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Bernie Sanders: o que poderia acontecer
| Foto: AFP

Se os resultados da Superterça foram responsáveis por colocar os primeiros pregos no caixão da corrida pela candidatura presidencial de Bernie Sanders, as primárias de 10 de março, em Michigan, Mississippi, Missouri, Idaho, Dakota do Norte e Washington, podem ter fechado a tampa. A não ser que haja uma virada estupenda — que, em 2020, ainda não pode ser totalmente descartada —, Sanders morrerá na praia e Joe Biden será o candidato do Partido Democrata nas eleições presidenciais de novembro.

Antes de virar definitivamente a página da campanha de Sanders, vale a pena refletir sobre a bala da qual todos nós nos esquivaríamos com a sua derrota.

Vamos visitar a página de Sanders na internet para refrescar nossa memória. Segundo o candidato, uma pequena taxa tributária aqui e uma carga tributária dita mais justa ali financiariam, entre outras coisas: Medicare (sistema de seguros de saúde gerido pelo governo norte-americano) para todos, universidade de graça, cancelamento dos débitos estudantis, valores mínimos mais altos para os beneficiários da Previdência Social, creches para todos, fim da população sem-teto por meio de um programa massivo de construção de moradias. Além disso, Sanders procuraria implementar o Green New Deal, acordo que implica uma série de propostas econômicas para ajudar a combater as alterações climáticas e a desigualdade econômica, com seus próprios fluxos de gastos. A despesa geral, mesmo segundo o próprio cálculo do candidato, dobraria o tamanho do Governo Federal e — longe do que ele descreve como um “modesto” aumento de receita — exigiria uma carga tributária duas vezes maior do que a que Washington impõe hoje.

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Sanders já tentou explicar como planejava financiar essas grandiosas ideias. Ele dependeria de um imposto sobre transações financeiras, de um imposto sobre grandes fortunas e de um imposto sobre combustíveis fósseis. Promoveria também um aumento nos impostos de pessoas jurídicas e sobre a folha de pagamento de quem ganha salários acima da média. Qualquer análise objetiva levanta questões razoáveis sobre até que ponto esses impostos poderiam fornecer a quantia necessária para financiar as propostas de Sanders. No fim das contas, a única solução encontrada por ele foi a tributação severa.

A suposta aritmética pode ser encontrada no site de Sanders e é bastante direta, mas não contabiliza os custos de aumentar os valores mínimos da Previdência Social e de eliminar os gastos com saúde. O programa de construção para beneficiar pessoas sem-teto, por exemplo, custaria US$ 2,5 trilhões por dez anos. Garantir creche para todos acarretaria em outro US$ 1,5 trilhão, enquanto o cancelamento da dívida estudantil e a universidade gratuita custariam US$ 6,2 trilhões, ou cerca de US$ 620 bilhões por ano.

Enquanto isso, o Medicare para Todos — a um custo aproximado de US$ 47,5 trilhões ao longo de uma década — cobriria tanto os gastos com o enorme aumento de segurados quanto a cobertura de serviços adicionais prometidos por Sanders, como atendimento odontológico, oftalmológico, fonoaudiológico e de audiometria. Essa quantia representa mais do que o dobro do PIB anual do país, mas Sanders argumenta que a medida acabaria com a necessidade de outros programas federais e estaduais, como o Medicaid, voltado a famílias e indivíduos de baixa renda. Os consultores políticos de Sanders estimam essa economia em US$ 30 trilhões, fixando o custo líquido do Medicare para Todos em, ainda impressionantes, US$ 17,5 trilhões.

E depois vem o Green New Deal. Os programas decorrentes dele, segundo a campanha, custariam US$ 16,3 trilhões por uma década. Até parece pouco, visto que o acordo exige, entre outras coisas: renovar toda a estrutura do país para priorizar a eficiência energética, modernizar toda a rede elétrica, eliminar todas as emissões de gases de efeito estufa em dez anos e acabar com a necessidade de combustíveis fósseis, convertendo toda a nação à energia renovável durante o mesmo período.

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É preciso analisar dois pontos dessas reivindicações. Por um lado, o site de Sanders estima que os projetos do acordo criariam 20 milhões de “novos empregos bem remunerados e sindicalizados”. O site sugere que o imposto de renda de todos esses trabalhadores reabasteceria os cofres do Washington em US$ 1,3 trilhão e reduziria o custo líquido do acordo. Mas não fica claro de onde virão esses trabalhadores pagadores de impostos. Na última contagem, a força de trabalho dos EUA contabilizou 164 milhões de pessoas. Cerca de 96,5% já estão empregadas, o que deixaria cerca de 5,8 milhões disponíveis para novos trabalhos. A medida de Sanders, portanto, criaria 14,2 milhões de postos de trabalho ociosos. Talvez ele devesse ter feito planos para aumentar a força de trabalho necessária para preencher essa lacuna, ou explicado por que o trabalho que as pessoas realizam atualmente poderia ser abandonado com segurança.

Em relação ao custo, as estimativas da campanha deixam muitas dúvidas. Consideremos o plano de Sanders de renovar todas as estruturas dos EUA. Os dados mais recentes apontam que há, aproximadamente, 136 milhões de unidades habitacionais em todo o país. Se o custo por reforma fosse de US$ 12 mil por casa — valor bastante enxuto —, apenas a parte residencial do programa custaria US$ 1,6 trilhão. Isso já representa mais de um décimo da quantia total que Sanders atribui ao acordo — e é certamente uma estimativa baixa. Depois, há o custo de renovar todas as estruturas industriais e comerciais, além da modernização da rede elétrica e outros aspectos ambiciosos da proposta. Mesmo que aceitemos ingenuamente a cifra de Sanders — permitindo que os gastos se estendam por dez anos — essa parte do programa acrescentaria outro US$ 1,6 trilhão por ano, elevando o gasto anual total a cerca de US$ 4 trilhões — dobrando o orçamento federal e impondo um enorme ônus financeiro para a sociedade.

Combinado com o que o governo já gasta, os programas de Sanders aumentariam a necessidade de financiamento federal para cerca de 40% de toda a economia anual de US$ 21 trilhões gerada a partir do PIB. Segundo sua própria conta, seus programas deixariam os americanos com o suficiente para comprar mantimentos e sapatos novos para seus filhos, mas talvez não houvesse excedente suficiente para viajar para seu próximo comício — embora pareça que não haverão muitos mais.

© 2020 The City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês.

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