posteriormente a cepa se espalhou ainda mais, gerando outros focos da doença: uma unidade local do Lions Clube e vários clubes de entretenimento adulto (chamados de "casa de chá" e localizados no distrito da Luz Vermelha de Taipei).

Especialistas apontam que um relaxamento das medidas de proteção individual, devido à baixa incidência de casos, estão relacionadas ao ressurgimento da Covid-19 em Taiwan.

“Havia uma suposição geral, mesmo com pessoas apresentando sintomas, de que a probabilidade de ter Covid-19 era essencialmente zero”, disse à BBC News o professor Lin Hsien-ho, da Universidade Nacional de Taiwan. “Os médicos não estavam levando isso a sério, os hospitais não estavam alertas, não faziam muitos rastreamentos de contatos. Definitivamente, havia uma certa sensação de complacência”.

Com o aumento de casos, as autoridades da ilha tiveram que reforçar as medidas restritivas: o uso de máscaras é obrigatório, os restaurantes estão limitados ao atendimento “para viagem”, eventos religiosos foram cancelados, templos religiosos estão fechados, casamentos e funerais não podem ter convidados, escolas e espaços públicos não essenciais também foram fechados. Pessoas que estiverem circulando sem máscara serão multadas sem aviso prévio e lojas que não respeitarem as regras serão investigadas e punidas.

O alerta nacional vale, pelo menos, até metade de junho. Mas antes mesmo de o governo impor as medidas restritivas, a população reduziu a circulação por conta própria em algumas das principais cidades do país. Em meados de maio, a circulação no metrô de Taipei caiu 60%, várias lojas fecharam e pontos turísticos ficaram praticamente vazios.

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