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Rudy Giuliani, ex-prefeito de Nova York e advogado pessoal do presidente americano Donald Trump
Rudy Giuliani, ex-prefeito de Nova York e advogado pessoal do presidente americano Donald Trump| Foto: Angela Weiss / AFP

Quando Rudy Giuliani, advogado do presidente americano Donald Trump, foi a Madri em agosto para conversar com um dos principais assessores do presidente ucraniano e pressionar por investigações políticas buscadas pelo presidente Donald Trump, ele também se encontrou com um cliente não identificado, com interesses muito diferentes.

Enquanto estava na Espanha, Giuliani ficou em uma propriedade histórica pertencente ao executivo do setor de energia venezuelano Alejandro Betancourt López, que contratou o advogado pessoal de Trump para ajudá-lo a lidar com uma investigação do Departamento de Justiça dos EUA sobre suposta lavagem de dinheiro e suborno, segundo pessoas com conhecimento da situação.

Um mês depois, Giuliani era um dos vários advogados que representaram Betancourt em Washington. Os advogados se reuniram com o chefe da divisão criminal do Departamento de Justiça e outros advogados do governo para argumentar que o magnata venezuelano não deve enfrentar acusações criminais como parte de um caso de lavagem de dinheiro de US$ 1,2 bilhão registrado na Flórida no ano passado, disseram as pessoas que, como as outras ouvidas para esta reportagem, falaram sob condição de anonimato por causa da investigação em andamento.

A denúncia criminal alega que altos funcionários da empresa estatal de petróleo da Venezuela, líderes empresariais de elite e banqueiros conspiraram para roubar dinheiro da empresa e depois lavá-lo através de compras de imóveis em Miami e outros esquemas de investimento.

Betancourt não é um dos oito acusados ​​no caso, um grupo que inclui seu primo. Mas uma pessoa familiarizada com o assunto disse que ele é referido na denúncia criminal como um co-conspirador não incriminado, conforme relatado anteriormente pelo jornal Miami Herald.

A representação de Giuliani de Betancourt - que não foi divulgada anteriormente - é um exemplo impressionante de como o advogado de Trump continuou a oferecer seus serviços a clientes estrangeiros com interesses perante o governo dos EUA enquanto trabalhava em nome do presidente. E mostra como Giuliani - que diz que estava atuando pro bono como advogado de Trump - usou seu trabalho com clientes pagantes para apoiar seus esforços de encontrar munição política na Ucrânia para beneficiar o presidente.

Em resposta a perguntas sobre seu relacionamento com Betancourt, Giuliani escreveu: "Isso é sigiloso, por isso vou suportar qualquer mentira ou enfoque maldoso que vocês deem [a esse relacionamento]".

Eric Creizman, advogado de Giuliani, se recusou a comentar. Jon Sale, advogado de Betancourt, disse que seu cliente nega qualquer irregularidade. Ele se recusou a comentar sobre o relacionamento de Betancourt com Giuliani.

Uma porta-voz do Departamento de Justiça se recusou a comentar sobre a reunião. Autoridades do Departamento de Justiça desconheciam a reunião de Madri quando Giuliani veio encontrá-los, de acordo com um alto funcionário do Departamento de Justiça, que disse que a questão da Ucrânia não foi mencionada na discussão.

Giuliani, ex-prefeito de Nova York e promotor federal em Manhattan, está agora sob escrutínio pelo gabinete do procurador dos EUA que ele liderou no passado, que apresentou acusações de financiamento de campanha contra dois de seus associados, Lev Parnas e Igor Fruman. Investigadores estão examinando os negócios de consultoria de Giuliani como parte de uma investigação mais ampla sobre uma série de possíveis crimes, incluindo fraude bancária e violações de lobby estrangeiro, segundo pessoas familiarizadas com o assunto.

Giuliani também é uma figura-chave na investigação de impeachment da Câmara dos Deputados contra Trump, em que altos funcionários do governo testemunharam que o advogado do presidente liderou um esforço para pressionar a Ucrânia a anunciar investigações sobre os rivais de Trump em troca de uma reunião na Casa Branca.

Trump pediu às autoridades americanas que esperavam intermediar um bom relacionamento entre ele e o recém-eleito presidente ucraniano Volodymyr Zelensky que trabalhassem com Giuliani, de acordo com testemunhos feitos no congresso.

Em 25 de julho, Trump pediu a Zelensky que investigasse democratas. Dias depois, Giuliani foi a Madri para se encontrar com Andriy Yermak, um dos principais assessores de Zelensky, para consolidar o acordo, de acordo com Giuliani e testemunhos feitos no Congresso.

Giuliani disse ao Washington Post em setembro que Yermak havia se oferecido para vir aos Estados Unidos, mas ele sugeriu a Espanha. "Eu disse a ele que já estaria em Madri para outra coisa no primeiro final de semana de agosto, então por que não nos encontramos lá?" ele disse.

O objetivo da reunião de 2 de agosto: explicar dois casos específicos que Trump queria que a Ucrânia explorasse, disse Giuliani ao Washington Post em setembro.

Um deles era a investigação de um magnata ucraniano do setor de gás que tinha o filho do ex-vice-presidente Joe Biden, Hunter Biden, em seu conselho. Outro era a alegação de que os democratas conspiraram com a Ucrânia para divulgar informações sobre o ex-diretor da campanha de Trump, Paul Manafort, durante as eleições de 2016.

Yermak, segundo Giuliani, indicou que os ucranianos estavam abertos a prosseguir com as investigações. O assessor reiterou o pedido do governo da Ucrânia para uma reunião com Trump, uma cúpula que seria um importante sinal para a Rússia do apoio de Washington à Ucrânia. "Conversei com ele sobre o pacote completo", disse Giuliani.

Após a reunião, Yermak começou a circular um rascunho de uma declaração que o governo ucraniano estava considerando emitir sobre o seu compromisso de investigar casos de corrupção, de acordo com mensagens de texto divulgadas como parte do inquérito da Câmara.

O magnata venezuelano

Um dos principais objetivos da viagem de Giuliani à Espanha foi encontrar-se com Betancourt, que fez fortuna trabalhando para o governo venezuelano, segundo pessoas com conhecimento sobre a viagem.

Betancourt, um jovem membro da elite da Venezuela que frequentou a Universidade Suffolk em Boston, co-fundou uma empresa que recebeu US$ 1,8 bilhão em contratos governamentais para construir usinas sob o ex-presidente socialista da Venezuela Hugo Chávez, valor que levou a alegações de que a empresa enganou o governo, informou o Wall Street Journal.

A empresa, Derwick Associates, negou o pagamento de propinas para ganhar seus contratos e disse que os contratos refletiam o alto custo de se fazer negócios no país socialista.

Sale, advogado de Betancourt, é um amigo de longa data de Giuliani que frequentou a faculdade de direito com o ex-prefeito de Nova York. Ele também representou Giuliani brevemente em consultas do Congresso sobre a Ucrânia, enviando uma carta aos comitês da Câmara explicando que Giuliani não cumpriria uma intimação para apresentar documentos.

Giuliani defendeu seu trabalho para clientes estrangeiros, argumentando que as identidades e interesses deles são "irrelevantes" para seus trabalhos voluntários por Trump. "Meus outros clientes estão me pagando pelo trabalho que faço por eles. Ninguém está me pagando por uma única coisa que estou fazendo por Donald J. Trump ", disse ele ao Washington Post no início deste ano.

Ele disse ao Daily Beast em outubro que encontrou Yermak em Madri porque ele já planejava estar na capital espanhola para "negócios e férias".

Ele disse que esse era um exemplo de como os custos de sua viagem para Trump foram cobertos por um trabalho diferente que ele fez para clientes particulares. "Essa viagem em particular não foi reembolsada, mas cerca de três quartos dela seriam para negócios e um quarto seria pessoal", disse ele. "A parte relativa a Trump seria considerada pessoal porque eu não sou pago por representar o presidente".

Ele disse à Reuters em setembro que suas despesas "foram pagas, eu presumo, por um cliente. Como tirei dois dias de folga, acho que paguei parte dela pessoalmente".

Durante a viagem, Giuliani se encontrou com Yermak em um hotel em Madri, segundo pessoas com conhecimento sobre a viagem.

Mas ele - junto com Parnas e Fruman - ficou em uma vasta propriedade pertencente a Betancourt nos terrenos de um antigo castelo que no passado era usado pela realeza espanhola, disseram as pessoas.

Uma empresa de Betancourt comprou o Castillo del Alamin em 2011 por quase 23 milhões de euros, de acordo com o jornal espanhol El Mundo. Ele fica a cerca de uma hora a sudoeste de Madri.

Em 3 de agosto, um dia após seu encontro com Yermak, Giuliani postou no Twitter imagens de uma vila espanhola, escrevendo: "Ao sul de Madri existem belas cidades pequenas com agradáveis paisagens e pessoas maravilhosas".

Joseph Bondy, advogado de Parnas, se recusou a comentar. Todd Blanche, advogado de Fruman, não respondeu a um pedido de comentário.

Um mês depois, Giuliani juntou-se a vários advogados representando Betancourt em uma reunião na sede do Departamento de Justiça com Brian Benczkowski, chefe da divisão criminal, segundo pessoas a par da sessão.

Na época, promotores federais em Manhattan estavam investigando o caso contra os associados de Giuliani, Parnas e Fruman.

Quando o New York Times noticiou em outubro que Giuliani se encontrou com o chefe da divisão criminal sobre um de seus clientes, o Departamento de Justiça disse que Benczkowski não estava ciente do caso de Nova York na época.

"Quando Benczkowski e os advogados da seção de fraude se encontraram com Giuliani, eles não tinham conhecimento de nenhuma investigação sobre os associados de Giuliani no distrito sul de Nova York e não teriam se encontrado com ele se soubessem", Peter Carr, um porta-voz do departamento, disse na época.

O cliente que foi o assunto da reunião não foi relatado anteriormente.

Investigação na Ucrânia e visita à Casa Branca

Giuliani lançou seus esforços para desenterrar informações que poderiam prejudicar democratas na Ucrânia tanto como estratégia para ajudar seu cliente, Trump, mas também motivado por um compromisso de combater a corrupção.

"Faço isso há 50 anos da minha vida", disse ele ao apresentador conservador Glenn Beck em 20 de novembro. "Nunca recebi uma queixa. Acho que as pessoas entendem que tenho uma paixão muito, muito grande por combater a corrupção, e eu provavelmente descobri alguns dos maiores crimes e interrompi algumas das maiores organizações criminosas da nossa história".

No entanto, seu envolvimento com o caso Betancourt o coloca em desacordo com um longo esforço de promotores federais para reprimir a corrupção na Venezuela.

Os Estados Unidos têm atuado agressivamente em casos de suborno, peculato e lavagem de dinheiro contra a elite da Venezuela, argumentando que a corrupção ajudou a colapsar a economia do país e causou agitação civil.

Promotores federais de Miami disseram em documentos judiciais que bilhões de dólares foram saqueados da empresa estatal de energia da Venezuela, a Petróleos de Venezuela S.A, ou PDVSA, o que teve consequências econômicas particularmente terríveis.

Betancourt não foi nomeado na denúncia criminal de julho de 2018, mas o principal réu do caso, Francisco Convit Guruceaga, é seu primo e fez parte do conselho da empresa de Betancourt. Convit é considerado um fugitivo pelo governo dos EUA, de acordo com registros do tribunal.

Embora a representação de Giuliani sobre Betancourt não tenha sido divulgada anteriormente, a questão da Venezuela apareceu no inquérito de impeachment da Câmara.

Em um depoimento a portas fechadas concedido a investigadores do congresso em 14 de outubro, a ex-funcionária do Conselho de Segurança Nacional Fiona Hill aludiu à possibilidade de um vínculo da Venezuela com a saga atual da Ucrânia.

"Foi-me dito isso pelos diretores que trabalhavam no Hemisfério Ocidental. Não tive a chance de investigar isso de alguma maneira. Disseram-me que os mesmos indivíduos que foram indiciados estiveram interessados ​​em momentos diferentes em investimentos em energia na Venezuela e que isso era bem conhecido", disse ela, referindo-se a Parnas e Fruman, segundo uma transcrição divulgada posteriormente.

Ela não detalhou as informações que recebeu, apenas que soube que os dois eram "notórios na Flórida" e envolvidos com "coisas estranhas na Venezuela".

"Bem, eu estava extremamente preocupada que o que Giuliani estivesse fazendo não fosse legal, especialmente depois que as pessoas me informaram sobre esses dois cavalheiros, Parnas e Fruman", disse ela.

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