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O presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, blefou quando ordenou o início do enriquecimento de urânio a 20% em seu país, na avaliação do Itamaraty. Especialistas brasileiros que acompanham o tema acreditam que essa jogada demonstra ousadia em assumir alto risco. O Irã não tem capacidade de enriquecer nesse nível em curto prazo e, com a declaração de Ahmadinejad, pode provocar mudança de posição da China, o único membro do Conselho de Segurança das Nações Unidas que se mostrava disposto a vetar novas sanções ao país.

A nova iniciativa do Irã deverá redobrar os esforços do governo brasileiro para não fechar os canais de diálogo entre o governo iraniano e as potências do P5+1 (Estados Unidos, Reino Unido, França, China, Rússia e Alemanha) em favor de um "fato novo" para solucionar esse conflito. Na visão do chanceler Celso Amorim, o "fato novo" seria o acordo de troca de urânio iraniano enriquecido a 3,5% por combustível nuclear da França.

Na semana passada, quando já se prenunciava outra vez a relutância do governo do Irã em aceitar o acordo, Amorim conversou com o chanceler daquele país, Manuchehr Mottaki. Um dia antes, em um seminário sobre desarmamento nuclear, em Paris, Amorim declarou que ambos os lados não deveriam "deixar que essa oportunidade (o acordo) seja esquecida".

Pressões

No Itamaraty, há convicção de que o primeiro gesto em favor desse acordo partiu do próprio Ahmadinejad. Suas idas e vindas, depois de formulado o acerto, decorreram de pressões políticas internas - a oposição é um dos principais eixos defensores do uso militar da energia nuclear - e também da insegurança com relação ao cumprimento do acordo. Com a confiança desgastada, especialmente depois da revelação do reator mantido em segredo em Qom, em 2009, o Irã passou a contar com poder de barganha cada vez menor até mesmo para defender interesses legítimos.

O acordo prevê a entrega do estoque iraniano de 1.200 quilos de urânio enriquecido a 3,5% para a Rússia, que elevaria esse nível a 20%. Dali, seria enviado à França, que o transformaria em combustível para um reator que fabrica radiofármacos, em Teerã. Esse acerto daria mais segurança ao P5+1, por retirar do Irã a matéria-prima para a construção de armas atômicas, que exigem enriquecimento em torno de 90%.

Para o Irã, entretanto, ainda faltam garantias de que vai realmente receber o combustível para seu reator de Teerã. Daí sua proposta de entregar o estoque divido em três cotas - cada uma de 400 quilos - e sua exigência de receber simultaneamente o combustível nuclear. A França salgou ainda mais essa dúvida ao declarar que sua estatal nuclear, Areva, não teria condições de entregar combustível ao Irã antes de dois anos, em razão dos compromissos anteriores de fornecimento.

Como o Irã dispõe de combustível por cerca de um ano, seu reator teria de ser paralisado se não houvesse condições de receber de outra empresa. Para o Itamaraty, uma prioridade política do governo francês para o Irã no esquema de produção da Areva poderia contornar esse problema. Mas a França não quer dar mais uma chance ao Irã e considera que a imposição de novas sanções é a melhor forma de lidar com esse país.

Neste mês, a França ocupa a presidência rotativa do Conselho de Segurança da ONU. As retaliações sobre pessoas físicas e empresas ligadas à Guarda Revolucionária Iraniana já foram listadas pelos Estados Unidos, mas não foram apresentadas ao comitê que acompanha as sanções anteriores por conta da resistência da China, que ainda aposta no diálogo.

Para o Itamaraty, assim como a Rússia cansou-se das idas e vindas do Irã e passou a apoiar as sanções, o governo chinês poderá seguir o mesmo caminho. Nesse caso, será impossível evitar as novas retaliações. Os esforços do governo Luiz Inácio Lula da Silva nesse imbróglio terão fracassado, mesmo com o voto contrário do Brasil, que é membro não-permanente do Conselho de Segurança desde 1º de janeiro. Nesse caso, caberá ao Brasil, como exemplar sócio da ONU, aplicar as sanções.

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