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Curitiba – A Conferência sobre Mudança Climática da ONU (Nações Unidas), encerrada no dia 17, em Nairóbi, no Quênia, pretendia discutir uma revisão do Protocolo de Kyoto. Após muita conversa, o assunto foi deixado para 2008. Um dos brasileiros presentes ao encontro, Marcos Aurélio Vasconcelos de Freitas, coordenador-executivo do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (Ivig), acredita que a pressão sobre os países em desenvolvimento está cada vez maior e que esse foi o grande motivo para o fracasso da redefinição do Protocolo na África. Por telefone, ele falou com a reportagem da Gazeta do Povo sobre a conferência e o desmatamento de florestas brasileiras, principal foco de emissão de carbono do Brasil e motivo de descontentamento no exterior.

Gazeta do Povo – A ambição da conferência em definir as linhas de um novo regime que entre em vigor no lugar do Protocolo de Kyoto, em 2012 era grande. Foi cumprida?Marcos Aurélio Vasconcelos de Freitas – Não houve nenhuma autorização (para a definição do novo regime), porque para poder mexer no Protocolo de Kyoto tem de haver consenso dos países em votá-lo. E países como o Brasil não aceitaram mexer no protocolo na fase atual.

Por quê?O motivo que o governo brasileiro alega é que como o Protocolo de Kyoto entrou em funcionamento no fim de 2004, seria muito cedo para fazer alterações. Até porque, uma vez aberta a negociação, você não sabe onde ela vai parar. Poderia inclusive acabar com o Mecanismo do Desenvolvimento Limpo (um dos instrumentos criados pelo Protocolo de Kyoto para ajudar os países desenvolvidos a atingir as metas de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa).

Qual foi, então, a questão mais debatida na reunião de Nairóbi?Foi uma conferência relativamente morna. Estou relatando o que ouvi das pessoas lá presentes, que foi uma negociação morna. A expectativa é que a pressão para a negociação de o que fazer após 2008 deve aumentar. Por enquanto ainda está se discutindo os avanços da própria aplicação do protocolo.Quais foram os avanços?A pressão está aumentando sobre os países em desenvolvimento, que não têm obrigações com o protocolo. Esse é um dos motivos que faz o Brasil não querer mexer no texto. Por enquanto, não há necessidade de ações nacionais, e se o pacto for alterado, o Brasil pode ser um país que passe a ter compromisso.

Qual foi a postura dos outros países em desenvolvimento?Há uma preocupação muito grande dos pequenos países, especialmente os insulares, que correm grande risco com a vulnerabilidade climática, por causa do nível do mar.

E as previsões dos biólogos e cientistas estavam mais ou menos alarmantes?O projeto de degelo tem tido os efeitos comentados na imprensa no dia-a-dia. Nos últimos dez anos, a medida da temperatura tem registrado que sete anos tiveram os piores indíces dos últimos 100 anos. Concomitantemente, há a subida do nível de mar. Há também uma preocupação considerável com o tema da água potável. Acredita-se que o crescimento do nível do mar também aumente a salinidade em alguns pontos das costas e dos rios que deságuam nas regiões costeiras.

Os EUA têm uma posição importante no tema, como eles estavam representados na conferência?Como não assinaram o protocolo, os EUA estão em posição de observador, com manifestações isoladas apenas. Os protagonistas certamente eram a União Européia e os grandes países em desenvolvimento, como o Brasil, China, Índia. Estes também são países cobrados em razão da capacidade de emissão, seja por desmatamento (Brasil) ou por queima de combustível fóssil (Índia e China).

Então não está na hora de o Brasil também colocar algum mecanismo de redução de emissão em prática?O Brasil tem duas situações. A primeira é o desmatamento da Amazônia, que é o tema mais sério. Cerca de 80% das emissões brasileiras têm sido por causa do desmatamento da Amazônia. Até 1960, havia 97,6 mil quilômetros de área desmatada. Hoje são 600 mil quilômetros. É um saldo de 500 mil quilômetros em 40 anos, o que causa grande preocupação. A outra situação é o lado positivo. Por ser um país agrícola e de muita disponibilidade hídrica, o Brasil pode pensar em manter a grande contribuição que dá com o uso de energia renovável.

O Brasil levou alguma proposta para a reunião?Sim, para a redução do desmatamento da Amazônia. A proposta se baseia numa taxa média de desmatamento num certo período. O governo brasileiro não apresentou um número fechado de prazo nem de taxa, mas apresentou alguns gráficos, mostrando que o Brasil teve uma taxa média de desmatamento de 20 ou 22 mil quilômetros nos últimos dez anos e com os esforços recentes conseguiu baixar para algo na ordem de 15 mil. Esses 15 mil significariam uma redução nas emissões brasileiras e o país poderia ser favorecido de um fundo, que logicamente seria criado entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Aqueles que conseguissem reduzir suas taxas de desmatamento abaixo da sua linha média, seriam beneficiados de alguma maneira. Houve uma recepção boa, principalmente por parte das ONGs, nacionais ou não, como o Greenpeace e o WWF (World Wildlife Fund), que consideraram um passo positivo o Brasil ter colocado a floresta na discussão. É uma coisa que o governo brasileiro antes não fazia. Mas ainda é pouco. O Brasil precisaria ser um pouco mais incisivo.

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