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Vigília  no bairro de Squirrel Hill em Pittsburgh, onde 11 pessoas foram mortas em um tiroteio em massa na Sinagoga da Árvore da Vida | Justin Merriman/The Washington Post
Vigília no bairro de Squirrel Hill em Pittsburgh, onde 11 pessoas foram mortas em um tiroteio em massa na Sinagoga da Árvore da Vida| Foto: Justin Merriman/The Washington Post

O homem que disse às autoridades que “só queria matar judeus" depois de um tiroteio em massa em uma sinagoga de Pittsburgh, nos EUA, foi descrito no domingo como um solitário que, fora da internet, mostrava poucos dos sinais de crueldade que exibia em comentários online cheios de ódio. 

Vizinhos conheciam Robert Bowers como o motorista de caminhão que raramente recebia visitas, mas que era gentil ao sair e entrar de seu apartamento no primeiro andar de um complexo no subúrbio de South Baldwin, em Pittsburgh. Seu perfil imperceptível tornou ainda mais assustador o papel que ele desempenhou no massacre que deixou 11 mortos, segundo os vizinhos. 

"Eles mostraram sua foto e eu senti um frio no estômago", disse Kerri Owens, que mora ao lado de Bowers há dois anos, ao lembrar o momento em que viu a foto dele no noticiário. "Eu fiquei angustiada sabendo que ele tinha estado a uma parede de distância de mim". 

No domingo, os investigadores terminaram de vasculhar a casa de Bowers enquanto continuavam examinando as únicas pistas do seu ódio: conversas na internet escritas sob o nome de Bowers que sugeriam uma mudança radical no último ano. 

Autoridades também identificaram as 11 vítimas que foram baleadas dentro da sinagoga. Os mortos incluíam uma mulher de 97 anos, um casal e dois irmãos, que assistiam ao serviço de sábado de manhã no momento em que o atirador apareceu com três pistolas e um rifle semi-automático AR-15 e começou a atirar. 

"Eles estão cometendo o genocídio do meu povo", disse Bowers a um oficial da SWAT após ser baleado e capturado, segundo uma denúncia criminal federal divulgada no domingo. "Eu só quero matar os judeus". 

Debate em meio a eleições

O prefeito de Pittsburgh, Bill Peduto, classificou o ataque como o "dia mais sombrio da história de Pittsburgh". Ele também contestou a sugestão do presidente Trump de que a sinagoga deveria ter guardas armados. 

"Não vamos tentar racionalizar o comportamento irracional", disse o prefeito democrata a repórteres. "Trabalharemos para erradicá-lo de nossa cidade, de nossa nação e de nosso mundo. O ódio não terá lugar em lugar nenhum". 

"A abordagem que precisamos analisar é como tiramos as armas – o denominador comum de todo tiroteio em massa nos Estados Unidos – das mãos daqueles que procuram expressar o ódio através do assassinato", disse ele. 

O comentário do prefeito ocorre em um momento em que os Estados Unidos discutem se teorias de conspiração e retórica política grosseiras, muitas vezes degradantes, são a causa dos atos violentos que estão ocorrendo na reta final da campanha eleitoral de meio de mandato. 

O tiroteio em massa em Pittsburgh aumentou ainda mais a discussão: os democratas afirmaram neste domingo (28) que os ataques incendiários de Trump aos rivais criaram um terreno fértil para aqueles que se inclinavam para o extremismo, enquanto Trump e seus aliados culpavam os meios de comunicação e ativistas progressistas por fomentar a agitação. 

Solitário

A promotoria federal dos Estados Unidos pedirá pena de morte para Bowers, de 46 anos. Ele vai ser indiciado por 29 crimes, incluindo obstrução do livre exercício das crenças religiosas – crime de ódio nos EUA – e uso de arma de fogo para cometer assassinatos. Bowers comparecerá perante um juiz nesta segunda-feira.

O ataque, o mais mortal contra judeus na história dos EUA, teve como alvo a congregação que é uma âncora da grande comunidade judaica de Pittsburgh, uma sinagoga a cerca de 25 minutos de carro da casa de Bowers. 

Vizinhos disseram que ele se mudou para o apartamento no modesto complexo de dois andares, onde os aluguéis de algumas unidades são de US$ 600 por mês, cerca de dois anos atrás. 

Quando ele se mudou, Bowers disse a Owens que era motorista de caminhão e não esperava ficar muito tempo em seu apartamento de um quarto, segundo ela. 

"Ele disse que precisava apenas guardar suas coisas",  contou Owens, que tem 30 anos. 

Não está claro por quanto tempo Bowers trabalhou como caminhoneiro, ou se ele tinha trabalhado com isso recentemente. Em setembro, um perfil com seu nome na rede social Gab publicou uma foto de seu caminhão em uma parada de caminhões em St. Louis.  Segundo o perfil, ela havia sido tirada em meados dos anos 2000. 

Owens contou que Bowers a cumprimentava às vezes. Ela também disse que nunca o viu com convidados. 

"Nós jogávamos conversa fora, mas ele parecia um cara normal, e essa é a parte assustadora", disse, acrescentando ainda que o viu pela última vez há alguns dias. 

"Eu apenas disse olá e ele disse olá, e foi isso", contou. 

Owens disse que a polícia local e agentes federais chegaram ao complexo de apartamentos por volta das 13h de sábado e pediu que todos os inquilinos deixassem o local. 

Os vizinhos contam que Bowers era um visitante frequente na casa de Cindy Odorisio, que, segundo eles, era parente de Bowers. 

John Boff, 58 anos, que mora em frente à casa de Cindy, disse que ela mora com um filho deficiente. Boff contou ainda que Bowers às vezes ficava na casa por longos períodos, motivo pelo qual os vizinhos presumiram que ele cuidava do homem com necessidades especiais.

"Ele era muito fechado", disse Boff sobre Bowers. "Ele saía e fumava um cigarro e voltava. Nunca dizia oi, tchau ou qualquer outra coisa". 

No Facebook, membros de um grupo de ex-alunos da Escola de Ensino Médio Baldwin, em Pittsburgh, disseram que Bowers cursou o segundo grau no final dos anos 80. Um colega de classe recordou dele como sendo "problemático" e outro escreveu que ele era um solitário que muitas vezes usava uma jaqueta militar verde. Outros disseram que não lembravam dele. Um postou uma foto do anuário mostrando-o com os cabelos na altura dos ombros e uma camiseta.

A polícia do subúrbio de Pittsburgh, em Dormont, onde Bowers viveu por um tempo, disse ao Pittsburgh Post-Gazette que eles estiveram “em contato” com Bowers várias vezes, a partir dos anos 90 até 2004.

Postagens racistas

O perfil discreto de Bowers contrasta fortemente com suas postagens na Gab, incluindo a conta deletada em que um usuário com o nome de Bowers comparou os judeus a Satanás e reclamou que o movimento "Make America Great Again" de Trump não teria sucesso enquanto os judeus "infestarem" o país. 

Leia maisO que é a rede social Gab e por que a direita brasileira está migrando para lá

Muitas de suas reclamações expressavam racismo contra afroamericanos, de acordo com uma análise das postagens coletadas pelo Network Contagion Research Institute, um grupo de pesquisadores que estuda o ódio na internet. Algumas incluíam insultos contra mulheres que mantinham relações com homens negros e outras eram ofensas diretas aos afroamericanos. Ele também publicou muitos posts que mencionavam forca, cordas e enforcamento.

Em fevereiro, ele postou um meme de um cartão do jogo Banco Imobiliário (Monopoly)  com imagens sobrepostas de Trump arrastando Hillary Clinton para a cadeia. Mas em maio ele escreveu que "não votou em Trump, nunca teve e nunca usou o boné MAGA" (em referência ao boné que o presidente americano usa com os dizeres “Make America Great Again”) . 

No início deste mês, ele repostou um meme sobre libertários que se juntaram ao movimento alt-right, que inclui nacionalistas brancos. O meme é uma figura de desenho animado que pensa ser um libertário conservador há apenas um ano, mas agora insiste na "execução em massa desses degenerados marxistas". 

"A sequência Libertarian-to-Far-Right (do libertarianismo à extrema direita) é algo real", afirma a postagem.

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