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A despeito de esforços e clamores contrários, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nesta terça-feira (8) a retirada dos EUA do acordo nuclear com o Irã, firmado em 2015 entre sete países.

A histórica decisão tem o potencial de desestabilizar o equilíbrio político no Oriente Médio, abrindo a "caixa de Pandora", como afirmou o presidente francês, Emmanuel Macron. "Poderia haver uma guerra", disse Macron, na semana passada. Ele foi um dos que tentaram demover o americano da retirada, sem sucesso.

O principal temor é que o regime de Hassan Rouhani retome seu programa nuclear e que haja retaliações por parte de outros países, como Israel, o que pode provocar uma nova guerra na região. O iraniano alertou nesta semana que os EUA teriam um "arrependimento histórico" caso decidissem deixar o pacto. Já o premiê israelense Benjamin Netanyahu fez uma apresentação recente em que acusou o Irã de ter "mentido, e muito" sobre seu arsenal de armas nucleares, e de ter expandido o programa após a assinatura do pacto.

O acordo, firmado entre EUA, Irã, França, Alemanha, Reino Unido, China e Rússia, impôs travas ao programa nuclear do Irã. Como contrapartida, sanções econômicas impostas ao país foram aliviadas, rompendo um isolamento de décadas entre Teerã e o Ocidente. A União Europeia, por exemplo, voltou a comprar petróleo do país, e os EUA descongelaram ativos iranianos em bancos. Montadoras de automóveis anunciaram fábricas e investimentos no Irã, e aeronaves passaram a ser vendidas ao país para substituir a caquética frota da aviação local.

A avaliação feita pelas principais potências europeias, como França e Reino Unido, é de que o combinado teve sucesso ao interromper a ambição nuclear do país. Trump, porém, declarou que considera o acordo "insano" e "um desastre", já que ele não contemplou o programa de mísseis balísticos do Irã, que continua a operar, nem lidou com a intervenção do país nas guerras da Síria e do Iêmen. O americano vem criticando o texto, costurado pelo antecessor Barack Obama, desde sua campanha à Presidência, em 2016.

A retirada dos EUA não significa que o acordo tenha se extinguido. Líderes dos outros seis países que integram o combinado devem reiterar sua permanência e traçar novas estratégias para lidar com a ameaça nuclear iraniana.

O que é o acordo e por que ele enfrenta críticas agora?  

Em sua essência, o acordo de 2015 impõe restrições ao programa nuclear do Irã, tornando impossível para o país produzir uma bomba. Em troca, a maioria das sanções americanas e internacionais contra a economia do país foram retiradas. Mas o acordo também tem uma série de limites de tempo.  

Segundo os termos do documento, o Irã só pode manter um estoque de 300 quilos de urânio pouco enriquecido, em comparação as 100 toneladas que já armazenou. O país pode enriquecer urânio a apenas 3,67%, que pode ser utilizado para abastecer, por exemplo, um reator. No entanto, a porcentagem está longe dos 90% necessários para produzir uma arma atômica. O acordo também limita o número de centrífugas que o país pode operar e as reduziu a modelos mais lentos e antigos.  

O Irã também foi obrigado a reconfigurar um reator de água pesada para que não possa mais produzir plutônio e concordou em converter seu campo de enriquecimento Fordow em um centro de pesquisa. O país ainda concedeu mais acesso aos inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e criou um sistema que permite aos observadores da ONU inspecionarem outros locais.  

Leia também: Irã quebrou acordo e mentiu sobre programa nuclear, afirma Israel

Em troca, potências mundiais retiraram as sanções econômicas paralisantes que haviam bloqueado o Irã das negociações bancárias e de petróleo internacionalmente. Além disso, deram ao país permissão para comprar aeronaves comerciais e realizar negócios em outras áreas. O acordo também descongelou bilhões de dólares que Teerã tinha no exterior.  

O pacto, no entanto, não impede diretamente o país de testar ou disparar mísseis balísticos e possui uma série de datas de vencimento contínuas. Em oito anos, por exemplo, o Irã pode começar a testar até 30 novas centrífugas, número que pode expandir muito dois anos depois. Já quando o acordo completar quinze anos, as restrições ao enriquecimento de urânio e ao tamanho do arsenal do país terminam.  

Depois de 15 anos  

Durante a vigência do acordo, o Irã está limitado a um nível de urânio com o qual não pode produzir uma bomba e, caso o pacto desmorone hoje, especialistas afirmam que seria necessário pelo menos um ano para construir um novo armamento. Se o país violar o acordo, as sanções econômicas podem ser imediatamente reimpostas.  

Depois que os primeiros 15 anos se passarem, o Irã poderá ter uma série de centrífugas avançadas prontas para funcionar e os limites do seu estoque de urânio deixam de existir. Então, poderia se dedicar à produção de urânio altamente enriquecido. No entanto, o Ocidente também estará livre para impor novas sanções. 

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Os criadores e defensores do acordo dizem que a ideia é aumentar o diálogo e a confiança durante os 15 anos e negociar uma extensão ou um novo pacto. Os acordos posteriores, argumentam eles, também podem abordar questões pendentes entre o Irã e o Ocidente.  

O pior negócio de todos os tempos  

O acordo nuclear marcou a maior realização estrangeira do ex-presidente americano Barack Obama. Trump, no entanto, chamou o pacto de "desastre" e de "o pior negócio de todos os tempos" e tem trabalhado para desfazer grande parte das agendas de política interna e externa deixadas por Obama. 

 O atual presidente dos EUA critica o acordo por não incluir o programa de mísseis balísticos do Irã ou o apoio governamental iraniano a grupos como o Hezbollah e a ajuda enviada por eles ao presidente sírio Bashar Assad. Trump também critica o fato de os termos do acordo terem data para expirar. Ele afirma que o pacto "deu à ditadura do Irã uma linha de vida política e econômica".  

O primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu, um dos inimigos do Irã, também critica a negociação. Buscando garantir a retirada de Trump do pacto, ele apresentou na semana passada o que disse ser provas de que o Irã mentiu sobre suas ambições nucleares nos anos 2000. Porém as informações utilizadas por Netanyahu parecem coincidir com as que a AIEA já informara anteriormente sobre o programa nuclear de Teerã. 

Enquanto isso, muitos iranianos dizem que não viram os benefícios econômicos que o presidente Hassan Rohani prometeu com o acordo. O público foi atingido pela espiral inflacionária, que alimentou protestos pelo país em dezembro e janeiro.  

De 'Átomos Para a Paz' às ameaças de guerra  

O programa nuclear do Irã começou com a ajuda dos Estados Unidos. Sob o programa "Átomos para a Paz", os americanos forneceram um reator de testes que entrou em operação em Teerã, em 1967, sob o governo do xá Mohammad Reza Pahlavi.  

O auxílio terminou quando a Revolução Islâmica no Irã derrubou o xá, em 1979. Na década de 1990, o país expandiu seu programa nuclear, comprando equipamentos de Abdul Qadir Khan, considerado o pai do programa nuclear do Paquistão. Dentre as atividades da época, o país "pode ter recebido informações do projeto" de uma bomba e de detonadores explosivos, segundo afirma a AIEA. Em agosto de 2002, serviços secretos ocidentais e um grupo de oposição iraniano encontraram uma instalação nuclear secreta na cidade central de Natanz.  

Conversas e sanções  

No início dos anos 2000, Grã-Bretanha, França e Alemanha iniciaram negociações com o Irã, que foram acompanhadas pelos EUA. Em outubro de 2003, o país suspendeu o enriquecimento de Urânio, mas retomou em 2006, sob a administração de Mahmoud Ahmadinejad.  

As potências mundiais impuseram sanções para tirar Teerã da economia global. Já os EUA, sob o governo Obama, começaram negociações secretas com o Irã em Omã, depois que o presidente Rohani, relativamente moderado, assumiu o poder. O Irã e as potências mundiais finalmente alcançaram o Plano de Ação Integral Conjunto (JCPOA, em inglês), conhecido como o acordo nuclear com o Irã, em 2015.  

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