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Homem usando máscara visita loja oficial das Olimpíadas de Tóquio na capital japonesa
Homem usando máscara visita loja oficial das Olimpíadas de Tóquio na capital japonesa| Foto: AFP

Apesar de sua proximidade com a China, o Japão não vive o forte surto do novo coronavírus (Covid-19) que colocou grande parte da Europa e da América do Norte em quarentena. A situação atraiu atenção até mesmo de Jair Bolsonaro, que postou nas redes sociais um vídeo usando o país como exemplo para defender o fim da quarentena no Brasil.

Até 24 de março, o Japão teve 10 grupos de surtos, com cerca de 1.200 casos confirmados e 43 mortes. Os números são baixos, considerando que o país tem alta densidade populacional e maior densidade de idosos do mundo. Além disso, está em proximidade com a China, o epicentro da doença: em janeiro, cerca de 925 mil chineses viajaram ao Japão. Em fevereiro foram outros 89 mil.

Os números baixos do Japão são um sinal de que o país ainda não atingiu o pico da epidemia, segundo um estudo da Kyodo News baseado em dados de cerca de 680 pessoas cujas datas de infecção foram disponibilizadas pelo Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar do país até o dia 16 de março.

Falta de transparência?

O baixo número de casos confirmados de Covid-19 no Japão levantou suspeitas de que o governo estaria  maquiando os números. A justificativa é a de que essa não seria a primeira vez que o governo japonês faria algo do gênero: após o desastre nuclear de Fukushima em 2011, as autoridades inicialmente se recusaram a admitir o colapso do reator.

“Hoje, ainda há uma grande desconfiança em declarações oficiais”, pondera Barbara Holthus, socióloga do Instituto Alemão de Estudos Japoneses em Tóquio, em entrevista à DW.

Confira: Medidas drásticas na China reduziram disseminação do coronavírus

Os números oficiais, de acordo com orientações da Organização Mundial da Saúde, não incluem 712 pessoas que testaram positivo no navio de cruzeiro Diamond Princess em quarentena atracado em Yokohama. Sete pessoas que estavam na embarcação morreram.

Testagem baixa

O país tem capacidade para realizar 6 mil testes de diagnóstico de coronavírus por dia, mas só fez cerca de 14 mil testes até o momento. O número é 20 vezes menor que a Coréia do Sul, país vizinho afetado pela pandemia que estabeleceu políticas drásticas de mapeamento da doença e fez cerca de 248 mil testes.

“É difícil explicar de forma abrangente, pois isso varia em todo o país. Mas não está sendo feito o suficiente a meu redor, pelo menos”, afirmou recentemente Kentaro Iwata, professor de doenças infecciosas da Universidade de Kobe.

O Japão está usando apenas um sexto de sua capacidade de testar o coronavírus, segundo dados do governo. Apenas pacientes com os sintomas mais graves são testados. Como consequência, pode haver um número muito mais alto de casos não registrados.

“Só porque temos capacidade, isso não significa que precisamos usá-la totalmente”, disse Yasuyuki Sahara, funcionário do Ministério da Saúde, em entrevista coletiva. “Não é necessário realizar testes nessas pessoas que estão simplesmente preocupadas”, acrescentou.

A decisão seria uma estratégia do primeiro-ministro Shinzo Abe para apresentar o Japão como um país seguro e não perder os Jogos Olímpicos de Verão. A estratégia não funcionou, já que o Comitê Olímpico Internacional adiou o evento de qualquer maneira.

De qualquer forma, a decisão vai contra recomendação da OMS que os países precisam aumentar os testes de coronavírus. “Temos uma mensagem simples para todos os países: teste, teste, teste. Teste todos os casos suspeitos”, diz o chefe da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus.

Garantia de recursos

Por outro lado, o Ministério da Saúde do Japão afirma que o número de testes foi baixo porque procuravam picos nos casos Covid-19 para conter o vírus, em vez de realizar testes generalizados.

“O baixo número de testes tinha como objetivo garantir que os recursos de saúde continuassem disponíveis para casos graves de infecção”, pondera Sebastian Dow, cientista político alemão da Universidade de Tóquio.

De qualquer forma, a estratégia parece estar funcionando: quando a epidemia atingiu uma escola na ilha de Hokkaido, no Norte do país, a prefeitura fechou todas as escolas e declarou estado de emergência. Após três semanas, a propagação do vírus foi interrompida.

Leia também: Como os países da África estão lidando com o novo coronavírus

O governo informou que, por enquanto, apenas escolas em áreas sem pacientes com Covid-19 poderão abrir no início do novo semestre escolar em abril. Grandes eventos públicos continuam proibidos.

Por outro lado, o Japão permanece em alerta para visitantes estrangeiros, impedindo de entrar no país os visitantes sul-coreanos e cidadãos da União Europeia. Estrangeiros que moram no Japão podem retornar ao país, mas devem permanecer em quarentena por 14 dias após a chegada. A expectativa é que as medidas permaneçam em vigor até o final de abril.

Como resultado, o número de turistas estrangeiros no Japão já caiu 1,1% em janeiro de 2020 em comparação a janeiro de 2019. A expectativa é que o declínio no número de turistas continue nos próximos meses.

A tradição japonesa

Hábitos e tradições japonesas podem ser um fator contribuinte para a baixa disseminação do coronavírus no país, embora o impacto real desse fator seja difícil de ser mensurado. A etiqueta japonesa de saudação - se curvar em vez de apertar as mãos ou dar beijo no rosto - também contribuiu para retardar o surto, assim como a hábitos de higiene ensinados desde a primeira infância que incluem o uso de máscara facial em casos de sintomas de resfriado.

O país consome cerca de 5,5 bilhões de máscaras por ano, uma média de 43 por pessoa. Um  estudo recente realizado por médicos da Alemanha constatou que as máscaras diminuem a transmissão de gotículas ou aerossóis contendo partículas virais pelos usuários de máscaras. Como consequência, o Japão viu uma desaceleração não apenas da epidemia do Covid-19, mas também uma queda no número de pacientes com gripe desde o começo do surto do coronavírus.

Os hábitos podem contribuir para impedir a disseminação do coronavírus em pacientes assintomáticos.

“Uma vez que você tenha a infecção, ela pode permanecer dormente e com sintomas mínimos”, explica Tierno Jr., professor de microbiologia e patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Nova York.

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