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Mahout A Thay Lay monta o elefante desempregado Hsar Hlay, ao lado do filhote Mojito. | ADAM DEAN/NYT
Mahout A Thay Lay monta o elefante desempregado Hsar Hlay, ao lado do filhote Mojito.| Foto: ADAM DEAN/NYT

Arrastar troncos gigantescos para cima e para baixo nas encostas íngremes da mata fechada é um trabalho duríssimo, mas, segundo dizem os donos dos elefantes madeireiros de Mianmar, há algo ainda pior: não ter trabalho nenhum.

As florestas cada vez menores e uma lei promulgada há três anos, que proíbe a exportação de madeira bruta, geraram uma crise de desemprego em Mianmar: centenas de elefantes perderam a ocupação e não estão aceitando o fato muito bem.

“Eles ficam irritados com muito mais facilidade. Não há trabalho, então também começaram a engordar e todos os machos querem fazer sexo o tempo todo”, conta U Chit Sein, 64 anos, que tem oito animais que agora trabalham só alguns dias por mês.

Os elefantes ocupam uma posição quase mística em Mianmar, país que abriga a maior população cativa do mundo. Durante centenas de anos, eles ajudaram a extrair teca e madeira de lei de locais da selva aonde nem as máquinas modernas conseguiam chegar.

Agora o futuro de 5.500 paquidermes em cativeiro é uma das maiores preocupações das autoridades responsáveis por eles.

“É difícil lidar com a inatividade. O setor madeireiro acabou porque não tem mais árvores”, lamenta U Saw Tha Pyae, cuja manada de seis não tem o que fazer há dois anos.

Ma Hla Htay, um elefante de 45 anos que faz trabalhos temporários, arrasta um tronco de na floresta perto de Wa Kalu Pu.ADAM DEAN/NYT

O principal especialista do país, Daw Khyne U Mar, calcula que atualmente haja 2.500 elefantes desempregados, muitos deles aqui nas matas da porção oriental, a cerca de 2,5 horas da fronteira com a Tailândia. Esse número representa uma taxa de desemprego de cerca de 40 por cento, comparados com quatro por cento da população humana.

“A maioria dos bichos não sabe o que fazer. Os donos têm um problema e tanto porque, além de tudo, é caro mantê-los”, explica Khyne U Mar.

Quando adultos, chegam a pesar até 4,5 toneladas, consomem mais de 180 kg de alimentos por dia e, exceto pelos setores madeireiro e circense, têm oportunidades de emprego limitadíssimas.

Carregar lenha é puxado, mas os estudiosos garantem que o trabalho árduo é um dos motivos que mantém os elefantes de Mianmar relativamente saudáveis: segundo um estudo de 2008, os animais do setor do país vivem duas vezes mais que os espécimes mantidos nos zoológicos europeus, uma média de 42 anos dos primeiros em relação a 19 dos segundos.

Alguns chegam a viver muito mais. “Você vê elefantes de trabalho que vivem 50, 60 anos, tranquilamente; tudo é uma questão de alimentação e cuidados adequados”, afirma Joshua Plotnik, especialista comportamental tailandês.

Os elefantes são conhecidos por mostrarem um senso de objetividade no trabalho; consequentemente, a perda da atividade é desmoralizante.

“Não quero antropomorfizar, mas se tirar a atividade que os entretêm mental e fisicamente, a coisa fica bem difícil”, diz John Edward Roberts, diretor de um centro de resgate de elefantes, a Golden Triangle Asian Elephant Foundation, na Tailândia.

Elefante Ma Hla Htay em seu banho antes do trabalho na selva de MianmarADAM DEAN/NYT

Direitos trabalhistas

Para a maioria da população em Mianmar, a situação é favorável: a economia vem crescendo rapidamente e os cidadãos já gozem de novas liberdades depois de anos de uma ditadura brutal.

O despertar da democracia, porém, representa o reverso da fortuna para os elefantes: nas décadas passadas, enquanto os birmaneses, a população local, sofriam, a vida era indubitavelmente mais favorável aos animais.

O governo militar mantinha um esquema de trabalho rígido para os paquidermes, baseado nos tempos coloniais britânicos: oito horas/dia, cinco dias/semana, aposentadoria aos 55 anos, licença-maternidade obrigatória, férias de verão e assistência médica decente. Ainda existem, aliás, campos públicos onde as fêmeas dão à luz e vivem em comunidades de aposentados.

Em um país onde as proteções sociais mais básicas não existiram durante os tempos de ditadura, as leis do trabalho animal eram amplamente respeitadas, em parte porque um elefante estressado é extremamente perigoso, como dizem os tratadores.

Para cada animal do setor madeireiro deve haver um arquivo próprio, com histórico médico e de trabalho, sob os cuidados da Myanma Timber Enterprise, empresa pública mais conhecida pelas iniciais.

“Os elefantes do MTE que eu vi são supersaudáveis em comparação aos de outros países; seguem uma dieta natural, têm direito a pastar. As condições dos músculos e ossos são ótimas. Eles se exercitam bem”, atesta a Dra. Susan Mikota, diretora dos programas veterinários e pesquisa da Elephant Care International, instituição norte-americana dedicada ao bem-estar dos paquidermes.

Elefantes desempregados são levados a um acampamento perto na floresta de Wa Kalu PuADAM DEAN/NYT

Para Georgia Mason, uma das autoras do estudo de 2008, a obesidade é um dos principais fatores na baixa expectativa de vida dos animais de zoológico. Uma análise posterior mostrou que os filhotes nascidos nos zoos eram quinze por cento mais pesados que os dos campos de trabalho.

Volta à natureza

Como é provável que o número de elefantes desempregados aumente com o encolhimento das florestas e do setor madeireiro, o governo está explorando a possibilidade de devolver alguns animais à natureza.

De acordo com Simon Hedges, coordenador da Wildlife Conservation Society, organização de proteção animal norte-americana, essa é uma “oportunidade maravilhosa”, mas tanto ele como outros profissionais alertam para a necessidade de verificação e controle dos casos de doenças transmitidas aos animais selvagens e a invasão nos vilarejos em busca de comida.

Enquanto aguardam uma solução, os donos dos elefantes lidam com o desemprego de várias formas.

Alguns venderam a manada para empresários na Tailândia, onde serão usadas no setor do turismo, incluindo exibições e excursões pela floresta. A exportação sem permissão oficial é considerada ilegal, mas os proprietários garantem que ela ocorre com uma frequência cada vez maior.

Há também aqueles que não podem nem pensar em se separar dos animais.

“Não sei o que vou fazer com eles, mas nunca, jamais vou vendê-los! Amo demais meus bichos!”, desabafa Saw Tha Pyae que, como muitos proprietários, herdou o bando dos pais.

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