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Falta de água na Venezuela, após apagão prolongado
Venezuelanos fazem fila para ter acesso à água após o apagão nacional, em 13 de março de 2019 | Foto: FEDERICO PARRA / AFP| Foto:

Depois de quase uma semana do pior apagão de sua história, a energia elétrica foi majoritariamente restabelecida na Venezuela. Nesta quinta-feira (14), as atividades laborais estão sendo retomadas, embora as aulas continuem suspensas por mais 24 horas e o ditador Nicolás Maduro tenha pedido à população que faça uso racionado do serviço até que ele seja estabilizado.

Na noite de quarta-feira (13), o regime de Nicolás Maduro anunciou que a energia elétrica havia retornado a todo território venezuelano. A informação, porém, foi contestada pelo presidente interino Juan Guaidó, líder da oposição. Segundo ele, quatro estados ainda estavam sem luz: Zulia, Portuguesa, Apure, Nueva Esparta e Monagas. Em Caracas, o metro voltou a operar parcialmente.

O apagão teve início no fim da tarde de quinta-feira passada (7) e atingiu cerca de 90% do território nacional. Em algumas áreas, como na capital, o serviço ficou intermitente durante esta semana, enquanto algumas cidades registraram mais de 100 horas seguidas sem luz. Os dias mais críticos foram sexta, sábado e domingo, quando, segundo organizações não governamentais e a oposição, pelo menos 17 pessoas morreram em hospitais e clínicas devido à falta de energia –15 delas por não conseguirem fazer hemodiálise, segundo a Codevida.

Enquanto a energia retornava, aos poucos, para a região central do país, um efeito colateral do apagão resultou em medidas desesperadas de cidadãos mais vulneráveis: a falta de água. Em uma região pobre de Caracas, pessoas faziam fila para pegar água em um rio poluído, a fim de suprir algumas necessidades básicas. O regime organizou uma distribuição de água com caminhões-tanque em todo o país, mas as filas que se formavam eram imensas, segundo relatos da imprensa. O serviço de água também voltou a ser restituído, mas de forma precária em quase todo o país. Segundo a oposição, o estado de Delta Amacuro ainda registrava falta do fornecimento de água na quarta-feira (13). O regime afirma que 80% das casas já têm água em suas torneiras.

Perdas financeiras

Uma estimativa realizada pela consultoria venezuelana Ecoanalítica aponta que o apagão causou a perda de cerca de US$ 200 milhões para a economia venezuelana. "Calculamos uma perda de US$ 875 milhões" até terça-feira (12), afirmou o diretor da Ecoanalítica, Asdrúbal Oliveros, ao jornal Efecto Cocuyo. Ele explicou que isso se deve à paralisação das atividades produtivas do setor privado e da indústria petroleira.

Durante o período, a produção de petróleo despencou e foi completamente paralisada em algumas partes do país. A empresa de consultoria Energy Aspects disse aos seus clientes, na segunda-feira (11), que a produção de petróleo no país havia caído temporariamente para 500 mil barris por dia, enquanto a produção diária de janeiro estava na casa de 1,1 milhão. Foi mais um choque para a PDVSA, somando-se aos efeitos das sanções americanas ao petróleo venezuelano, que segundo o banco de investimentos britânico Barclays, deve causar uma queda de 50% nas importações do petróleo venezuelano a partir de março.

Efeitos negativos do apagão também foram registrados no comércio e na agricultura. A Federação Nacional de Pecuaristas da Venezuela (Fedenaga), informou na terça-feira (12) que as perdas deste setor produtivo ultrapassaram US$ 11 milhões. No comércio, além de muitos estabelecimentos estarem fechados durante a última semana, centenas de saques foram registrados em todo o país. Somente no estado de Zulia, a associação empresarial Fedecamaras contabilizou pelo menos 460 estabelecimentos, como mercados, padarias e farmácias, prejudicados por causa de invasões coletivas e furtos.

O que realmente causou o apagão

Como tudo na Venezuela, a causa do apagão tem duas versões: a do regime chavista e a da oposição. Maduro defende que o sistema energético da Venezuela sofreu seguidos ataques cibernéticos desde quinta-feira passada, em uma sabotagem que teria sido armada pelos Estados Unidos e seus aliados na Venezuela.

A explicação foi refutada por especialistas do setor energético, mas com base nesta retórica, o serviço de inteligência do regime, o Sebin, prendeu o jornalista Luis Carlos Díaz, crítico de Maduro, no início da semana, sob acusação de incitação ao crime e suspeita de que ele tenha alguma ligação com a alegada "sabotagem". Ele foi liberado, com medidas cautelares, e não pode deixar o país. Um engenheiro que trabalhava na Corpoelec, a estatal de energia elétrica, está desaparecido desde segunda-feira. Há suspeitas de que Geovany Zambrano Rodríguez também tenha sido preso pelo Sebin.

A versão defendida pela oposição se baseia em relatórios de engenheiros eletricistas. Segundo os especialistas do setor, houve um incêndio perto da subestação Malena, o que ocasionou aumento da temperatura em três linhas de transmissão de 765kv. Isso fez com que o sistema de proteção da subestação fosse acionado – semelhante ao que acontece quando disjuntores fazem cair a luz de casa quando há algum problema. A consequência disso foi um aumento da velocidade no eixo das turbinas da hidrelétrica de Guri, a maior do país. Com as turbinas girando mais rápido, a frequência elétrica aumentou acima dos esperados 60 Hz.

Para contornar a situação, segundo aponta o engenheiro Julio Molina Guzmán, diretor da escola de Engenharia da Universidade Central da Venezuela, os sistemas de proteção de Guri atuaram e desconectaram os geradores gradualmente, mas o bloqueio que ocorreu na subestação Malena foi tão grave que foi impossível controlar o aumento da frequência, obrigando os técnicos da hidrelétrica a desligar todos os geradores. As hidrelétricas de Macagua e Caruachi, do sistema do baixo Caroní, também pararam de funcionar. Juntas, elas fornecem entre 85% e 90% da energia que o país necessita. O restante é fornecido por termelétricas, mas seu funcionamento também foi prejudicado porque elas estão conectadas ao sistema nacional de energia. Essa série de eventos teria levado ao apagão nacional de 7 de março, embora a origem do incêndio não tenha sido explicada.

Segundo Guzmán, um problema como este poderia ter sido resolvido dentro de 4 a 6 horas se a Corpoelec dispusesse de equipamentos, materiais, sistemas de comunicação em funcionamento e pessoal qualificado. O apagão, porém, seguiu por pelo menos cinco dias e há cidades em que a energia elétrica ainda não foi restabelecida.

Exercícios militares

Apesar das opiniões técnicas, o regime chavista se apegou à sua versão de sabotagem e com base nela colocou militares para vigiar subestações, hidrelétricas e instalações de tratamento e distribuição de água. Na noite de quarta-feira (13), o ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, anunciou que as Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB) vão realizar exercícios militares neste fim de semana para proteger unidades estratégicas do sistema elétrico nacional.

"A fim de reforçar a vitória de nosso povo diante da agressão contra as linhas de transmissão, o presidente Nicolás Maduro ordenou às Forças Armadas Nacionais Bolivarianas que realizassem os exercícios Ana Karina Rote neste sábado e domingo para proteger as pessoas e instalações estratégicas", tuitou Lopez.

Os chavistas consideram que, mesmo tendo demorado quase uma semana, o restabelecimento da energia elétrica é uma vitória do regime.

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