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Gonçalo Domingues, diz que graças aos subsídios, pôde manter seus animais | João Pedro Marnoto/The New York Times
Gonçalo Domingues, diz que graças aos subsídios, pôde manter seus animais| Foto: João Pedro Marnoto/The New York Times

Não é fácil ser burro hoje em dia.

Para começar, há o problema da imagem — e ultimamente até a modernidade resolveu se intrometer nas terras altas do nordeste de Portugal, onde há séculos eles ajudam os agricultores a lavrar a terra e carregar peso.

Agora, em época de austeridade, os animais também foram levados de roldão no debate que decidirá até onde deve ir a União Europeia para manter as regiões de cultivo, que já enfrentam cortes no apoio financeiro. A ajuda deste ano é de US$ 78 bilhões, o equivalente a 43 por cento do orçamento total do bloco, mas os gastos agrícolas devem cair para US$ 68 bilhões/ano até 2020.

Desde 2003, o burro de Miranda, que ganhou o nome da região onde vive, Terra de Miranda, é considerado uma espécie ameaçada de extinção. Com manchas brancas em volta dos olhos e um pelo grosso que vai caindo conforme envelhece, ele vem perdendo espaço para o trator e outros equipamentos modernos.

E uma vez que os jovens vão para as cidades, também se veem ameaçados porque os agricultores estão ficando muito velhos para cuidar deles.

Essa região, onde se fala o dialeto mirandês, parece ter parado no tempo. Uma senhora viúva, vestida de preto dos pés à cabeça, disse usar o animal porque ninguém em sua família sabia ler ou escrever e, portanto, ninguém podia ter carteira de habilitação.

Até pouco tempo, a extinção do burro de Miranda parecia inevitável, afirma Miguel Nóvoa, diretor de uma associação que mantém 140 espécimes divididos em dois abrigos.

Hoje, a população se estabilizou em cerca de 800 burros, em parte porque os produtores podem se inscrever para receber um subsídio e ficar com os animais: US$ 230/ano por burro.

Se não fosse por esse recurso, "não faria sentido, em termos econômicos, mantê-los", explica Gonçalo Domingues, um agricultor que possui dois Mirandas.

Na verdade, a um custo de US$ 650/ano, não vale a pena, em termos econômicos, manter um burro, mesmo com subsídio. "Os produtores mantêm os animais por amor e não por vantagens financeiras", afirma o veterinário Javier Navas.

Waltraud Kugler, da Fundação SAVE, organização de preservação animal europeia, diz que todos os asininos da Europa estão ameaçados ‒ até no norte do continente, onde são mantidos como animais de estimação nas pradarias, porque o tipo da grama não é bom para sua digestão e o solo, macio demais, prejudica seus cascos.

Justamente por se locomover bem em terreno íngreme e comer pouco, o Miranda é perfeito para as terras altas de Portugal.

Outra esperança de recuperação do animal é o fato de a vida rural estar ganhando novo apelo entre os jovens. Luis Sebastião, policial militar de 22 anos, disse que não se importa em fazer a viagem de ônibus de oito horas de Lisboa, onde trabalha, para passar os fins de semana na terra natal, em Miranda. "É aqui que eu me sinto em casa, ao lado dos burros e de tudo o que torna esse lugar tão especial", diz ele.

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