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Forças iraquianas montam guarda para evitar o avanço do Estado Islâmico perto de Bagdá | Alaa Al-Marjani/Reuters
Forças iraquianas montam guarda para evitar o avanço do Estado Islâmico perto de Bagdá| Foto: Alaa Al-Marjani/Reuters

A criação do Estado Islâmico (EI) por um grupo de militantes sunitas pode parecer repentina para quem acompanha o conflito no Oriente Médio de longe. Na realidade, a região já é fragmentada em diferentes grupos religiosos e étnicos há bastante tempo e diversas facções radicais ameaçam se insurgir. É difícil prever quais dessas facções se destacarão, mas a tentativa de se formar um novo Estado com base na sharia (lei islâmica) não surpreende, como diz o cientista político Heni Ozi Cukier, da Escola Superior de Propaganda e Mar­­keting (ESPM). Ele conversou por telefone com a reportagem e explicou como esse novo Estado pode se estabelecer mesmo sem o reconhecimento do Ocidente.

O Estado Islâmico foi proclamado como um califado. O que significa?

O califado é a ideia de construir um Estado Islâmico, réplica do que existiu historicamente com as dinastias islâmicas, onde a sharia é o regime que governa as interações dentro desse Estado. Era o objetivo da Al-Qaeda e da maioria das organizações radicais.

Como o EI conseguiu se desenvolver longe dos holofotes e agora tem poder para proclamar um estado?

Há uma série de grupos parecidos com eles, uma multiplicidade de potenciais ameaças, não tem como medir qual vai se sobressair. Há guerra civil no Iraque e na Síria. O Estado Islâmico já existia, todo mundo sabia da existência, todo mundo monitorava. A novidade é o sucesso do avanço deles. Isso não tinha como ser previsto porque são regiões que estão passando por uma guerra civil, com muita instabilidade. Talvez a mídia não coloque a gravidade do que está acontecendo e a opinião pública também não está interessada nos detalhes do que acontece em cada um desses países.

O Estado Islâmico está na fronteira da Síria com o Iraque. Como esses países defenderão suas fronteiras?

Eles não têm controle sobre o próprio território e existe uma questão até maior: na Síria quem é o governo legítimo? Depois do impacto da guerra civil e do número de mortos, a comunidade internacional não reconhece o Assad. A Síria não tem condições e nem o Iraque. Parte do que acontece hoje no Iraque é resultado da política do atual primeiro-ministro [Nouri al-Maliki] que usou essas divisões internas para se consolidar. Está havendo uma desintegração total das fronteiras do Oriente Médio: Síria deixando de ser Síria, Iraque deixando de ser Iraque, Iêmen, Líbia...Egito se mantém porque é um país milenar, mas, mesmo assim, bem frágil. Outros que estão de pé, estão vendo tudo isso e a coisa fica bastante preocupante.

Essa região foi escolhida estrategicamente devido à instabilidade nos dois países?

Há uma convergência desse território com o grupo que está no comando, porque o EI é sunita. Exatamente a parte onde o governo exerce menos poder é na de domínio total sunita. É importante lembrar que na Síria ocorre o contrário do que no Iraque. O Iraque era um país de minoria sunita que controlava uma maioria xiita. Com a queda do Saddam Hussein, a maioria xiita tomou o poder e passa a controlar a minoria sunita, e ainda existem os curdos. Na Síria, é uma minoria xiita (os alauítas) que controla uma maioria sunita e não consegue exercer poder sobre o território todo.

O Estado Islâmico não tem reconhecimento de organizações interna­­cionais do Ocidente. Isso não vai inviabilizar sua instalação?

No comércio internacional, ficarão isolados para o Ocidente. Outros países da região vão comprar petróleo deles e não é de se surpreender se a China um dia vier a comprar petróleo deles. Do ponto de vista do status, do respeito, pode ser que eles não tenham [reconhecimento internacional]. Mas isso não inviabiliza a existência do Estado. O Irã está aí vivo com 30 anos de sanções.

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