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Inauguração do gasoduto Rússia-China
Tela mostra o presidente chinês, Xi Jinping, enquanto o presidente russo, Vladimir Putin, participa de uma cerimônia de inauguração do gasoduto “Power of Siberia”| Foto: Mikhail KLIMENTYEV / SPUTNIK / AFP

Um grande gasoduto de US$ 55 bilhões entre a Rússia e a China foi inaugurado nesta segunda-feira (2) pelos presidentes Vladimir Putin e Xi Jingping, provocando uma agitação geopolítica em todo o mundo.

De um lado da fronteira estavam os trabalhadores russos, vestidos de cinza e azul, atentos ao posto de compressão de gás de Atamanskaya, perto de Blagoveshchensk. Eles esperavam a ordem de Putin para abrir as torneiras do gasoduto. Do outro lado da fronteira, seus colegas chineses, de macacão vermelho brilhante, estavam prontos para receber o combustível. O momento foi capturado em um link de vídeo entre os dois presidentes.

O gasoduto chamado de Power of Siberia percorre quase 3.000 quilômetros em território russo – desde os campos de gás em Irkutsk e Yakutsk, na Sibéria, até a fronteira chinesa – e representa o símbolo mais recente e poderoso dos crescentes laços entre Moscou e Pequim. Ele permitirá à Rússia explorar o vasto e crescente mercado de gás da China como parte de um contrato de fornecimento do combustível de US$ 400 bilhões por 30 anos, o qual promete amenizar o impacto das sanções de países ocidentais à Rússia por causa da anexação da Crimeia em 2014. Na China, o gasoduto percorrerá mais de 5.000 quilômetros na província de Heilongjiang, nordeste de Xangai.

Alexey Miller, chefe da estatal russa de gás Gazprom, disse que 10.000 trabalhadores participaram da construção do gasoduto e que 130.000 tubos foram usados.

No próximo ano, o fluxo de gás da Rússia para a China será limitado, atingindo 4,6 bilhões de metros cúbicos em 2020 e 10 bilhões de metros cúbicos em 2021. Mas a Gazprom declarou sua ambição de fornecer 38 bilhões de metros cúbicos à China até 2025 e suprir um quarto das importações de gás natural liquefeito da China até 2035.

Mercado de gás

O contrato entre a Gazprom e a China National Petroleum permite que Moscou diversifique seus mercados fora da Europa, para onde a maior parte do gás russo fluía no passado. Além disso, torna mais complicada a vida dos exportadores de gás americanos, que vendem um produto mais caro. O projeto também ameaça minar os fornecedores tradicionais da China, como a Austrália, que tem um relacionamento cada vez mais difícil com Pequim.

A Rússia possui 20% das reservas mundiais de gás e responde por 17,3% da produção global do combustível, fornecendo quase 21% do que a Europa importa. A China será o principal motor do aumento da demanda global de gás até 2024, representando cerca de 40%, segundo a Agência Internacional de Energia.

A inauguração do gasoduto Power of Siberia ocorre em um momento em que a Rússia está se apressando para terminar o Nord Stream 2, gasoduto que levará combustível para a Alemanha através do Mar Báltico, permitindo à Rússia canalizar gás para a Europa sem ter que passar pela Ucrânia. Construído pela Gazprom e por parceiros europeus, ele está mais de 80% concluído e deve começar a operar na metade de 2020. O projeto, porém, pode ser frustrado se forem impostas sanções americanas às empresas construtoras, como os EUA já ameaçou fazer.

A Ucrânia, que ganha cerca de US$ 3 bilhões por ano com taxas para o trânsito de gás russo para a Europa, vem pedindo às autoridades americanas que interrompam a construção do Nord Stream 2. Moscou e Kiev estão tendo dificuldades para chegar a um acordo sobre a passagem do gás em meio ao atrito causado pela anexação da Crimeia pela Rússia e seu apoio a separatistas pró-Rússia na guerra no leste da Ucrânia. O contrato atual, negociado em 2009, expira no final do ano.

Um segundo gasoduto que está sendo construído da Rússia até a Turquia, o TurkStream, também contornaria a Ucrânia, abastecendo a Turquia e o sul da Europa.

Amizade fortalecida

Rússia e China estão se aproximando, determinadas a combater a influência global dos EUA. Em uma reunião em junho em São Petersburgo, onde os dois países assinaram uma série de acordos comerciais, Xi chamou Putin de "melhor amigo" e anunciou que Pequim enviaria dois pandas a Moscou – um sinal diplomático positivo dos chineses.

Em outra ocasião, os dois países mostraram que não é só o comércio que os liga. Em julho, eles fortaleceram os laços militares ao organizarem sua primeira patrulha aérea conjunta na região Ásia-Pacífico, colocando em altera as defesas aéreas do Japão e da Coreia do Sul.

Alexander Gabuev, analista de relações China-Rússia no Carnegie Center Moscow, disse que o gasoduto recém-inaugurado envia uma mensagem à Europa e aos Estados Unidos de que os laços entre Pequim e Moscou estão mais estreitos. Porém, ele também pode ser usado pela China, eventualmente, para exercer pressão por preços mais baixos.

"A longo prazo, o gás barato da Rússia concorrerá com o gás americano", mas como o gasoduto russo tem apenas um cliente - a China - Pequim pode exercer pressão sobre a Rússia, exigindo preços menores.

O analista de energia Andrew Hill, chefe da equipe de análise de energia e gás da S&P Global Platts para Europa, Oriente Médio e África, escreveu recentemente que a posição central da Rússia no fornecimento global de gás nunca foi tão dominante.

"Essa posição privilegiada de recursos deu à Rússia uma força que ela não hesitou em usar para promover seus próprios objetivos políticos, geopolíticos e estratégicos ao longo dos anos", afirmou. "Ao posicionar-se entre os mercados europeus a oeste e os mercados chineses famintos por gás, em rápido crescimento, a leste, a Rússia não está apenas criando novos fluxos de renda, mas protegendo suas apostas e reforçando sua posição estrategicamente".

Hill acrescentou: "O acordo com a China é um casamento de conveniência. A Rússia tem o gás que a China deseja, e aceita de bom grado todas as vantagens geopolíticas associadas e uma melhora de seu status". O gasoduto também oferece à Rússia a capacidade de jogar um mercado contra o outro, disse ele.

Declarações

Putin disse que o contrato de fornecimento de gás com a China em 2014 foi o maior acordo na história da indústria de gás da Rússia. O gasoduto representou um desafio de engenharia, atravessando pântanos, montanhas rochosas, áreas propensas a terremotos e regiões de permafrost, onde as temperaturas caíram a 50 graus negativos no inverno passado.

"O fornecimento de gás russo à China por gasoduto elevarão a cooperação estratégica entre a Rússia e a China a um nível qualitativamente novo e tornarão mais palpável a meta de aumentar o comércio bilateral para US$ 200 bilhões em 2024", disse Putin. "Mais de um trilhão de metros cúbicos de gás serão entregues na China por meio do gasoduto Power of Siberia ao longo de 20 anos".

Por sua vez, Xi disse que o gasoduto é um marco na cooperação energética que enfatiza a profunda integração entre os dois países. Ele também recebeu o secretário do Conselho de Segurança da Rússia, Nikolai Patrushev, no Grande Salão do Povo, em Pequim, na segunda-feira, e disse que Pequim e Moscou se unirão contra a interferência dos Estados Unidos e outros países.

"Este ano, os Estados Unidos e alguns outros países ocidentais aumentaram sua interferência nos assuntos internos da China e da Rússia, ameaçaram a segurança soberana dos dois países e impediram seu desenvolvimento econômico e social", disse ele, segundo a agência de notícias oficial Xinhua. Xi ainda alertou que essa abordagem prejudicaria apenas essas nações.

Conteúdo editado por:Isabella Mayer de Moura
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