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A diretora da New Korea Women's Union, Lee So Yeon, em coletiva de imprensa em Seoul (Coreia do Sul), em 1º de novembro. Policiais e outros oficiais nortecoreanos abusam de mulheres com quase total impunidade, mostra relatório | ED JONES / AFP
A diretora da New Korea Women's Union, Lee So Yeon, em coletiva de imprensa em Seoul (Coreia do Sul), em 1º de novembro. Policiais e outros oficiais nortecoreanos abusam de mulheres com quase total impunidade, mostra relatório| Foto: ED JONES / AFP

De acordo com um relatório divulgado nesta quarta-feira (31) pela ONG Human Rights Watch, mulheres norte-coreanas estão sendo vítimas de abuso sexual cometidos por autoridades policiais. Eles, no entanto, ficam aparentemente impunes, e isso é parte de um sistema de opressão e outros tipos de abusos que são tolerados dentro do regime do ditador Kim Jong-un.

O relatório de 86 páginas, cujo título “você chora à noite, mas não sabe por quê” reproduz a frase de uma das vítimas, foi elaborado com base em 54 entrevistas e oferece o último indicativo sobre uma série de suspeitas de violações de direitos humanos cometidas por autoridades norte-coreanas, incluindo execuções públicas e detenções arbitrárias de supostos ativistas e dissidentes. Também foram ouvidas oito ex-autoridades exiladas. 

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As descobertas acontecem em meio a uma onda de diplomacia na Coreia do Norte, liderada pelo país vizinho, a Coreia do Sul, e pelos Estados Unidos. Washington e Seul evitaram, cuidadosamente, entrar em conflito com o ditador sobre questões de direitos humanos, optando, ao invés disso, por conversas mais gerais, na esperança de persuadi-lo para desmantelar seu programa nuclear. 

Tomas Ojea Quintana, relator especial da ONU sobre direitos humanos na Coreia do Norte, disse em uma coletiva de imprensa, na semana passada, que estava “muito preocupado” com a ausência do tema direitos humanos nas principais declarações após as reuniões entre o líder norte-coreano, o presidente sul-coreano, Jae-in Moon, e Donald Trump. 

Kenneth Roth, diretor executivo da Human Rights Watch, disse que “as mulheres norte-coreanas não deveriam ter que arriscar suas vidas e serem estupradas por funcionários do governo ou por trabalhadores enquanto deixam suas casas para trabalhar e sustentar suas famílias”. 

“Kim Jong-un e seu governo devem reconhecer o problema e tomar medidas urgentes para proteger as mulheres e garantir justiça para os sobreviventes da violência sexual”, acrescentou Roth. 

Pyongyang, por sua vez, disse que a Coreia do Norte é um “paraíso para as mulheres”, em resposta a um pedido das Nações Unidas, em 2014, para que o país tomasse medidas em relação a abusos dos direitos humanos. 

Mas os relatos de mais de 50 mulheres fugitivas da Coreia do Norte revelam a falta de vias judiciais para denunciar a violência sexual, além de uma cultura que coloca um estigma social nas vítimas de estupro que denunciam o sofrimento. 

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O relatório não vincula os abusos diretamente a funcionários de alto escalão do regime de Kim, mas sugere que há pouco controle sobre autoridades, como policiais e guardas de campos de prisioneiros, para evitar esse tipo de ataques contra as mulheres. 

“Quando um funcionário em uma posição de poder 'escolhe' uma mulher, ela não tem escolha a não ser cumprir qualquer exigência que ele faça, seja por sexo, dinheiro ou outros favores”, revela o relatório. 

Uma ex-comerciante que deixou a Coreia do Norte em 2013 foi citada. Ela disse que não podia denunciar que havia sido estuprada, porque “seria como cuspir em seu próprio rosto”, visto que é comum que culpem a própria vítima e homens com cargos de poder ficam impunes. 

Nos últimos anos, menos de dez acusados foram condenados por estupro na Coreia do Norte, segundo dados revelados pelo governo de Pyongyang a um comitê da ONU, em julho de 2017. 

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A maioria das mulheres que depuseram à Human Rights Watch esteve sob custódia das autoridades ou eram comerciantes que sofreram abusos sexuais por parte de funcionários quando atravessavam a fronteira do país ou mesmo dentro da Coreia. 

Yoon Mi Hwa, uma ex-comerciante da província de North Hamgyong, que escapou da Coreia do Norte em 2014, descreveu à Human Rights Watch como um guarda em um centro de detenção escolhia uma mulher para ser estuprada todas as noites, no ano de 2009. 

Como todos os outros citados no relatório, Yoon é um nome fictício para proteger a identidade da mulher e de quaisquer outros parentes que ainda residem no país de Kim Jong-un. 

“Click, click, click. Foi o som mais horrível que já ouvi, o som da chave da cela da nossa sala de prisão. Toda noite um guarda a abria, e eu ficava quieta, agindo como se não tivesse percebido, esperando que não fosse eu quem tivesse que o seguir”, disse Yoon no relatório. 

Outra fugitiva não citada no documento, Seo Hyang-ran, disse ter sido despida e teve o órgão sexual examinado por policiais, após ter sido ‘devolvida’ pela China em uma tentativa fracassada de buscar refúgio na região. 

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Ela disse ao jornal Washington Post que foi “escolhida” como alvo de estupro por um guarda em um centro de detenção em North Hamgyong. 

“Eu não conseguia entender o que aconteceu comigo, foi extremamente humilhante”, disse Seo, que agora trabalha como conselheira de fugitivos norte-coreanos no Hospital da Universidade Nacional de Chungnam, na Coreia do Sul. “Agora eu sei que não foi minha culpa, e eu fui submetida à violência sexual de forma muito injusta”.

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