• Carregando...
Manifestação contra a repressão em Xinjiang realizada na semana passada pela Anistia Internacional, perto da Assembleia Nacional da França, em Paris
Manifestação contra a repressão em Xinjiang realizada na semana passada pela Anistia Internacional, perto da Assembleia Nacional da França, em Paris| Foto: EFE/EPA/YOAN VALAT

Na próxima sexta-feira (4), com a abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2022, Pequim vai se tornar a primeira cidade da história a ter sediado tanto a Olimpíada de Inverno quanto a de Verão (esta em 2008).

Entretanto, assim como os Jogos de Verão de Moscou de 1980 ficaram marcados pelo boicote de Estados Unidos e aliados devido à invasão soviética do Afeganistão, Pequim-2022 começará com a mancha do boicote diplomático de americanos e outros países do Ocidente – os atletas ainda competirão na capital chinesa, mas não haverá presença de autoridades dessas nações.

O principal foco desse protesto é a perseguição aos uigures e outras minorias muçulmanas na região chinesa de Xinjiang.

Em dezembro, o Tribunal Uigur, um tribunal popular criado em Londres pelo advogado inglês Geoffrey Nice, concluiu que a China cometeu torturas, crimes contra a humanidade e genocídio contra os uigures e outras minorias étnicas na região.

A corte apontou que centenas de milhares de uigures (com algumas estimativas apontando números superiores a 1 milhão) foram detidos pelas autoridades chinesas nos últimos anos e relatou situações como deportação ou transferência forçada, tortura, estupro, violência sexual, esterilização forçada, perseguição e desaparecimento forçado, entre outras.

O tribunal também concluiu que ocorreu genocídio em Xinjiang, com políticas como impor condições para reduzir o número de nascimentos de uigures (que consistiram na orquestração de imigração de pessoas da etnia han, majoritária na China, e emigração de uigures por meio de encarceramento, dessa forma dificultando a perpetuação desta etnia, além de esterilizações e abortos forçados) e transferência forçada de crianças.

Além do boicote diplomático a Pequim-2022, o presidente americano, Joe Biden, assinou em dezembro uma lei para proibir as importações de Xinjiang, devido a uma “presunção refutável” de que todos os produtos da região são fabricados por meio de trabalhos forçados. As importações de Xinjiang só serão autorizadas se houver provas de que o produto não foi confeccionado com trabalho forçado.

No fim das contas, o Ocidente manda sinais contraditórios sobre a repressão aos uigures, porque dois fatos ocorridos recentemente dão a entender que, apesar do boicote diplomático aos Jogos de Inverno e da nova lei americana, a preocupação com essa minoria não é exatamente uma prioridade.

O investidor Chamath Palihapitiya causou furor ao declarar numa entrevista a um podcast americano que “ninguém se importa com o que está acontecendo com os uigures”. “Você fala disso porque realmente se importa, e acho legal que você realmente se importe, o resto de nós não se importa. Só estou dizendo uma verdade muito dura e feia”, disse Palihapitiya ao apresentador do podcast.

O time de basquete Golden State Warriors, do qual o investidor é sócio minoritário, se apressou em divulgar um comunicado em que apontou que as opiniões de Palihapitiya não refletem as da equipe.

Em meio a muitas críticas, Palihapitiya voltou atrás e reconheceu “falta de empatia” nas suas declarações. “Como refugiada, minha família fugiu de um país (Sri Lanka) com seu próprio conjunto de problemas de direitos humanos, então isso é algo que faz parte da minha experiência de vida. Para ser claro, minha crença é que os direitos humanos são importantes, seja na China, nos Estados Unidos, ou em qualquer outro lugar. Ponto final”, escreveu no Twitter.

Vista grossa para as violações aos direitos humanos

Outro fato recente não foi uma declaração explícita como a de Palihapitiya, mas também provocou reação.

Na véspera de Ano Novo, a Tesla, fabricante de carros elétricos de propriedade do bilionário Elon Musk, abriu um showroom em Xinjiang. O movimento Democracia Sem Fronteiras apontou em comunicado que “a empresa poderia liderar um movimento em defesa da democracia e liberdade, porém optou por ignorar isso”.

“Entendemos que ao se instalar em um país que, claramente, não respeita direitos humanos e liberdades, a empresa reforça e contribui com atos de violação, visto que está ignorando tudo que está acontecendo ao redor da fábrica”, acrescentou o movimento. “O novo showroom da Tesla evidencia o quanto a relevância econômica da China e a oportunidade de ampliação de negócios se sobrepõem à proteção dos direitos humanos.”

No Twitter, o senador republicano Marco Rubio também criticou Musk. “As corporações sem-nação estão ajudando o Partido Comunista Chinês a encobrir o genocídio e o trabalho escravo na região”, disparou.

Em artigo recente para o site da BBC, o jornalista Robin Brant apontou que a relação Tesla-Xinjiang é apenas uma amostra de uma realidade incômoda: de olho em custos de produção menores e no imenso mercado chinês, grandes corporações do Ocidente há anos ignoram as violações de direitos humanos na China – a Volkswagen, por exemplo, tem uma fábrica em Xinjiang, lembrou Brant.

“Os líderes da China dizem que os Jogos de Inverno são sobre ficar acima de questões políticas. É uma distinção que algumas das empresas que procuram se expandir ou se estabelecer no que consideram um mercado irresistível querem que você faça também”, concluiu.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]