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Soldado dos EUA ajuda a treinar forças nigerinas durante o Flintlock 2018, um exercício militar liderado por africanos, em Agadez, Níger, 12 de abril de 2018. Centenas de soldados americanos estão trabalhando febrilmente para completar um campo de 110 milhões de dólares que será usado para atacar extremistas no oeste e o norte da África, uma região onde a maioria dos americanos não tem idéia de que o país está lutando.  | TARA TODRAS-WHITEHILL/NYT
Soldado dos EUA ajuda a treinar forças nigerinas durante o Flintlock 2018, um exercício militar liderado por africanos, em Agadez, Níger, 12 de abril de 2018. Centenas de soldados americanos estão trabalhando febrilmente para completar um campo de 110 milhões de dólares que será usado para atacar extremistas no oeste e o norte da África, uma região onde a maioria dos americanos não tem idéia de que o país está lutando. | Foto: TARA TODRAS-WHITEHILL/NYT

Erguendo-se em um trecho estéril do cerrado africano, uma base de drones semiacabada representa a mais nova linha de frente da guerra global dos Estados Unidos travada nas sombras. 

Lá, centenas de funcionários da Força Aérea americana trabalham febrilmente para completar o campo de pouso de US$110 milhões que, quando terminado, será usado para perseguir ou atacar extremistas no oeste e no norte da África. A maioria dos norte-americanos nem sabe que os Estados Unidos estão em combate nessas regiões 

Perto da pista em construção, os Boinas Verdes do Exército estão treinando forças nigerinas para realizar ataques antiterrorismo e evitar emboscadas dos inimigos – como as que mataram quatro soldados americanos perto da fronteira com o Mali no final do ano passado. 

Juntas, essas missões paralelas refletem um crescimento não declarado de militares dos EUA fora dos campos de batalha do Iraque e do Afeganistão, muitas vezes com autoridades obscuras e pouca atenção pública, enviados a lugares remotos como o Iêmen, a Somália e, cada vez mais, a África Ocidental. 

Nos últimos anos, apenas no Níger, o Pentágono dobrou o número de tropas americanas, para cerca de 800 – não para conduzir missões de combate unilaterais, mas para lutar contra uma Al-Qaeda cada vez mais perigosa, contra o Estado Islâmico e até mesmo contra grupos extremistas vagamente associados a eles, com forças indiretas e ataques de drones. 

 "A base e os voos mais frequentes que a inauguração da pista vai permitir, nos darão muito mais consciência da situação e inteligência em uma região que tem sido um centro de atividade extremista e ilícita", explicou P.W. Singer, estrategista da New American, de Washington, que escreve muito sobre drones. "Mas também vai nos envolver mais em novas operações e batalhas que poucos americanos sabem que nossos militares estão travando." 

Administração Trump obscurece operações

 Questões sobre a possibilidade de os militares dos Estados Unidos, sob a administração Trump, estarem procurando obscurecer a expansão do escopo das operações na África surgiram em março, quando foi revelado que o país havia realizado quatro ataques aéreos na Líbia, entre setembro e janeiro, que o Comando África dos militares não havia divulgado na época. 

 Logo depois, os militares reconheceram, pela primeira vez, que os Boinas Verdes que trabalham com as forças nigerinas haviam matado 11 militantes do Estado Islâmico em um tiroteio que durou vários dias em dezembro. Nenhum americano ou nigerino foi ferido nessa batalha. 

 Mas o combate – assim como pelo menos dez ataques anteriores contra tropas dos Estados Unidos na África Ocidental entre 2015 e 2017, que também não foram relatados – ressaltou o fato de que as emboscadas fatais na Níger não são episódios isolados. As forças nigerinas e seus assessores americanos estão se preparando para outras operações importantes para eliminar militantes, segundo oficiais do Exército. 

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 Meses depois do ataque fatal em quatro de outubro, que aconteceu nos arredores a aldeia de Tongo Tongo, perto da fronteira com o Mali, o governo Trump está em uma encruzilhada importante na campanha global dos militares para combater o terrorismo. 

 Um caminho seria levar adiante a promessa de campanha do presidente Donald Trump de derrotar o Estado Islâmico e outras organizações extremistas, não apenas no Iraque e na Síria, mas no mundo todo. O outro seria sair e deixar mais combates para os aliados, como Trump disse que quer fazer na Síria, possivelmente cedendo terrenos muito disputados aos militantes. 

 Em abril, durante um exercício de contraterrorismo no centro-norte da Níger que atraiu quase dois mil militares de 20 países africanos e ocidentais, vários oficiais expressaram preocupações com o fato de que o compromisso dos Estados Unidos na África Ocidental poderia se tornar vítima do segundo caminho. 

 "É importante ainda ter o apoio americano para ajudar a treinar meus homens, ajudar com nossos déficits", explicou o coronel major Moussa Salaou Barmou, comandante das duas mil forças de Operações Especiais da Níger

 Em uma entrevista durante o exercício, o major general J. Marcus Hicks, chefe das forças de Operações Especiais dos Estados Unidos na África, afirmou: "Esta é uma apólice de seguro muito cara, mas acho que precisamos continuar pagando por ela". 

 Onde os oficiais americanos e nigerinos veem um aumento da segurança das operações com drones – para vigilância e ataques ou para proteger as patrulhas das forças especiais – outros temem um impacto potencialmente desestabilizador, que poderia fazer propaganda valiosa de recrutamento a uma série de grupos alinhados com a Al-Qaeda e com o Estado Islâmico, e capaz de aumentar a ameaça dos militantes. 

Eliminação de líderes terroristas

 "Eliminar líderes militares jihadistas por meio de operações com drones pode temporariamente desorganizar grupos insurgentes", explicou Jean-Hervé Jezequel, vice-diretor do projeto de África Ocidental do Grupo Internacional de Crises em Dacar, no Senegal. "Mas, no final, o vazio pode também levar ao surgimento de líderes novos e mais jovens, capazes de se engajar em operações mais violentas e espetaculares para garantir sua liderança." 

 Uma rara visita em abril à Base Aérea 201, o maior projeto de construção que engenheiros da Força Aérea já realizaram sozinhos, revelou vários desafios. 

 Os comandantes precisam enfrentar tempestades de poeira rodopiante, temperaturas escaldantes e demora na entrega de peças de reposição para equipamentos quebrados. Tudo isso conspirou para deixar o projeto mais de um ano atrasado e US$22 milhões acima de seu orçamento original. 

 Os oficiais dos Estados Unidos procuram acalmar os temores dos moradores locais de que a base, a apenas três quilômetros da cidade de Agadèz, possa ser alvo de ataques terroristas – e não uma guardiã contra ele. Circularam rumores de que as dezenas de caminhões que entravam e saíam dos portões fortemente protegidos todos os dias estavam secretamente roubando valiosas cargas de urânio. 

 Tivemos que superar algumas suspeitas e desconfianças", afirmou o tenente-coronel Brad Harbaugh, comandante do 724º Esquadrão Expedicionário da Base Aérea. 

Níger dá aval à base americana

 O governo da Níger aprovou a Base Aérea 201 em 2014. No último novembro, um mês depois da emboscada mortal, o governo do país deu ao Departamento de Defesa permissão para enviar drone armados a partir de Niamei, uma grande expansão do poder de fogo do Exército dos Estados Unidos na África. 

 Os drones MQ-9 Reaper, feitos pela General Atomics, serão levados para a Base Aérea 201 assim que a pista e os hangares estiverem prontos no começo do ano que vem, assim como várias centenas de tropas dos EUA. Cerca de metade dos 800 militares americanos na Níger – a segunda maior tropa dos Estados Unidos presente na África, perdendo apenas para os quatro mil militares de uma base permanente em Djibouti – trabalham aqui agora. 

Bill Roggio, editor do Long War Journal, um site administrado pela Fundação para a Defesa das Democracias que monitora ataques militares contra grupos de militantes, diz que mover as operações com drones para Agadèz tem duas vantagens principais. 

Primeiro, a base está localizada em uma região mais central para conduzir operações por todo o Sahel, uma vasta área no flanco sul do Saara que vai do Senegal ao Sudão e foi tomada por uma onde crescente de terrorismo e conflitos armados. 

Depois, Agadèz é mais isolada do que Niamei. Isso vai ajudar a manter as operações mais discretas e longe de olhares curiosos. 

"A base de Agadèz tem o potencial de se tornar o centro mais ativo de contraterrorismo na África", explicou Roggio. 

Eventualmente, o plano é entregar a Base Aérea 201 completamente para o Exército nigerino. As forças de segurança dos Estados Unidos e da Níger hoje fazem patrulhas conjuntas no terreno de 890 hectares. 

 Uma equipe de quatro civis liderada pelo capitão Andrew Dacey, ex-líder de pelotão de infantaria no Iraque, trabalhou em estreita colaboração com líderes civis, religiosos e dedicados à educação de Agadèz para ajudar a lidar com o alto desemprego e as escolas mal equipadas – falhas que os extremistas islâmicos podem explorar. 

 A equipe está ajudando as escolas locais a iniciar um curso de fabricação de peças de metal e madeira para que alunos adolescentes aprendam novas habilidades e forneçam carteiras reformadas às salas de aula. 

 "A base tem ajudado muito na nossa segurança e na nossa economia", afirmou Mahaman Ali, inspetor de escolas primárias da região, apontando para uma pilha de carteiras quebradas que serão consertadas. 

 Ainda assim, as dúvidas sobre o legado duradouro da base persistem.  E.J. Hogendoorn, vice-presidente do programa África do Grupo Internacional de Crises, de Washington, disse: "O uso de drones armados não vai fazer uma diferença estratégica. E pode até aumentar a hostilidade local aos Estados Unidos e ao governo central que fica na distante Niamei".

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