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Joe Biden, pré-candidato à presidência dos EUA pelo partido Democrata nas eleições de 2020, discursa em Wilmington, Delaware, 24 de setembro de 2019
Joe Biden, pré-candidato à presidência dos EUA pelo partido Democrata nas eleições de 2020, discursa em Wilmington, Delaware, 24 de setembro de 2019| Foto: Olivier Douliery / AFP

O presidente dos EUA, Donald Trump, e seus aliados alegaram que o ex-vice-presidente Joe Biden, que é um dos favoritos para ser adversário de Trump na disputa presidencial de 2020, interferiu nos assuntos da Ucrânia para proteger o seu filho. Trump, por sua vez, pressionou o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, a investigar a família Biden. O caso está no centro do processo de impeachment aberto pela Câmara dos Deputados americana, de maioria democrata.

Trump alega que Biden, em 2015, pressionou o governo ucraniano a demitir Viktor Shokin, o procurador-geral da Ucrânia, porque ele estava investigando a maior empresa privada de gás da Ucrânia, a Burisma, que havia adicionado o filho de Biden, Hunter, ao seu conselho em 2014.

Sim, a Burisma estava sendo investigada. E sim, Biden estava pressionando para que Shokin fosse demitido. A circunstância em que isso ocorreu, porém, parece ser diferente da narrativa adotada pelo presidente Donald Trump, segundo relatos do procurador-geral ucraniano que deixou o cargo no fim de agosto, Yuriy Lutsenko, e outras fontes com conhecimento do caso.

A investigação

A Burisma começou a ser investigada em 2014, depois da queda do então presidente ucraniano, Viktor Yanukovych (pró-Rússia). As suspeitas recaíam sobre um dos fundadores da Burisma, Mykola Zlochevsky, que também já havia sido ministro da Ecologia entre 2010 e 2012. Mas essa investigação fazia parte de um inquérito de corrupção muito mais abrangente, centrado em outro empresário ligado ao governo de Yanukovych: Serhiy Kurchenko, que possuía um grupo de empresas do setor de gás. Kurchenko foi acusado de lavagem de dinheiro, sonegação de impostos e roubo de bens do Estado.

Essas investigações se referem a casos que ocorreram antes de o filho do ex-vice-presidente Joe Biden, Hunter Biden, ingressar no conselho da Burisma - o que se concretizou em abril de 2014.

"Biden definitivamente não estava envolvido", disse Lutsenko em maio deste ano. "Não temos motivos para pensar que houve alguma irregularidade a partir de 2014".

Os EUA e a União Europeia impuseram sanções a Kurchenko e seus bens foram congelados. O empresário fugiu do país em fevereiro de 2014. Zlochevksy fez o mesmo no fim daquele ano, quando o escritório do promotor geral da Ucrânia abriu várias investigações sobre ele e seus negócios - incluindo suspeita de sonegação de impostos e lavagem de dinheiro.

Viktor Shokin

Portanto, quando Viktor Shokin foi nomeado procurador-geral da Ucrânia, em fevereiro de 2015, ele herdou as investigações sobre Zlochevsky. Mas ele foi amplamente criticado pelas potências ocidentais por não investigar a fundo os casos.

"Shokin não estava investigando. Ele não queria investigar a Burisma", disse Daria Kaleniuk, do Centro de Ação Anticorrupção da Ucrânia, ao Washington Post em julho. "E Shokin foi demitido não porque ele queria fazer essa investigação, mas pelo contrário, porque ele falhou nessa investigação”.

Biden de fato pressionou pela saída de Shokin, assim como muitas autoridades ocidentais. Em setembro de 2015, o embaixador dos EUA na Ucrânia, Geoffrey Pyatt, criticou publicamente o escritório de Shokin por impedir uma investigação britânica de lavagem de dinheiro contra Zlochevsky.

Em uma aparição em 2018 no Conselho de Relações Exteriores, Biden se gabou de seu papel na remoção de Shokin, dizendo que havia retido US$ 1 bilhão em garantias de empréstimos à Ucrânia como alavanca para forçar a demissão. Mas Biden estava falando sobre uma política desenvolvida no Departamento de Estado e coordenada com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional.

O procurador-geral ucraniano foi considerado um fracasso e "os esforços de Joe Biden para expulsar Shokin foram universalmente elogiados", disse Anders Aslund, economista sueco fortemente envolvido nas reformas de mercado da Europa Oriental. Livrar-se de Shokin era considerado o ponto principal dos esforços de reforma, mas as autoridades americanas tinham uma lista de mudanças que o governo da Ucrânia precisava fazer antes que pudesse obter outra garantia de empréstimo.

Em dezembro de 2015, Biden viajou para Kiev e criticou o "câncer da corrupção" no país em um discurso ao parlamento. "O Gabinete do Procurador-geral precisa desesperadamente de uma reforma", observou. Shokin foi afastado do cargo três meses depois, e Biden anunciou em 15 de abril de 2016 que o empréstimo estava garantido; o acordo entre os Estados Unidos e a Ucrânia foi assinado em 3 de junho daquele ano.

Os processos contra a Burisma acabaram sendo encerrados em 2017. Porém, um caso contra Zlochevsky foi reaberto em 2019, no qual a procuradoria da Ucrânia investiga se a venda de um terminal de armazenamento de petróleo no sul da Ucrânia, de Zlochevksy para Kurchenko, em novembro de 2013, ajudou Kurchenko a lavar dinheiro.

Hunter Biden e a Burisma

Certamente, pode-se levantar questões sobre a decisão de Hunter Biden de ingressar no conselho de Burisma em uma época em que seu pai teve um papel de destaque na diplomacia com o governo da Ucrânia.

Yoshiko M. Herrera, professor de ciência política da Universidade de Wisconsin em Madison e especialista em Rússia e Eurásia, disse ao Washington Post que parece que há um conflito de interesses, mesmo que nenhuma lei tenha sido violada. “É um grande negócio. É o vice-presidente, que é a pessoa principal da política do governo Obama na Ucrânia, e seu filho é subitamente contratado para ser diretor do conselho do maior produtor privado de gás da Ucrânia".

Hunter Biden ocupou o posto de conselheiro da Burisma até o início deste ano e teria recebido uma compensação de até US$ 50.000 por mês. Ele nunca foi investigado na Ucrânia.

Com informações de Bloomberg e Washington Post.

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