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Esta é a fala que pode ter afundado uma campanha presidencial. “[Barack Obama] sabe exatamente o que está fazendo”, o pré-candidato republicano Marco Rubio disse no debate do último sábado (13)...E repetiu de novo e de novo e de novo. “[Ele] está realizando um esforço sistemático para mudar esse país, para tornar os Estados Unidos mais parecidos com o resto do mundo”.

Dizem que o pecado de Rubio é uma questão de estilo. Ele repetiu a fala quase roboticamente. Mas e o que dizer sobre o conteúdo do que ele disse?

A acusação de o presidente Obama estar tentando transformar de maneira fundamental os Estados Unidos é uma bandeira cara aos talk-shows de direita. Como aponta o jornalista Paul Waldman, o radialista Rush Limbaugh, o apresentador de televisão Glenn Beck e outros, rotineiramente, as políticas de Obama são intencionalmente desenhadas para transformar os Estados Unidos e entorpecer suas distintas vantagens.

Rubio adverte que talvez esta seja nossa última chance. Se as políticas de Obama continuarem, ele sugere, os Estados Unidos se tornariam apenas mais um país como os outros.

Essa retórica realmente levanta uma importante questão. O que torna os Estados Unidos excepcionais? Todos os políticos americanos – incluindo Obama – usam essa palavra. A maioria se ajoelha diante dela. Mas poucos efetivamente a definem.

Atualmente, o termo conhecido por “Excepcionalismo Americano” [teoria que aponta que os EUA são diferentes do resto do mundo] é frequentemente visto como econômico. Muitos conservadores dizem que o Obamacare (a reforma do sistema de saúde implantada por Obama) a política de energia e as regulações financeiras efetivadas pela lei Dodd-Frank acabaram com uma diferença central entre os Estados Unidos e o resto do mundo ao expandir o papel do Estado na economia.

Mas quão limitado é o governo americano? A conservadora Fundação Heritage publica anualmente um “índice de liberdade econômica” que ranqueia os países de acordo com o grau de liberdade econômica (em termos de ausência de interferência governamental). Os Estados Unidos aparecem em 11º lugar, atrás de Canadá, Austrália, Irlanda, Nova Zelândia, Chile, Suíça e Cingapura. Isso não parece muito excepcional.

Na verdade, o Estado de bem-estar social americano é razoavelmente grande, mas tem sido implantado de maneira complexa – em parte para ocultar seu tamanho. Assim que você inclui “renúncias fiscais” – como a isenção para os valores que empregadores gastam com planos de saúde para seus empregados – o tamanho do governo federal aumenta para 4% do produto interno bruto, de acordo com uma estimativa. E assim que você inclui “gastos sociais privados”, uma expressão que pesquisadores usam para designar despesas privadas como aquelas em saúde, parte das quais é exigida e disciplinada por lei, o tamanho dos gastos sociais dos Estados Unidos sobe para o segundo lugar entre todos os países ricos do mundo, superados apenas pelos da França, informa a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.

O mais importante é que o tamanho do governo dos Estados Unidos não pode ser o que tem tornado o país excepcional. No século 19, os países europeus também tinham estados “vigia noturno” – na verdade, muitos eram ainda menores que o americano. Os Estados Unidos, afinal, foram pioneiros ao oferecer educação de nível médio para todos. Mas desde o começo, os Estados Unidos eram excepcionais. Então obviamente se tratava de algo além da política fiscal.

E liberdade? Certamente liberdade era importante, mas a Revolução Francesa foi impulsionada por uma ideia semelhante – ainda que nunca implementada com sucesso. E as ideias americanas sobre liberdade eram sempre vistas como algo em desenvolvimento, já que o país negou essa liberdade a uma parcela substancial de sua população. Lembre-se que, em 1860, os Estados Unidos eram incomuns, se não excepcionais, entre as nações ocidentais em virtude da prevalência generalizada da escravidão.

O que, então, tornou os Estados Unidos excepcionais desde o começo? Era um país fundado não em raça, etnia, ou religião, mas em ideias. E, crucialmente, essas ideias eram abertas a todos. Essa abertura para pessoas, ideias, culturas e religiões resultou na criação de uma nova pessoa – o americano.

O grande historiador Gordon Wood explica sua visão do “Excepcionalismo Americano”: “Em um sentido importante, nós nunca fomos uma nação em nenhum sentido tradicional do termo. (...) Nós americanos não temos uma nacionalidade da maneira como outros povos têm (...) o que, com certeza, é a razão pela qual conseguimos absorver imigrantes mais facilmente do que eles.”

Outros países têm estados reduzidos e baixa carga tributária, e existem muitas democracias liberais, ou mesmo repúblicas. Mas nenhum outro país acreditou desde o início na ideia de abertura e mistura de povos. Os Estados Unidos são uma nação fundada na diversidade – de raça, de religião e de país de origem.

Existem esforços para mudar os Estados Unidos. Existem planos para introduzir restrições a religiões ou etnias para barrar imigrantes e mesmo turistas ou para rastrear imigrantes e turistas uma vez que eles tenham entrado no país. Tem havido propostas para a deportação de pessoas, incluindo cidadãos americanos. Existem propostas para se monitorar templos religiosos.

Essas ideias iriam transformar de maneira fundamental os Estados Unidos, rasgando o seu DNA fundador. Tornariam o país muito mais parecido com o resto do mundo, apenas mais uma nação em que certos grupos étnicos e religiões são privilegiados e outros são excluídos, um país em que a diversidade é uma ameaça ao caráter e à unidade nacionais ao invés de uma força.

E quem está propondo essas mudanças? De última vez que eu verifiquei, não era Barack Obama.

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