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Mulher compra medicamentos em farmácia em Havana, 28 de junho. Cuba enfrenta uma grave escassez de medicamentos que afeta principalmente a população mais vulnerável
Mulher compra medicamentos em farmácia em Havana, 28 de junho. Cuba enfrenta uma grave escassez de medicamentos que afeta principalmente a população mais vulnerável| Foto: EFE/ Yander Zamora

Cuba está sofrendo com uma preocupante escassez de medicamentos: as despensas de farmácias e hospitais da ilha estão praticamente vazias e a população está mais vulnerável do que nunca a doenças como diabetes, artrite e sarna.

A indústria de biotecnologia avançada de Cuba e seu relativo sucesso na luta contra o coronavírus (com menos de 1.300 mortes no total) contrastam com a situação da saúde pública no país, onde quem adoece não tem remédio para se tratar.

"Simplesmente não há", disse à Agência Efe um jovem médico de um consultório no município de Playa, em Havana.

E como é possível tratar pacientes sem antibióticos, analgésicos ou outras drogas mais específicas? "Inventando, fazendo mágica", respondeu seu companheiro mais veterano, explicando que os poucos remédios ainda disponíveis são reservados para os doentes em situação mais grave.

Artrite e sarna

Maria, de 74 anos, sofre de artrite reumatoide e polineuropatia há quase três décadas, doenças degenerativas que ela conseguiu conter com injeções de complexo de vitamina B e cloridrato de tiamina.

Como as duas soluções desapareceram das prateleiras das farmácias em meados do ano passado, ela só conseguiu injetar os medicamentos algumas vezes graças à ajuda de um vizinho que a apoiava. Mas nem isso foi suficiente, segundo comentou à Efe.

"A artrite em sua última fase envolve infiltrações e não existe tal medicamento, então a articulação continua inflamada e a dor é horrível. Mas o que vamos fazer? Não há remédios", lamentou Maria.

Tampouco há anti-histamínicos, ansiolíticos ou antidepressivos e nenhum vestígio de pílulas anticoncepcionais ou preservativos, segundo confirmaram à Efe os gerentes de várias farmácias em Havana.

Outra grande ausência é a permetrina, que trata a sarna. A doença ressurgiu fortemente no último ano, causando surtos recorrentes em toda a ilha e provocando pedidos de ajuda nas redes sociais de pessoas afetadas que não encontram o medicamento.

Cuba culpa o embargo

Cuba classifica 619 medicamentos como básicos, dos quais 359 são produzidos na BioCubaFarma, empresa estatal de biotecnologia.

"Em 2021 estamos ficando sem suprimentos e matérias-primas e a média mensal de faltas é de 120 medicamentos", reconheceu a vice-presidente da BioCubaFarma, Tania Urquiza, em uma entrevista recente.

Urquiza responsabilizou o embargo financeiro e comercial dos Estados Unidos pela situação, uma vez que encarece a aquisição de medicamentos, tecnologias, matérias-primas e equipamentos, dificulta transações com terceiros países e o acesso a financiamentos externos para pesquisa e desenvolvimento, entre outros prejuízos.

"Tudo isso em meio a uma crise econômica internacional, onde a indústria e a logística globais entraram em colapso, dificultando o transporte para Cuba de todos os insumos e matérias-primas necessárias para pesquisar e produzir medicamentos e vacinas", argumentou.

Ao ser consultada pela Efe, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) referiu-se à pandemia como a principal causa do problema da falta de medicamentos em Cuba.

"A maior parte das matérias-primas, peças de reposição e outros componentes necessários à produção de medicamentos vem da região asiática, fortemente impactada pela pandemia de Covid-19. Essa situação tem gerado atrasos na chegada desses bens, tanto pelos problemas da redução da produção nesses países como pela interrupção do transporte aéreo e marítimo", declarou a organização.

Além disso, Cuba está atolada em sua maior crise econômica em mais de duas décadas, com um forte déficit na balança de pagamentos e sem condições de fazer frente à sua dívida externa, o que se traduz em escassez não só de medicamentos, mas também de quase todos os alimentos e produtos básicos.

Cooperação, contrabando e a providência

Uma das receitas para superar a escassez é a solidariedade. "Se eu tenho aspirina e um vizinho precisa, eu dou a ele e vice-versa. Nós nos ajudamos, porque por muitos motivos não temos as coisas de que precisamos. Agora vivemos assim", disse María.

Além das trocas pessoais - existem grupos de WhatsApp e Telegram dedicados exclusivamente para o intercâmbio de medicamentos em Cuba -, existem redes colaborativas organizadas por emigrantes cubanos na Espanha ou nos EUA para coletar medicamentos e enviá-los por meio de indivíduos nos poucos voos que operam para a ilha.

Em um desses voos, a insulina e as tiras de teste de glicose chegaram para o marido e o filho diabéticos de Nuria, uma trabalhadora autônoma de 44 anos.

Menos altruístas são outros métodos, como o contrabando. Uma caixa de paracetamol, um antibiótico, um anticoagulante ou um tubo de creme antifúngico podem ser vendidos por um preço até dez vezes mais caro que o original em grupos do Facebook ou sites de vendas.

Se os métodos acima falharem, apenas a providência permanece. É o caso de Nuria, que já considerava impossível encontrar Carbidopa + Levodopa para a mãe que sofre com Parkinson.

"Fazia um ano e meio que não achávamos esse remédio. No fim, conseguimos encontrá-lo há um mês, porque faleceu o parente de um amigo que sofria de Parkinson e tinha muitas reservas", contou.

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