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Frasco de vacina contra Covid-19 da Pfizer/BioNTech em Hanói, Vietnã, 7 de outubro
Frasco de vacina contra Covid-19 da Pfizer/BioNTech em Hanói, Vietnã, 7 de outubro| Foto: EFE/EPA/LUONG THAI LINH

Uma ex-diretora da Ventavia, empresa de pesquisas clínicas dos EUA, relatou ao British Medical Journal (BMJ) supostas irregularidades ocorridas durante os testes clínicos com a vacina contra Covid-19 da Pfizer em unidades da empresa no estado americano do Texas. Entre as irregularidades descritas pela ex-funcionária estão supostos problemas com o gerenciamento de laboratórios, integridade de dados e segurança dos pacientes, o que traz questionamentos sobre os resultados dos testes da vacina feitos por essa companhia terceirizada.

A Ventavia foi contratada para conduzir uma pequena parte dos testes da vacina da Pfizer, e os problemas relatados estariam limitados aos três locais gerenciados pela terceirizada. Esses testes, em setembro de 2020, envolveram cerca de mil participantes, de um total de 44 mil participantes em 153 centros. A partir de dezembro de 2020, a vacina da Pfizer foi aprovada em diversos países e desde então já foi aplicada em centenas de milhões de pessoas pelo mundo. Com isso os pesquisadores têm uma grande quantidade de dados que demonstram a eficiência e segurança das doses no "mundo real".

Segundo a reportagem publicada na terça-feira (3), Brook Jackson, que trabalhou por duas semanas como diretora regional da Ventavia, forneceu ao BMJ documentos internos, fotografias, gravações de áudio e e-mails que comprovariam as irregularidades. A publicação, no entanto, não divulgou os documentos.

Em uma das fotos vistas pelo BMJ, diz a publicação, agulhas estavam descartadas na sacola de materiais com risco biológico, e não na caixa para descarte de materiais perfurocortantes, que seria o local correto. Em outra imagem, embalagens de vacinas com números de identificação dos participantes estavam à mostra, o que potencialmente poderia ter revelado o status de participantes - em ensaios clínicos do tipo "duplo-cego", nem o participante e nem o aplicador sabem se a pessoa está recebendo vacina ou placebo, um procedimento adotado para reduzir vieses nos resultados de pesquisas.

Jackson disse à publicação que, durante as duas semanas em que trabalhou na empresa, em setembro de 2020, ela alertou repetidamente seus superiores sobre problemas com dados, com a segurança de pacientes e com o gerenciamento de laboratórios, mas que eles não trataram das questões. Ela então enviou uma reclamação à Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA) dos EUA, agência federal regulatória do país, em 25 de setembro de 2020, e foi demitida pela Ventavia no mesmo dia.

Em seu e-mail enviado à FDA, Jackson escreveu que a Ventavia cadastrou cerca de mil participantes para os testes clínicos em suas três unidades. O ensaio clínico completo do imunizante teve cerca de 44 mil participantes em 153 locais, envolvendo diversos centros acadêmicos e empresas.

Segundo o BMJ, entre as preocupações listadas pela ex-diretora, estão:

  • Participantes foram colocados em um corredor após a injeção e não estavam sendo monitorados pela equipe clínica;
  • Falta de acompanhamento pontual de pacientes que tiveram reações adversas;
  • Desvios de protocolo não relatados;
  • Vacinas que não foram armazenas em temperaturas adequadas;
  • Amostras de laboratório com etiquetas erradas;
  • Repreensão a pessoas da equipe que relataram esses tipos de problemas.

Horas depois, o FDA respondeu Jackson, agradecendo-a e dizendo que não poderia comentar sobre qualquer investigação que poderia resultar das denúncias. Alguns dias depois, a ex-diretora recebeu uma ligação de um inspetor do FDA, que gostaria de discutir os relatos e disse que não poderia oferecer outras informações sobre o assunto.

Em agosto deste ano, ao conceder a aprovação total da vacina da Pfizer, o FDA publicou um resumo das inspeções da agência sobre os testes. Nove dos 153 locais de testes foram inspecionados pela agência federal americana, mas os centros da Ventavia não estavam entre eles.

Uma porta-voz da Ventavia disse em comunicado à imprensa que está investigando as alegações feitas por Jackson.

"A Ventavia leva a conformidade da pesquisa, a integridade dos dados e a segurança dos participantes muito a sério e apoia o seu importante trabalho de suporte ao desenvolvimento de vacinas que salvam vidas e está conduzindo sua investigação de acordo com isso", diz o comunicado.

Supostas irregularidades

Segundo Jackson, o status dos participantes do ensaio duplo-cego pode ter sido revelado precocemente nos centros da Ventavia. Ela disse que a informação sobre o grupo do participante (placebo ou vacina) estava em fichas que podiam ser acessadas pela equipe que não deveria ter acesso a esse dado naquele momento. Uma medida corretiva foi tomada em setembro, dois meses após o início do recrutamento dos voluntários, ainda segundo o relato dela à BMJ.

Na gravação de uma reunião entre Jackson e dois diretores da Ventavia em setembro de 2020, um executivo pode ser ouvido explicando que a empresa não estava conseguindo quantificar os tipos e números de erros encontrados nos exames dos documentos de controle de qualidade. "Na minha cabeça, há algo novo todo dia", disse o executivo.

Um e-mail enviado pela organização de pesquisa ICON, parceira da Pfizer no ensaio clínico, cobrava a Ventavia por mais agilidade ao lidar com questões que surgiam durante os testes, segundo o BMJ. "A expectativa para esse estudo é de que todas as questões sejam abordadas em 24 horas", escreveu a ICON no e-mail, em seguida destacando mais de 100 questões registradas em três dias ou mais.

Paul D. Thacker, o autor da reportagem no BMJ, disse ter falado com dois ex-funcionários da Ventavia, sob condição de anonimato, que "confirmaram os aspectos em geral da queixa de Jackson", segundo ele.

"Eu não acho que era dados bons e limpos", disse uma funcionária sobre os dados gerados pela Ventavia no ensaio da vacina da Pfizer.

Vacina da Pfizer contra coronavírus no mundo

A vacina da Pfizer é uma das mais usadas no mundo para a imunização contra a Covid-19. O imunizante recebeu aprovação definitiva no Brasil, Estados Unidos, Canadá, Suíça, Nova Zelândia, entre outros, e tem autorização para uso emergencial na União Europeia, Organização Mundial da Saúde (OMS), e dezenas de países.

Desde dezembro de 2020, quando a vacina da Pfizer começou a ser usada após receber autorização para uso emergencial no Reino Unido, seguido por outros países, mais de 417 milhões de doses do imunizante foram aplicadas na União Europeia, e mais de 248 milhões nos Estados Unidos, segundo levantamento do Our World in Data.

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