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O ditador da Venezuela Nicolás Maduro (à direita) cumprimenta o guru indiano Sri Sri Ravi Shankar no Palácio de Miraflores, em Caracas. Maduro disse que convidou o guru para que ele ajude a resolver a crise da Venezuela
O ditador da Venezuela Nicolás Maduro (à direita) cumprimenta o guru indiano Sri Sri Ravi Shankar no Palácio de Miraflores, em Caracas. Maduro disse que convidou o guru para que ele ajude a resolver a crise da Venezuela| Foto: Palácio de Miraflores / AFP

Enquanto representantes do regime socialista da Venezuela e da oposição ao chavismo começam uma nova rodada de negociações para tentar reduzir a crise política no país, uma questão permanece central para qualquer perspectiva de um avanço: o destino do ditador Nicolás Maduro.

As conversas na ilha caribenha de Barbados, que estão sendo mediadas pela Noruega, acontecem depois de duas rodadas fracassadas em Oslo. Publicamente, os lados permanecem distantes. O regime venezuelano insiste que as sanções internacionais dos EUA devem ser suspensas, enquanto oficiais da oposição exigem eleições presidenciais novas e fiscalizadas ​​e o fim da "ditadura de Maduro".

Mas reservadamente, altos membros da oposição estão debatendo internamente uma oferta que alguns argumentam que pode ajudar a romper o impasse: a possibilidade de que Maduro permaneça temporariamente na presidência enquanto novas eleições forem preparadas, se certas condições forem cumpridas. Alguns estão até sugerindo a ideia de que Maduro poderia concorrer à reeleição, calculando que suas taxas de aprovação são tão baixas que ele quase não tem chance de ganhar uma disputa livre e justa.

Pessoas familiarizadas com as negociações - falando sob condição de anonimato para discutir deliberações internas - advertem que as ofertas ainda estão em debate e podem nunca chegar à mesa de negociações. Para começar, o governo de Maduro, eles dizem, ainda não sinalizou sua disposição de realizar uma nova eleição presidencial. E a questão do destino de Maduro, insistem os líderes da oposição, só seria discutida depois que tal compromisso fosse alcançado.

Além disso, alguns na oposição permanecem fortemente contra qualquer acordo que não envolva a saída imediata de Maduro. No entanto, as discussões internas sugerem o quanto a oposição pode estar disposta a ir para garantir um acordo no momento em que tanto Maduro quanto seus opositores estão sob crescente pressão para chegar a um acordo que comece a enfrentar a vasta crise humanitária que se desenrola na Venezuela.

"O cenário preferido para a maioria dos venezuelanos é acabar com esta crise por meio de eleições livres e justas", disse um importante líder da oposição. "É secundário se Maduro permanece no poder por um período temporário."

Existem incentivos para chegar a um acordo em ambos os lados.

As duras sanções dos EUA e o crescente isolamento internacional atingiram duramente o regime de Maduro, transformando a Venezuela em um estado pária apoiado principalmente por Rússia, China e Cuba. Essas sanções - particularmente uma proibição rígida dos EUA sobre as importações de petróleo bruto e acesso restrito aos mercados financeiros dos Estados Unidos - atingiram em cheio o setor petrolífero já decadente da Venezuela, agora com seu nível mais baixo de produção desde a década de 1940.

As reuniões em Barbados acontecem dias após a alta comissária para os Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, Michelle Bachelet, publicar um relatório denunciando a erosão do estado de direito sob Maduro, incluindo mais de 6.000 assassinatos extrajudiciais desde 2018. O relatório também cita tortura de opositores políticos, repressão à imprensa e o uso de comida e água como armas políticas.

As reuniões desta semana tinham sido marcadas para a semana passada, mas foram adiadas depois da suposta tortura e assassinato de um capitão da marinha detido, Rafael Acosta. Acosta morreu enquanto estava sob a custódia de forças de contrainteligência militar, horas após aparecer no tribunal em uma cadeira de rodas e ser enviado para um hospital por ordem de um juiz.

Antes da morte de Acosta, o ministro das Comunicações de Maduro, Jorge Rodriguez, afirmou na televisão nacional ter descoberto uma suposta nova tentativa fracassada de golpe contra o governo.

No entanto, a oposição - liderada por Juan Guaidó, que foi reconhecido por mais de 50 países, incluindo Brasil e Estados Unidos, como o governante legítimo da Venezuela - também está ficando sem tempo e, potencialmente, energia. Seus esforços para fazer com que altos funcionários de Maduro se voltem contra ele falharam, e a oposição foi atingida no mês passado por alegações de que dois de seus membros desviaram mais de US$ 60 mil da ajuda destinada a soldados venezuelanos que fugiram para a Colômbia.

"Na Venezuela, a premissa do 'tudo ou nada' desapareceu", disse Jesus Seguias, analista político e diretor da agência de pesquisas Datincorp. "Ambos os lados não têm outra opção senão sentar e negociar".

Nos últimos anos, o regime de Maduro participou de repetidas negociações com a oposição, sem resultados. Por vezes, as conversas se aproximaram do bizarro. Na segunda-feira, por exemplo, Maduro realizou uma coletiva de imprensa e comemorou o apoio do guru indiano Sri Sri Ravi Shankar, que ele disse que agora estava ajudando no processo de diálogo com seu "conhecimento de meditação".

Maduro culpou a oposição na segunda-feira pelos fracassos do passado, mas insistiu que a sessão de abertura de cinco horas foi bem-sucedida. "Nós estabelecemos um cronograma de seis pontos de discussão", disse ele. "Estou muito otimista."

Durante meses, Guaidó e outros na oposição pareciam insistir que Maduro precisaria renunciar imediatamente como parte de qualquer acordo, dadas as válidas alegações de fraude na eleição de 2018.

Críticos das negociações, incluindo altos representantes da oposição, dizem que o regime de Maduro está simplesmente ganhando tempo e não tem intenção de concordar com uma nova eleição presidencial. Até agora, ele só ofereceu novas eleições legislativas, uma proposta que a oposição vê como inaceitável.

"Que diabos é isso? Diálogo de novo?" O ex-líder da oposição e ex-prefeito de Caracas Antonio Ledezma disse em um tuíte no domingo. Ele acrescentou: "Não há pior ofensa do que pensar que as pessoas são burras".

Mas outros na oposição dizem que um acordo pode ser possível. Uma opção: que um Maduro "sem poder" permaneça no cargo por, digamos, nove meses, durante os quais a comissão eleitoral será renovada, monitores internacionais convocados e novos registros de eleitores serão realizados. Caso Maduro se recuse, dizem representantes da oposição, isso os ajudará a pressionar sua exigência de que os parceiros internacionais façam mais para forçar sua saída.

A questão do que acontece com Maduro a longo prazo é mais complicada. Muitos na oposição insistem que ele deve pagar pelos crimes de seu governo e não deve ser incluído em ofertas de anistia. Outros sugerem que sua melhor opção pode ser buscar refúgio fora da Venezuela, talvez na República Dominicana ou em Cuba.

"Mas primeiro", disse uma pessoa envolvida na estratégia da oposição, "precisamos chegar a esse ponto".

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