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O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, saindo de Downing Street
O ex-primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, saindo de Downing Street.| Foto: EFE/EPA/NEIL HALL

No discurso de renúncia, Boris Johnson lamentou "ter que deixar o melhor trabalho do mundo" e disse ter orgulho de como comandou o Reino Unido, citando a campanha contra o coronavírus, a rápida distribuição da vacina e o acordo pós-Brexit. O anúncio foi feito em Londres, às 13h (9h da manhã, no horário de Brasília).

"Esta é a vontade do Partido Conservador", declarou Johnson, dizendo que os colegas do partido o forçaram a se retirar. O ex-premiê concordou em renunciar da presidência do partido nesta quinta-feira (07), após 50 funcionários deixarem o governo nos últimos dias, três deles nas últimas 24 horas. O político reforçou que tentou argumentar contra sua própria renúncia nos últimos dias, mas não obteve apoio dos legisladores.

Um de seus aliados mais próximos, o chefe do Tesouro, Nadhim Zahawi, pediu ao primeiro-ministro que renunciasse "pelo bem do país". “Primeiro-ministro: isso não é sustentável e só vai piorar: para você, para o Partido Conservador e o mais importante: para todo o país”, disse Zahawi em carta a Johnson.

A secretária de Relações Exteriores, Lizz Truss, um dos principais nomes sondados como possíveis substitutos a Johnson, anunciou que a renúncia foi o melhor escolha para o Reino Unido.

Durante o discurso, Johnson declarou que pretende seguir no comando do Reino Unido até outubro, se o partido permitir, até que a próxima liderança assuma o cargo. Chris Loder, parlamentar do Partido Conservador se opõe à proposta. "O governo não pode funcionar sem ministros e espero que o vice-primeiro-ministro tome posse em breve até as próximas eleições", publicou Loder no Twitter.

Quase três anos no poder

Boris Johnson, de 58 anos, permaneceu no poder por quase três anos, apesar das críticas que o rodeavam. Mas revelações recentes de que Johnson sabia das alegações de assédio sexual contra o legislador Chris Pincher, antes de promovê-lo, foram a gota d'água.

Johnson assumiu como premiê britânico no final de julho de 2019, a pedido da rainha Elizabeth II, que o convidou para formar um gabinete, depois dele ter assumido a liderança do Partido Conservador.

"Quero dizer às milhões de pessoas que votaram em 2019, muitos votando nos conservadores pela primeira vez, obrigado por esse mandato incrível, a mais extensa maioria conservadora desde 1987, a maior parcela de votos desde 1979", declarou Johnson na despedida.

Antes de anunciar a renúncia, o político, que se tornou uma das figuras mais controversas do Reino Unido, vivenciou importantes momentos como executivo britânico.

Pós-Brexit

Uma das principais promessas de Johnson em 2019 era fazer a completa saída do Reino Unido da União Europeia, que havia sido aprovada em referendo em 2016 e passava por transição. No final de 2020, o novo acordo com o bloco foi assinado.

No entanto, um ano e meio após o novo contrato com a União Europeia, o cenário se tornou desfavorável para a economia britânica: as exportações para o bloco despencaram, houve crise na cadeia de abastecimento e longas filas nos postos de gasolina.

As novas regras na relação entre Reino Unico e UE entraram em vigor em janeiro de 2021, com a exigência de formulários alfandegários de quatro páginas para todas as mercadorias e certificados sanitários para carnes e laticínios. Consequentemente, as exportações britânicas de alimentos para o bloco caíram 25% em 2021, segundo a agência de estatísticas da UE, a Eurostat.

Partygate x Lockdown

O Reino Unido se envolveu em um escândalo político em meio ao pico da pandemia de coronavírus. Funcionários do governo e do partido de Johnson fizeram 14 festas em 2020 e 2021, quando as restrições de saúde pública proibiram a maioria das reuniões.

Em maio deste ano, a funcionária pública Sue Gray apresentou um documento de 60 páginas descrevendo esses encontros. Apesar de não ser apontado como o organizador das reuniões, Johnson foi filmado em uma das festas e o relatório aponta que líderes públicos incentivaram o desrespeito às regras.

“Muitos desses eventos não deveriam ter acontecido”, diz o relatório. “Quem exerce a liderança sênior [o primeiro-ministro] deve assumir a responsabilidade”. Gray detalhou que em uma das festas, realizada em junho de 2020, houve “consumo excessivo de álcool” e briga entre os participantes.

Em outra festa, celebrada na noite anterior ao funeral do príncipe Phillip, em abril de 2021, os participantes ficaram até a madrugada e quebraram um balanço na sede do governo, segundo descreve o documento. “O público tem o direito de esperar os mais altos padrões de comportamento em tais lugares e claramente o que aconteceu ficou muito aquém disso”, conclui o relatório.

Os escândalos se tornaram mais graves porque as festas aconteceram durante os três grandes movimentos de lockdown em Londres, descredibilizando as rigorosas medidas de contenção da doença impostas pelo executivo britânico.

Chris Pincher e assédio sexual

Mas o estopim da movimentação para a saída de Johnson do poder se deu após os escândalos relacionados ao parlamentar Chris Pincher. Desde então, a quantidade de funcionários do governo que pediram demissão chegou a 50.

Pincher, até então responsável pela disciplina parlamentar dos deputados conservadores, demitiu-se após alegações de que teria assediado dois homens sexualmente, fora outras denúncias de crimes sexuais. A pressão para que fosse expulso do grupo parlamentar, visto que se manteve como deputado, era grande e Boris Johnson passou a ser ainda mais pressionado pelo partido no começo desta semana.

Relação com oligarcas russos e KGB

Um dos mais recentes escândalos envolvendo Boris Johnson foi a relação próxima com um oligarca russo, ex-oficial da KGB. Segundo os parlamentares britânicos, Johnson afirmou que se encontrou com Alexander Lebedev sem a presença de autoridades. O ex-primeiro-ministro britânico tornou o filho de Lebedev, Evgeny, membro da Câmara dos Lordes.

A nomeação foi feita mesmo após avisos dos serviços de segurança de que Evgeny Lebedev representava risco à segurança nacional. A KGB soviética era a principal rival dos serviços de segurança ocidentais na Guerra Fria, e o presidente Vladimir Putin também era um oficial da KGB.

Renúncia repercute no mundo

"Obrigado, Boris Johnson, por ter compreendido a ameaça do monstro russo e ter sempre se colocado à frente do apoio à Ucrânia e ter sido responsável nos momentos mais difíceis", tuitou o conselheiro da presidência ucraniana, Mykhaïlo Podoliak. Durante o discurso de renúncia, Johnson disse: " eu adoraria poder dizer ao povo da Ucrânia que seguiremos ao lado deles".

A diplomacia ucraniana anunciou que o presidente do país, Volodymyr Zelensky, telefonou a Johnson dizendo que recebeu a notícia "com muita tristeza" e que "toda a sociedade ucraniana simpatiza" com o político britânico.

Já o primeiro-ministro irlandês, Michael Martin, considera a renúncia de Johnson "uma oportunidade de retornar ao espírito de parceria e respeito mútuo", conforme publicou no Twitter.

Michel Barnier, negociador do Brexit do lado da UE, avalia que a renúncia de Johnson "abre uma nova página" entre o bloco europeu e o Reino Unido, ressaltando que agora as relações deverão ser "mais construtivas e respeitosas".

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