Na última quarta-feira (19), a Suprema Corte dos Estados Unidos anunciou que vai ouvir o caso Dobbs v. Organização da Saúde Feminina de Jackson. Esse caso pode se tornar um marco na luta contra o aborto nos Estados Unidos, pois vai examinar a constitucionalidade de uma lei estadual aprovada em 2018 pelo parlamento do Mississippi que proíbe o aborto após a 15.ª semana de gestação.
O tribunal normalmente inclina-se a rejeitar pedidos desse gênero, e há portanto uma expectativa de que a nova composição da corte, de maioria conservadora devido às indicações do ex-presidente Donald Trump, possa reverter a atual jurisprudência, estabelecida em 1973, conhecida como caso Roe v. Wade. A decisão sobre o caso do Mississippi deve sair até junho de 2022.
No território americano existem leis estaduais ainda mais restritivas, que vetam o aborto até a sexta semana, mas estas legislações estaduais normalmente não são aplicadas, porque segundo a Roe v. Wade o aborto deve ser permitido em nível federal enquanto o feto não esteja em fase de sobreviver fora do útero materno (aproximadamente entre 22 e 23 semanas de gestação).
Normalmente o que acontece é que as legislações estaduais mais restritivas acabam sendo vedadas nos tribunais federais regionais e aguardam uma decisão na Suprema Corte, que até então relutava em analisar qualquer caso.
Mesmo sabendo que as leis não serão aplicadas, as legislaturas dos estados mais conservadores não pararam de promover e aprovar leis mais restritivas.
Exemplo disso aconteceu na última quarta-feira quando o governador do estado do Texas, Greg Abbott, sancionou uma lei que proíbe o aborto depois que o batimento cardíaco fetal seja detectado, ou seja, a partir da 6.ª semana de gestação. A lei também prevê exceções para algumas emergências médicas, mas não para casos em que a mulher engravidou como resultado de estupro ou incesto.
A lei texana tenta contornar um provável bloqueio em tribunal, dispensando as autoridades estaduais de aplicarem a lei, mas permite que qualquer cidadão processe clínicas ou indivíduos que facilitem a realização de abortos. A lei deve ser contestada de qualquer forma.
Estados que aguardam decisão da corte
Mas por que os estados continuam aprovando leis se sabem que há uma probabilidade grande de serem barradas nos tribunais?
Basicamente as legislaturas esperam que um dia a jurisprudência atual seja revista e as leis estaduais possam ser aplicadas, fortalecendo assim as legislaturas estaduais. Essas leis são chamadas de trigger laws [leis de gatilho], ou seja, leis que aguardam uma revisão no ordenamento jurídico para que possam entrar de fato em vigor.
O Center for Reproductive Rights (uma organização pró aborto) constatou que 24 estados teriam leis aprovadas e prontas para entrar em vigor se Roe v. Wade caísse, ou tivesse seu alcance diminuído, e que poderiam ser utilizadas para restringir ou proibir abortos: Idaho, Utah, Arizona, Dakota do Norte, Dakota do Sul, Nebraska, Oklahoma, Texas, Wisconsin, Michigan, Missouri, Arkansas, Luisiana, Mississippi, Alabama, Geórgia, Carolina do Norte, Carolina do Sul, Tennessee, Kentucky, Indiana, Ohio, Virgínia Ocidental e Pensilvânia.
Curiosamente, o estado da Flórida, que recentemente tem ganhado destaque no meio republicano por conta de seu governador, Ron DeSantis, não conseguiu aprovar leis nesse sentido, apesar dos movimentos legislativos recentes.
Futuro incerto de Roe v. Wade
Embora as esperanças do movimento pró-vida tenham se reacendido com a entrada do caso Dobbs v. Organização da Saúde Feminina de Jackson na pauta da Suprema Corte, não é certo que a composição atual da corte vai reverter a jurisprudência atual.
Segundo reportagem do LifeSiteNews, dos juízes conservadores da corte, apenas Clarence Thomas é visto como “anti-Roe”. E somente ele e o juiz Samuel Alito mantêm consistentemente um registro de decisões conservadoras.
Dos três juízes indicados pelo ex-presidente Donald Trump, Neil Gorsuch e Brett Kavanaugh expressaram em suas audiências de confirmação que a Roe v. Wade tem status de precedente. Portanto, não se sabe ao certo até que ponto estariam dispostos a alterar o princípio de stare decisis da Common Law (no ordenamento jurídico inglês, isso significa algo como “aquilo que foi decidido deve ser respeitado”).
Já Amy Coney Barrett tem um histórico pró-vida, mas em sua audiência não disse especificamente se votaria para derrubar a jurisprudência atual.
Teremos de esperar o próximo ano, véspera dos 50 anos da Roe v. Wade, para a sentença que pode revisar uma das decisões mais controversas da Suprema Corte americana.
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