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Papa Francisco fala durante a audiência geral das quartas-feiras na praça de São Pedro, no Vaticano | TIZIANA FABI/AFP
Papa Francisco fala durante a audiência geral das quartas-feiras na praça de São Pedro, no Vaticano| Foto: TIZIANA FABI/AFP

O papa Francisco convocou os presidentes das conferências episcopais do mundo para uma cúpula em fevereiro de 2019. A reunião será realizada para discutir a prevenção do abuso sexual e a proteção das crianças na Igreja Católica, em um sinal de que o pontífice percebeu as dimensões globais do escândalo e considera que a falta de ação ao lidar com o assunto é uma ameaça ao seu legado.

A reunião de 21 a 24 de fevereiro com os presidentes das mais de 100 conferências episcopais do mundo será a primeira desse tipo e sinaliza a percepção, nos níveis mais altos da Igreja, de que o problema do abuso sexual não se restringe ao mundo anglo-saxão, onde o escândalo apareceu em primeiro lugar.

No início deste ano, Francisco enfrentou a pior crise de seu papado, quando repetidamente desacreditou vítimas de um notório padre abusador chileno. Mais tarde, ele admitiu ter cometido "sérios erros de julgamento" e tomou medidas de reparação, punindo os bispos culpados e refazendo o episcopado chileno, o qual acusou de alimentar uma "cultura de encobrimento". 

Os principais cardeais conselheiros de Francisco anunciaram sua decisão nesta quarta-feira, um dia antes de o papa se encontrar com líderes da Igreja nos Estados Unidos, país abalado pelas acusações recentes apontando décadas de abuso sexual e encobrimento dos crimes cometidos por padres e bispos.

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Mais recentemente, o papado de Francisco foi sacudido por acusações do arcebispo Carlo Maria Viganò, ex-núncio (embaixador) nos Estados Unidos. Segundo ele, há uma ampla rede de bispos e cardeais dedicada a encobrir abusadores e promover bispos que defendem mudanças na doutrina moral da Igreja. Viganò ainda afirmou que Francisco teria conhecimento de punições supostamente impostas pelo papa Bento 16° ao arcebispo americano Theodore McCarrick por ter molestado e assediado seminaristas adultos, mas não teria agido para que as medidas fossem postas em prática. 

O Vaticano não respondeu às acusações de Vigano, mas prometeu "esclarecimentos", que provavelmente virão depois da reunião de quinta-feira. A delegação norte-americana será dirigida pelo cardeal Daniel DiNardo, presidente da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, e também incluirá o cardeal Sean O'Malley, arcebispo de Boston e o principal encarregado pelo papa de investigações contra abusadores.

DiNardo disse querer que Francisco autorize uma investigação completa contra McCarrick, que deixou de ser cardeal em julho, após ter molestado um adolescente. O Vaticano teria conhecimento, pelo menos desde 2000, que McCarrick tinha envolvimento com jovens. DiNardo acrescentou que as acusações de encobertamento de McCarrick envolvendo as principais autoridades do Vaticano, incluindo o atual papa, merecem respostas. 

Em 2011, no papado de Bento 16°, o Vaticano ordenou que cada conferência episcopal desenvolvesse diretrizes para evitar o abuso de menores e adultos vulneráveis. As diretrizes deveriam especificar como os bispos devem cuidar das vítimas, punir os infratores e manter os pedófilos fora do sacerdócio. Embora a maioria das conferências tenha seguido a ordem, algumas, particularmente na África, não o fizeram, citando falta de recursos ou outros impedimentos. E a própria Cidade do Vaticano não tem essa política, embora a Santa Sé tenha prometido às Nações Unidas, cinco anos atrás, que estava desenvolvendo um "programa de ambiente seguro" para proteger crianças dentro de seu território.

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A conferência episcopal dos EUA emitiu, em 2002, o que é considerada uma das melhores políticas para lidar com abusos, exigindo que as denúncias sejam relatadas à polícia e determinando a remoção permanente do ministério de qualquer padre que tenha abusado de um menor. Mas essa política foi questionada recentemente, dado que bispos impunes, como McCarrick, podem ser julgados apenas pelo papa, segundo as regras da Igreja. 

A credibilidade da Igreja norte-americana está em frangalhos, tanto pelo escândalo McCarrick como por recentes revelações no relatório produzido por um júri da Pensilvânia, que descobriu que cerca de 300 padres abusaram de mais mil crianças desde 1940 e foram acobertados por uma série de bispos em seis dioceses – incluindo o atual arcebispo de Washington, o cardeal Donald Wuerl. Ele foi bispo de Pittsburgh por cerca de 18 anos e ofereceu sua renúncia há quase três anos, quando completou 75 anos, de acordo com as determinações da Igreja. O papa Francisco, no entanto, tem mantido Wuerl no cargo. Em uma carta aos padres na terça-feira, Wuerl disse que retornaria a Roma em breve para discutir sua renúncia, ciente de que é hora para uma nova liderança. 

Desde que o relatório da Pensilvânia foi publicado no mês passado, promotores em meia dúzia de estados americanos anunciaram planos para realizar investigações similares. E os EUA não estão sozinhos na escavação do passado. Na quarta-feira, a mídia alemã divulgou um estudo encomendado pela própria Igreja sobre abusos dentro da instituição alemã. A pesquisa registrou 3.677 casos de abusos entre 1946 e 2014, com mais da metade das vítimas de 13 anos ou menos, a maioria meninos. Um sexto dos casos envolveu estupro e pelo menos 1.670 clérigos estavam ligados aos crimes, segundo o Spiegel Online e o Die Zeit, que obtiveram o relatório antes de sua data prevista de divulgação, em 25 de setembro.

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