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Homem se escora em parede com graffiti do presidente Chávez | Geraldo Caso/AFP
Homem se escora em parede com graffiti do presidente Chávez| Foto: Geraldo Caso/AFP

Entrevista

"Novo presidente deve governar para todos os venezuelanos"

María Teresa Romero, professora da Escola de Estudos Internacionais da Universidade Central da Venezuela.

O que mudaria nas relações internacionais da Venezuela com uma vitória de Henrique Capriles?

Mudaria totalmente de rumo porque Capriles propõe uma política exterior verdadeiramente de Estado, não como a atual do presidente Chávez, que não é essencialmente uma política de governo, mas um projeto político ideológico que não atende os interesses de todos nós venezuelanos. A proposta de Capriles prevê uma política exterior apegada à Constituição, ao direito internacional, aos princípios democráticos, à proteção dos direitos humanos e de pluralismo democrático. O candidato da oposição tem disposição de respeitar os tratados internacionais, porém renegociar aqueles que não trazem benefícios para o país, assim como de continuar com nossa política tradicional de cooperação e solidariedade internacional, especialmente petroleira, mas em termos de ganhar-ganhar, quer dizer, proveitosa para ambos os lados, não em detrimento do interesse venezuelano. Como consequência, deixará de dar presentes aos países politicamente alinhados, como tem feito o atual governo.

Como se dará o ingresso da Venezuela no Mercosul?

Será um processo difícil, seja com Capriles ou com Chávez na Presidência. O ingresso apressado da Venezuela no bloco, sem consentimento do Paraguai, cedo ou tarde será revisado. Ademais, para que a entrada no Mercosul traga realmente benefícios, o novo governo venezuelano terá de empreender uma completa política nacional de recuperação econômica, geração de emprego e diversificação das exportações em virtude das assimetrias existentes entre a economia venezuelana e a do resto dos integrantes do bloco. Também será difícil porque entrar no Mercosul implica na adoção do arranjo externo comum do bloco. Isso significa que o próximo governo venezuelano terá de revisar e negociar as taxas que a Venezuela cobra das importações de outros países – em especial aos membros da Comunidade Andina – em um prazo de quatro anos, conforme fixado no protocolo de adesão.

Quais são os principais desafios do próximo presidente?

A governabilidade é o maior desafio, ganhe Capriles ou Chávez, especialmente se a vitória de qualquer dos lados for apertada, não ampla, porque a Venezuela é uma sociedade polarizada, dividida. Assim, o novo presidente deve governar para todos os venezuelanos, sem sectarismos nem exclusões, para poder ter um piso de governabilidade e minimizar os protestos e violência social. No social, sem dúvida, o principal desafio é o combate à pobreza e à desigualdade. As políticas de Chávez não têm sido suficientes; apesar de serem populares, há muito descontentamento diante do aumento da criminalidade e da delinquência no país.

Países como Cuba, Nicará­­gua e Guatemala devem estar preocupados com a possibilidade de a oposição vencer as eleições de amanhã na­­ Venezuela. Isso porque o­­ candidato oposicionista Hen­­rique Capriles promete – e até colocou como meta em seu plano de governo – o fim dos "presentes" dados pelo governo de Hugo Chávez em todo o mundo.

Entre os regalos – como se diz em espanhol – distribuídos por Chávez, o destaque é a venda a preços preferenciais de milhares de barris de petróleo por dia à Cuba (115­­ mil barris) e a países da Amé­­rica Central. Capriles diz que não só cortará as doações como também revisará todos os acordos bilaterais feitos pelo governo.

"O candidato da oposição­­ tem disposição de respeitar­­ os tratados internacionais, porém vai renegociar aqueles que não trazem be­­ne­­fí­­cios­­ para o país. Como con­­sequên­­cia, deixará de dar pre­­­­­­sentes aos países politi­­ca­­mente alinhados, como tem­­­­­­ feito o atual governo",­­ diz­­ a professora María Te­­re­­sa­­ Romero, da Escola de Es­­tu­­­­dos Internacionais da Uni­­ver­­sidade Central da Vene­­zue­­la.

As mudanças na política de relações exteriores com uma vitória de Capriles não se darão apenas com o corte das doações, segundo analistas. A previsão é de um novo arranjo regional, com o país se reaproximando do Chi­­le, Colômbia e Estados Unidos. A Alian­­ça Bolivariana para­­ as Américas (Alba), composta por um bloco alinhado ao bolivarianismo criado por Chávez, com destaque para Bolívia, Equador e Cuba, sofreria um sério impacto.

"A Alba não é um bloco­­ de integração, como diz o­­ governo. É um sistema clien­­te­­lista, em que países de­­pen­­dentes da ajuda da Ve­­ne­­zue­­la aderem ideologicamen­­te em troca de auxílio. Esse esquema tem que mudar, ou a Alba tende a desaparecer com uma vitória da oposição na Venezuela", diz Adolfo Salgueiro, especialista em Direito Internacional e membro da equipe do programa de governo de Capriles.

Na lista de doações do governo e criticada por Capriles está até um patrocínio de US$ 930 mil à escola de samba carioca Unidos de Vila Isabel, feito pela PDVSA, a estatal petroleira.

O governo rebate e diz que não são doações, mas acordos que também trazem benefícios à Venezuela. No caso de Cuba, foram enviados à Venezuela cerca de 30 mil médicos, que são responsáveis pelo atendimento primário da população, algo parecido com o médico de família. Há ainda dentistas e professores de educação física, entre outros profissionais, trabalhando nas favelas e bairros mais pobres.

Na relação com países con­­siderados inimigos dos EUA, como o Irã, enquanto o governo propõe ampliar o intercâmbio, Capriles defende o rompimento das relações.

Brasil

As trocas com o Brasil não serão afetadas com Ca­­priles na Presidência, mas para alguns analistas existem pontos que serão revistos.

"Não há razões para mudar. Os dois países tem boas relações, a presidente Dilma Rousseff tem sido prudente, democrática e menos radical que Lula. O que precisa ser feito é a correção dos desequilíbrios no comércio bilateral. Hoje a balança comercial é muito favorável ao Brasil, o que é ruim para os venezuelanos", observa Salgueiro.

Nos bastidores chavistas a tese de equilíbrio na balança comercial também tem respaldo, mas o governo propõe uma maior troca de investimentos e aposta no Mercosul para abrir as portas aos produtos venezuelanos.

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