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Foto de arquivo tirada em 11 de setembro de 2019 mostra uma mulher caminhando com uma criança no colo em um bairro étnico uigur em Aksu, na região noroeste da China, Xinjiang| Foto: HECTOR RETAMAL/AFP

Havia algo de repugnante para os telespectadores que viram o embaixador chinês no Reino Unido, Liu Xiaoming, ser entrevistado em um programa de bate-papo político das manhãs de domingo no país. O Reino Unido tomou medidas, como outros países europeus, para construir uma rede 5G sem a ajuda da empresa chinesa estatal Huawei. O apresentador do programa, Andrew Marr, mostrou um vídeo feito por drone no ano passado que mostrava centenas de prisioneiros vendados e algemados, provavelmente da etnia uigur, alinhados diante de vagões de trem na província de Xinjiang. Nenhum telespectador instruído poderia olhar para essas filmagens sem pensar nos vagões de trem da Segunda Guerra Mundial, carregados na Alemanha, Romênia e Hungria para alimentar os campos da morte.

Questionado sobre as imagens que estavam sendo exibidas, o embaixador chinês praticamente deu de ombros, afirmando que não sabia o que estava sendo retratado ou de onde vinha o vídeo. E, acrescentou, os estados precisam transferir prisioneiros, não é?

Além disso, no começo da semana, o senador republicano Josh Hawley respondeu a notícias de que os uigures estavam sendo transportados para fábricas no Leste da China, e introduziu legislação que exigiria que as companhias americanas que fabricam na China se certificassem de que suas empresas e contratadas não usavam uigures escravizados como trabalhadores. Caso contrário, enfrentariam multas enormes.

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Até recentemente, o território na província de Xinjiang não estava sob controle seguro de Pequim. De fato, o surgimento do nome Xinjiang para substituir o nome em inglês do território, Sinkiang, é uma evidência da mudança de status. A maior cidade a região, Urumchi, a quase 3 mil quilômetros de distância da capital, funciona mais como uma fronteira chinesa ou uma Sibéria chinesa. De fato, a província, como o Tibete, é designada como uma região autônoma. Para os ocidentais, essa região, se é que é conhecida, é um dos desvios mais empoeirados, exóticos e solitários das antigas rotas comerciais da Rota da Seda, uma série de cidades comerciais decadentes, misteriosas, mas tradicionais entre o deserto de Gobi e Cabul.

Quase nenhum lugar no mundo poderia parecer mais distante dos principais interesses americanos. E, como resultado, tem sido difícil chamar atenção política para esta região da China. O modo de vida tradicional em Kashgar parece estar séculos afastado dos modernos liberais de Hong Kong que estão no nexo físico, social e financeiro da globalização.

Embora Xinjiang fosse um lugar antigo, mesmo na Idade Média, há registros ainda no século 20 de revoltas e tentativas de governo independente. Os sonhos de fundar ou refundar o Turquestão do Leste, o Turcomenistão Oriental ou o Uiguristão ainda assombram alguns dos homens e mulheres exilados dessa região, embora cada um desses nomes seja emprestado pelos soviéticos ou muito limitados para capturar toda a população chinesa não-Han que vive na região. Isso inclui outros povos muçulmanos turcos, como os cazaques e os quirguizes, muitos dos quais têm laços étnicos ou mesmo tribais que cruzam as fronteiras dos estados vizinhos da Eurásia, ou os tadjiques cuja afinidade está relacionada ao Irã e ao Afeganistão.

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Os chineses apenas recentemente começaram a explorar os recursos de gás natural e carvão da região. E como o Estado chinês levou milhões de chineses da etnia Han a se mudarem para essa fronteira interna para tais esforços, acabou perturbando o antigo modo de vida islâmico com um novo desenvolvimento, importando a cultura han chinesa e a mão firme da direção política comunista. Os moradores começaram a resistir, alguns deles violentamente.

Os ataques de “terror” consistiram em pouco mais que tumultos e facadas, além de alguns ataques de veículos. Há mais de uma década, o ensaísta conservador Peter Hitchens descreveu um “apartheid voluntário” - pontuado pela violência - se estabelecendo nessas cidades. Medidas de segurança incrivelmente intrusivas foram introduzidas na região. E nos últimos três anos, observadores viram enormes campos de concentração construídos na área. Alguns jornalistas corajosos viram como é a “reeducação”. Agora, os sobreviventes desses campos contam que as mulheres eram frequentemente esterilizadas. A China não estava apenas se mudando pelos recursos: eles estavam fazendo uma limpeza étnica na região.

Esse tipo de tirania traz essa região obscura e amplamente desconhecida para o centro das coisas. Os EUA não são e nunca devem tentar ser o guardião desses povos antigos e veneráveis. Mas precisamos ser fiéis a nós mesmos.

Os campos de concentração do Terceiro Reich foram desmantelados no final de uma guerra global. Os soviéticos que governavam o Gulag foram submetidos a um bloqueio econômico efetivo das democracias ocidentais. Toda a autoridade moral dos intelectuais ocidentais foi construída com base em antitotalitarismo, oposição ao genocídio e defesa dos direitos humanos.

Os intelectuais de esquerda que policiam empresas americanas pelas falhas verbais conhecidas como “microagressões” não podem manter a autoridade moral para isso se eles estiverem twittando em telefones ou usando redes construídas com base na escravidão moderna e limpeza étnica. Eles não podem criticar supostos retrocessos democráticos na Europa Central enquanto se mantêm mudos sobre um dos nossos maiores parceiros comerciais entrando no ramo de vagões de trem e campos de concentração. Eles não podem, em sã consciência, promover o antirracismo em uma rede social controlada e monitorada pelo governo mais ativamente racista do planeta Terra. Até a esquerda, tão acostumada a ver suas próprias nações como a característica mais maligna da ordem global, terá que questionar se realmente acredita nos direitos humanos. Eles não podem argumentar por boicotar e desinvestir em estados do Oriente Médio, a menos que enfrentem isso.

A tentativa de colocar escravos modernos na cadeia de suprimentos de bens de luxo ocidentais é uma tentativa de implicar e atrapalhar moralmente os países ocidentais que poderiam criticar ou punir o Partido Comunista Chinês por seus crimes. A política mercantil da China sempre teve como objetivo fazer com que a resistência à tutela política do Partido Comunista Chinês custasse algo financeiramente. O comunismo soviético tentou dominar o Ocidente com força política, crueldade e poder de inteligência. A inovação da China é seduzir e infantilizar o Ocidente jogando o jogo capitalista. Podemos fazer ajustes caros na política comercial ou enfrentar um futuro com uma classe de líderes que se viu primeiro comprometida financeiramente, depois moralmente - indo para os braços de Xi, falida em todos os sentidos.

* Michael Brendan Dougherty é repórter sênior na National Review Online.

© 2020 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

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