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Por quase um ano, o orgulho da crescente população cristã em Sanjiang, subúrbio no norte da cidade, era uma igreja cuja torre de 55 metros se destacava contra um promontório rochoso. Wenzhou, conhecida como a "Jerusalém da China" devido às várias igrejas espalhadas pela cidade, era notória pelas relações descontraídas entre igreja e Estado. Funcionários municipais elogiavam a igreja como um projeto exemplar.

Mas, nesta primavera, o governo ordenou que a igreja fosse demolida, sob a alegação de que ela violava regras do zoneamento urbano. Após o fracasso das negociações, tratores e picaretas derrubaram as paredes da igreja em 28 de abril. Depois, sua torre.

"As pessoas ficaram estupefatas", comentou uma frequentadora da congregação, que pediu para ser identificada apenas por seu nome em inglês, Mabel, por temer represálias do governo. "Elas perderam totalmente a fé nas autoridades religiosas locais."

Essa área urbana no leste da China, com 9 milhões de habitantes e situada entre montanhas acidentadas e um litoral recortado, virou o centro de uma batalha nacional com o Partido Comunista, cada vez mais desconfiado do cristianismo e dos valores ocidentais que ele representa.

Desde março, pelo menos uma dezena de congregações na província de Zhejiang receberam ordens de demolir as igrejas ou retirar suas cruzes, escalada significativa de uma campanha do partido para restringir a influência de uma religião em rápida expansão na China.

O governo afirmou que as igrejas violavam restrições de zoneamento urbano. No entanto, um documento interno do governo deixa claro que as demolições fazem parte de uma estratégia para reduzir a exposição pública do cristianismo. A declaração diz que o governo visa regular "pontos religiosos excessivos" e atividades religiosas "demasiadamente populares", porém especifica apenas uma religião, o cristianismo, e um símbolo, a cruz.

"A prioridade é tirar as cruzes de locais com atividade religiosa ao lado de vias expressas e rodovias nacionais e de províncias", cita o documento. "Gradualmente e em lotes, retirem as cruzes do alto para a fachada dos edifícios."

A demolição da igreja de Sanjiang atraiu atenção nacional porque era oficialmente aprovada e também devido ao fato de que o secretário do partido na província, aliado do presidente Xi Jinping, teve um papel em sua destruição. O caso provocou a reação até de círculos religiosos controlados pelo governo.

Gao Ying, reitor do Seminário Teológico Yanjing, em Pequim, disse: "A Igreja de Sanjiang era uma congregação legalmente registrada e merecia um tratamento melhor". Mayfair Yang, da Universidade da Califórnia em Santa Barbara, comentou: "À medida que se fortalece, o cristianismo incomoda outras religiões".

Essas outras religiões estão ganhando cada vez mais apoio do Partido Comunista. Em março, Xi elogiou o budismo por suas contribuições para a China. Em uma visita à cidade natal de Confúcio no ano passado, ele pegou dois livros sobre confucionismo e, em uma reviravolta em relação ao longo antagonismo do partido, deu um aval raro: "Eu preciso ler esses livros com muita atenção".

Embora as igrejas na China se mantenham principalmente com recursos privados —a de Sanjiang foi construída com US$ 5,5 milhões de doações—, pontos religiosos tradicionais vêm se expandindo com forte apoio governamental.

O governo também mudou sua visão sobre práticas religiosas nativas. Uma década atrás, o Partido Comunista condenou a quiromancia e o feng shui como "superstições feudais". Agora, ambos são protegidos por programas do governo que apoiam "o patrimônio cultural intangível" do país.

Alguns membros do governo consideram o cristianismo um vestígio colonial que não se coaduna com o controle do partido sobre a vida política e social.

Aparentemente, os problemas da igreja começaram em outubro, quando Xia Baolong, aliado próximo do presidente Xi, visitou a região. Ao que consta, Xia se perturbou ao ver um edifício de uma religião estrangeira dominando a linha do horizonte. Conforme relatos de membros da igreja, no mês seguinte veio a ordem para que retirassem a cruz.

O acordo em 2011 para a construção da igreja foi assinado pela congregação e pelo comitê local de assuntos religiosos. Diante do clamor atual, esse comitê, que representa o governo, agora afirma que tudo não passou de um problema interno do governo e que a igreja ficou maior do que o planejado. No entanto, funcionários municipais e membros da congregação opinam igualmente que essa violação foi estimulada pelo governo.

Um funcionário do comitê de assuntos religiosos reconheceu que "funcionários municipais disseram que a igreja podia ser maior, mas isso provavelmente foi um erro".

O governo da província anunciou em maio que prendeu dois funcionários municipais de Wenzhou e que estava investigando outros três. Ao que consta, eles são acusados de terem aprovado a localização e o tamanho da igreja.

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