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Yusa Nishimura economiza moedas de 500 ienes em um livro-cofrinho; em 15 anos de deflação no Japão, o dinheiro vale cada vez mais; preços gerais não sobem no país desde fim dos anos 90 | Kentaro Takahashi para The New York Times
Yusa Nishimura economiza moedas de 500 ienes em um livro-cofrinho; em 15 anos de deflação no Japão, o dinheiro vale cada vez mais; preços gerais não sobem no país desde fim dos anos 90| Foto: Kentaro Takahashi para The New York Times

Os trocados de Yusa Nishimura podem estar minando o plano econômico do primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe. Sempre que pode, Nishimura, 23, guarda moedas de 500 ienes, que valem um pouco menos de US$ 5, numa espécie de livro que facilita sua contagem.

Juntar um pé-de-meia como o de Nishimura fazia sentido num Japão que crescia lentamente, onde durante 15 anos de deflação o dinheiro dela valia cada vez mais com o passar do tempo.

Seus planos de fazer uma extravagância num spa provavelmente ficariam mais baratos se ela esperasse mais.

Mas, na sua luta para tirar o Japão da deflação, Abe está fazendo um chamado aos poupadores, como Nishimura, para que mudem seu modo de pensar —para o bem da economia e também para o seu próprio bem.

Nishimura, como boa parte dos japoneses, não está convencida. "Nunca vivenciei inflação. Não me parece real", disse Nishimura, que trabalha numa empresa de tecnologia em Kobe.

O resultado dessa incerteza poderia ser uma recuperação econômica difícil para o Japão, que tem experimentado certo ressurgimento sob Abe.

Dados recentes apontam para um fraco crescimento econômico no quarto trimestre. O governo disse que a economia tinha crescido ainda mais lentamente do que o previsto, apenas 0,7% no acumulado de um ano, afetada por um consumo ainda menor que o esperado.

Se mais pessoas previssem um futuro de preços e salários em alta, avalia Abe, elas gastariam agora, antes de as mercadorias ficarem mais caras. Para combater a alta dos preços, elas também colocariam seu dinheiro em investimentos de rendimento mais alto. As empresas, confiantes em uma nova era de maiores vendas e lucros, iriam elevar preços e salários. Um grande obstáculo no caminho do Japão, diz Abe, são as atitudes arraigadas. "Não é fácil alterar uma mentalidade de deflação que está em vigor aqui há mais de 15 anos", afirmou o premiê.

No Japão, os preços em geral não sobem desde o fim dos anos 1990. Um Big Mac custa aqui aproximadamente o mesmo que em 1988: cerca de 300 ienes, ou quase US$ 3. O preço de outra opção de fast-food —a tigela de arroz e carne da rede Yashinoya— caiu de 400 ienes no final dos anos 1990 para 280 hoje.

A renda média do trabalhador também diminuiu.

Abe adotou políticas agressivas para pôr fim à deflação. Sua primeira medida, que duplicou a oferta de moeda, já elevou os preços ao enfraquecer o iene e empurrar para cima o custo da energia e dos alimentos importados.

Mas mesmo uma elevação ínfima nos preços foi recebida com perplexidade. As empresas que estão promovendo aumentos demonstram pesar. "Dói realmente em nossos corações anunciar que em breve revisaremos nossos preços", disse a cervejaria Kidoizumi, em Chiba, a leste de Tóquio, num anúncio recente.

O lento avanço no combate à deflação reflete as dificuldades de superar expectativas e comportamentos enraizados, especialmente entre os japoneses mais jovens, que nunca vivenciaram aumentos de preços, disse Taro Saito, economista sênior do Instituto de Pesquisa NLI, em Tóquio.

Gerações mais velhas ainda se lembram dos "choques do petróleo" dos anos 1970, que fizeram os preços no varejo darem um salto e também provocaram a bolha nos ativos do país nos anos 1980. Mais recentemente, eles se lembram de como o Japão caiu na deflação depois que a sua bolha econômica estourou, no início da década de 1990.

Uma pesquisa feita no ano passado pelo governo demonstrou disparidades intergeracionais extremas: famílias chefiadas por pessoas dos 60 aos 69 anos elevaram seus gastos em 2,7%, ao passo que as famílias chefiadas por japoneses com menos de 30 reduziram-nos em 0,8%.

Alguns economistas estão começando a questionar se os obstáculos para derrotar a deflação estão nas políticas de Abe, não entre os consumidores.

No restaurante Manrai, adorado pelos moradores de Tóquio por sua sopa de porco e alho-poró —e pelo antigo compromisso com os preços baixíssimos—, o ambiente era de consternação quando os preços recentemente subiram pela primeira vez em mais de duas décadas, de 200 para 250 ienes.

"Não acredito", disse Ryo Bobayashi, funcionário de uma agência de recrutamento.

"Se os preços começarem a subir em todo lugar, não poderei mais comer fora de casa."

O Manrai elevou os preços não por estar confiante no futuro das vendas, mas porque estava sob a pressão dos custos mais altos.

Em vez de dar início a um renascimento da economia, essa inflação "empurrada pelos custos", como os economistas a definem, poderá se tornar uma crescente ameaça aos japoneses aferrados a uma mentalidade deflacionária. Eles poderão ver suas economias serem corroídas, alertou Yukio Sakurai, analista de moradia em Tóquio.

As opções que faziam sentido durante a deflação –alugar, por exemplo, em vez de comprar– poderão sobrecarregá-los com custos cada vez maiores e barrar seu acesso a quaisquer benefícios de uma economia mais forte.

"Os japoneses mais jovens precisam mudar agora sua mentalidade ou ficarão para trás", disse Sakurai. "Eles fariam bem em conversar com os pais e avós."

Colaborou Zhiyi Yang

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