• Carregando...
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, faz pronunciamento à nação sobre pandemia de coronavírus, 25 de março de 2020
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, faz pronunciamento à nação sobre pandemia de coronavírus, 25 de março de 2020| Foto: Kirill KUDRYAVTSEV / AFP

É comum em crises globais que as nações deixem disputas geopolíticas de lado e colaborem entre si. Alguns também veem a ajuda humanitária como uma oportunidade de melhorar a sua imagem no cenário internacional.

Parece ser o caso da Rússia e da China, que na pandemia de covid-19 têm enviado auxílio para os países do Ocidente mais afetados pela propagação do novo coronavírus, em ações que alguns analistas descrevem como sendo mais estratégias de publicidade do que altruísmo.

A Rússia mandou um avião com suprimentos médicos, incluindo respiradores e equipamentos de proteção individual, para Nova York, para ajudar os hospitais americanos no combate à covid-19. O representante da Rússia na Organização das Nações Unidas (ONU), Dmitry Polyanskiy, afirmou pelo twitter que o envio, que chegou na quarta-feira (1), era um "gesto de solidariedade com os nova-iorquinos que estão em uma situação muito difícil no momento".

O Kremlin afirmou que a Rússia ofereceu ajuda aos EUA devido à situação da epidemia no país, que atualmente tem o maior número de casos no mundo. "Trump aceitou agradecidamente essa ajuda humanitária", disse o porta-voz do governo russo, Dmitry Peskov, segundo a agência estatal russa RIA-Novosti.

O Departamento de Estado dos EUA em seguida enfatizou que o envio da Rússia não era de doações do país, mas sim de materiais comprados. "Após telefonema em 30 de março entre o presidente Trump e o presidente Putin, os EUA concordaram em comprar suprimentos médicos necessários, incluindo respiradores e equipamentos de proteção pessoal, da Rússia, que foram entregues à [agência de gestão de emergências] Fema em 1 de abril em Nova York", disse em comunicado a porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Morgan Ortagus.

Na semana passada, 15 aviões militares russos entregaram equipamentos médicos para a Itália, com o slogan "Da Rússia com amor". Autoridades italianas agradeceram o gesto, assim como cantores do país. Um vídeo de moradores cantando o hino da Rússia em um bairro italiano e imagens de italianos trocando bandeiras da União Europeia por bandeiras russas foram bastante reproduzidos pela mídia estatal russa, mesmo com relatos de que muitos dos “italianos agradecidos” eram na verdade imigrantes russos ou pessoas com conexões financeiras com a Rússia, como mostrou a BBC.

Curiosamente, a China havia anteriormente usado uma montagem em vídeo de italianos cantando o hino chinês em sacadas, segundo um jornal italiano que denunciou a manipulação.

A Itália é um dos países que mais sofrem as consequências da pandemia. Porém, quando a ajuda tão esperada chegou, os italianos viram que parte dos suprimentos não servia para o combate ao coronavírus.

"Dos suprimentos da Rússia, 80% eram completamente inúteis ou pouco úteis para a Itália. Em outras palavras, a entrega foi mais um pretexto", uma autoridade do governo italiano disse ao jornal italiano La Stampa, sob condição de anonimato. A autoridade disse que a entrega russa continha, por exemplo, equipamentos para desinfecção bacteriológica, entre outros, e não respiradores e equipamentos de proteção que estão em falta na Itália.

Ajuda chinesa

A China também tenta reverter a sua imagem negativa após ter sido acusada de ter negligenciado a epidemia durante o seu início. A estratégia do país asiático envolve o envio de profissionais de saúde e equipamentos a outros países - o que tem sido chamado de "diplomacia da máscara", e esforços de comunicação para promover a sua narrativa.

O país asiático enviou toneladas de equipamentos à Itália, incluindo pelo menos 70 respiradores. Porém, alguns analistas defendem que o auxílio poderia ser maior, já que a China, além de ser a origem da pandemia, tem uma grande capacidade industrial e concentra grande parte da produção mundial dos suprimentos médicos que estão em falta no momento. Em 2019, o país tinha 50% da capacidade global de produção de máscaras, por exemplo.

Parte dos materiais enviados da China para a Itália foram doados, mas alguns tiveram que ser comprados pelo país europeu.

Especialistas dizem que a China tem espalhado teorias da conspiração e desinformação sobre a origem do vírus. Recentemente, a mídia estatal da China sugeriu que o novo coronavírus surgiu na Itália, distorcendo as palavras de um médico italiano. Em entrevista em 19 de março, Giuseppe Remuzzi, diretor de um instituto de pesquisa farmacológica em Milão, disse que alguns médicos do norte da Itália se lembram de ter visto "pneumonias estranhas, muito severas, em pessoas mais velhas, entre novembro e dezembro".

O trecho da entrevista foi usado por meios estatais chineses para difundir a teoria de que o vírus teria origem italiana. Remuzzi disse ao Foreign Policy que "podemos ter certeza de que o vírus emergiu primeiro em Wuhan, onde provavelmente estava circulando por algum tempo antes de ter sido tornado público pela China". Ele explicou que as observações dos médicos italianos, não confirmadas, de casos de pneumonias no norte da Itália na verdade seriam um maior indicativo de que a China teria escondido os primeiros casos de covid-19. Testes genéticos confirmam que o vírus tem origem na China "sem sombra de dúvidas", dise Remuzzi à publicação.

Um relatório publicado pelo braço de política externa da União Europeia na quarta-feira afirma que a Rússia e a China empregam uma campanha de desinformação sobre a pandemia de coronavírus que pode ter "consequências prejudiciais" para a saúde pública pelo mundo.

O documento, publicado pela Divisão de Análise de Comunicações Estratégicas e Informações do Serviço de Ação Externa Europeu (EEAS), afirma que tanto atores estatais quanto atores apoiados pelo Estado buscam "explorar a crise de saúde pública para promover interesses geopolíticos, frequentemente desafiando diretamente a credibilidade da União Europeia e de seus parceiros".

Além da suposta campanha de desinformação, a Rússia tem dado demonstrações de força, realizando exercícios militares em fronteiras de países aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, afirmou que a aliança continua de prontidão e que não pode deixar a pandemia de coronavírus se tornar uma ameaça à segurança. Em coletiva de imprensa na quarta-feira, Stoltenberg alertou que adversários como a Rússia e grupos terroristas podem tentar explorar a situação e conduzir atividades hostis.

Coronavírus na Rússia

Nesta quinta-feira, Putin estendeu a ordem de ficar em casa até 30 de abril. “Nós ainda não passamos o pico da epidemia no mundo e nem em nosso país”, afirmou Putin. “Por causa disso, eu decidi prolongar os dias sem trabalho até 30 de abril”.

Na semana passada, Putin havia anunciado o fechamento das fronteiras e determinado que as pessoas que não trabalham em setores essenciais, como hospitais, mercados e farmácias, deveriam ficar em casa. O líder russo também afirmou que, nas restrições prolongadas como essa, os trabalhadores que estão em casa devem continuar a receber os seus salários.

O novo coronavírus já matou 30 pessoas na Rússia, que registrou 3.548 casos, segundo a Universidade Johns Hopkins.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]