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O democrata Joe Biden e o ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama em evento durante a campanha eleitoral, em outubro de 2020.
O democrata Joe Biden e o ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama em evento durante a campanha eleitoral, em outubro de 2020.| Foto: Drew Angerer/Getty Images/AFP

“Esse não vai ser um terceiro mandato Obama.” (Joe Biden, em 24 de novembro).

Se é assim, ele tem um jeito engaçado de demonstrar. As decisões recentes de Biden em nada consolam os americanos em busca de uma saída para a polarização, o amargor, o catastrofismo e a histeria que caracterizaram a política desses últimos anos.

Biden não está apenas enchendo seu gabinete com as mesmíssimas pessoas que criaram essa confusão toda entre 2009 e 2017. Ele também está escolhendo, para cargos muito importantes, ideólogos progressistas que acreditam ser missão da burocracia acrescentar mais brigas à guerra cultural. E ele faz tudo isso ao mesmo tempo em que sua família e seu partido precisam responder algumas perguntas sobre suas ligações com a República Popular da China. Então, você tem toda a razão de estar preocupado.

Os indicados de Obama eram conhecidos por serem elitistas, mandões e arrogantes. O que Biden faz? Ele os traz de volta ao governo. John Kerry vai ser um enviado especial para o clima – e, se você acha que ele vai ficar apenas nisso, venha aqui, deixe-me lhe mostrar um bilhete premiado que achei na rua. Janet Yellen vai para o Tesouro – garantia de um relacionamento bastante complicado com o seu sucessor à frente do Federal Reserve. Alejandro Mayorkas era vice-secretário de Segurança Interna quando ele foi envolvido em um escândalo sobre um programa de vistos. Biden quer promovê-lo.

Biden está escolhendo, para cargos muito importantes, ideólogos progressistas que acreditam ser missão da burocracia acrescentar mais brigas à guerra cultural

Jeffrey Zients salvou o healthcare.gov (o site do Obamacare) do seu desastroso lançamento. Ele será o chefão do combate ao coronavírus. Depois de mentir sobre Benghazi e sobre Bowe Bergdahl enquanto coordenava a segurança nacional, Susan Rice vai usar seu talento para a mentira cuidando da política interna. Denis McDonough era chefe da Casa Civil de Obama durante o desastre da “linha vermelha” na Síria; ele será secretário de Assuntos dos Veteranos. Algumas autoridades – Vivek Murthy, Tom Vilsack – ocuparão exatamente os mesmos postos que detiveram na era Obama.

E os casos em que Biden resolveu agir por conta própria são ou estranhos ou perturbadores. Biden escolheu o general da reserva Lloyd Austin, ex-comandante do Centcom, para ser seu secretário de Defesa porque “ele teve um papel crucial na retirada de 150 mil soldados americanos do campo de batalha” e porque ele tinha um bom relacionamento com Beau Biden. A escolha, que precisa passar pelo Congresso, não só levanta a questão delicada das relações civil-militares, mas também garante a repetição do debate sobre a retirada americana do Iraque em 2011, e a subsequente ascensão do Estado Islâmico. A nomeação já criou atritos entre Biden e membros do seu próprio partido, bem como com membros da elite bipartidária que cuida da política externa e que apoiou sua candidatura.

O departamento de Saúde e Serviços Humana de Obama ficou famoso por determinações, como as regras de 2012 para a oferta de contraceptivos, que restringiram a liberdade religiosa de forma a beneficiar o Partido Democrata. O segundo presidente católico da história dos Estados Unidos poderia ter buscado diminuir a tensão entre Washington e as pessoas religiosas indicando um secretário centrista, comprometido acima de tudo com a luta contra o coronavírus. Em vez disso, Biden escolheu Xavier Becerra, o ultraesquerdista procurador-geral da Califórnia, que, quando não está movendo ações contra o presidente Trump, está perseguindo organizações religiosas e pró-vida. A nomeação de Becerra é um ataque aos conservadores. Ele desmente o chamado à unidade feito por Biden. Obama deve estar adorando.

O que Obama não deve estar adorando é a admissão, da parte de Hunter Biden, que o procurador federal em Delaware está de olho nas declarações de impostos do filho do presidente eleito. A realidade das negociatas de Hunter Biden, apesar de a imprensa e das gigantes de tecnologia terem tentado esconder a informação nos dias que antecederam a eleição, não pode mais ser ignorada. E a revelação de Hunter veio na mesma semana em que a Axios publicou um relatório avassalador sobre a infiltração chinesa nos círculos políticos da Costa Oeste, incluindo a informação de que uma espiã chinesa se tornou tão próxima do deputado democrata Eric Swalwell que o FBI lhe mandou, em 2015, um relatório precavendo-o contra ela. Swalwell continuará a fazer parte do Comitê de Inteligência da Câmara de Representantes. “Quando isso chegou ao conhecimento de membros do Congresso, acabou [a comunicação com os agentes chineses]”, disse Nancy Pelosi. Então está certo, fim de papo.

O fato é que Biden exagerou ao negar que ele seria um mero zelador do terceiro mandato de Obama. Ele disse isso em entrevista a Lester Holt, da NBC. Sua argumentação merece uma análise. “Estamos em um mundo muito diferente daquele que havia nos mandatos Obama-Biden”, ele disse. “O presidente Trump mudou o cenário.” O que faria de sua presidência uma novidade, ele afirmou, não é nem a equipe, nem o modo de lidar com os temas. São as circunstâncias. O mundo está “totalmente diferente”. Trump transformou a política, a economia, a diplomacia. Então, o mandato de Biden não vai ser como o de Obama simplesmente porque houve um intervalo de quatro anos.

Isso pede um questionamento. Claro que o mundo mudou. Sempre muda. Mas objetos similares podem estar presentes em vários lugares diferentes. O que importa é se Biden vai se diferenciar de Obama em relação às pessoas, à política e ao estilo – não porque Biden tenha qualquer tipo de restrição ao 44.º presidente do país, mas porque a sua própria presidência depende disso.

Biden exagerou ao negar que ele seria um mero zelador do terceiro mandato de Obama

Mas Biden não pensa assim. Ele compartilha os mesmos objetivos de Obama. Ele gostaria de ter a mesma popularidade que Obama tem. Ele se esquece de que os pontos positivos de Obama eram pessoais. Eles nunca beneficiaram o Partido Democrata. Enquanto Obama seguia adiante com sua agenda, apesar das contradições e da hostilidade pública, seu partido perdeu uma casa do Congresso, um governo estadual e várias assembleias legislativas estaduais. Sem aliados no Congresso, Obama se apoiou na Justiça e na burocracia para conseguir o que queria. Essa abordagem enfureceu a base republicana, enquanto espalhava a ideia de que o eleitorado não mais controlava seu governo. O resultado disso foi Trump – que imediatamente reverteu os decretos de Obama.

Biden parece ansioso para recomeçar esse drama sórdido. Mas seu ponto de partida é mais fraco que aquele de Obama. Quando o próximo Congresso tomar posse em janeiro, os democratas terão a menor maioria na Câmara desde 1893. Na melhor das hipóteses, os democratas terão um empate de 50 a 50 no Senado. Em 2009, Obama tinha uma ampla maioria na Câmara e uma maioria à prova de obstruções no Senado. E mesmo assim ele não conseguiu tudo o que queria.

Nomeações estranhas para o gabinete, brigas desnecessárias, o fantasma da corrupção, a promessa de impasses – e ainda falta um mês para a posse. Biden está entregando o mesmo time e os mesmos planos de seu antigo chefe, mas com uma apresentação mais incômoda e escândalos adicionais. O terceiro mandato de Obama tem tudo para ser tão decepcionante quanto os dois primeiros.

Matthew Continetti é pesquisador bolsista residente no American Enterprise Institute.

© 2020 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

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