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Bruce Bagley, professor da Universidade de Miami e especialista em crime organizado, foi acusado de lavar cerca de US$ 3 milhões da Venezuela
Bruce Bagley, professor da Universidade de Miami e especialista em crime organizado, foi acusado de lavar cerca de US$ 3 milhões da Venezuela| Foto: Reprodução / Washington Post

Bruce Bagley sabe muito sobre lavagem de dinheiro. Até demais, dizem os promotores federais.

Por décadas, o professor da Universidade de Miami tem sido a fonte preferida de jornalistas que buscam entender os mundos sombrios do narcotráfico, crime organizado e corrupção dentro governos na América Latina e além. Mas, nos últimos anos, dizem as autoridades, ele se envolveu intimamente com a mesma corrupção que estudou, ajudando a lavar US$ 3 milhões em dinheiro sujo da Venezuela e embolsando cerca de US$ 300.000.

"A única lição a ser aprendida hoje com o professor Bagley é que o envolvimento em esquemas públicos de corrupção, suborno e peculato levará a uma acusação", disse William F. Sweeney Jr., chefe do Escritório do FBI em Nova York, em comunicado.

Nesta segunda-feira (18), o FBI prendeu Bagley, que coeditou o livro de 2015 "Tráfico de drogas, crime organizado e violência nas Américas hoje", disseram autoridades. Um comunicado da Universidade de Miami disse que ele havia sido colocado em licença administrativa "à luz desse desenvolvimento".

"Estou me sentindo bem", disse Bagley, 73, à CBS Miami na segunda-feira. "Inocente. É assim que estou me sentindo. Eles entenderam tudo errado".

Considerado um dos principais especialistas em seu campo, Bagley atuou como consultor do FBI, do Departamento de Estado, da agência de Administração de Repressão a Drogas (DEA) e outras agências federais, de acordo com sua biografia oficial. Ele foi repetidamente convidado a testemunhar perante o Congresso, serviu como testemunha especializada em julgamentos de alto nível e emprestou sua experiência em tópicos como lavagem de dinheiro aos governos da Colômbia, Equador, Bolívia, Panamá e México.

Erick Cruz, advogado de defesa de Miami que usou Bagley como testemunha especializada em um julgamento de tráfico de cocaína em outubro, disse ao Miami Herald que a prisão do professor foi "bastante chocante". Na graduação na Universidade de Miami, ele cursara a turma de Bagley na aula de "Tráfico de Drogas nas Américas", disse ele ao jornal.

"Lembro-me dele dizendo à turma: 'Não é um curso prático, é uma revisão histórica'", disse Cruz.

Como professor de relações internacionais, Bagley publicou densos artigos acadêmicos com títulos como "A Guerra dos Novos Cem Anos? Segurança Nacional dos EUA e a Guerra às Drogas na América Latina". Em um artigo de 2002, ele alertou que os sindicatos russos de crimes "foram capazes de oferecer serviços de lavagem de dinheiro de risco relativamente baixo a uma variedade de traficantes de drogas sul-americanos, às vezes cobrando até 30% dos lucros".

Ele também apareceu com frequência na imprensa, tendo aparecido em uma matéria de 1993 no Washington Post sobre o tráfico de cocaína no Panamá como um "especialista em lavagem de dinheiro da Universidade de Miami". Repórteres de agências como New York Times e NPR o procuraram rotineiramente para falar sobre temas como as tentativas do governo dos EUA de combater o narcotráfico no exterior e os protestos contra o ditador venezuelano Nicolás Maduro. Como o repórter da WLRN Danny Rivero apontou no Twitter, poucas horas antes da notícia da prisão de Bagley, ele foi citado como especialista em uma história do PolitiFact sobre o valor das drogas traficadas na fronteira com os EUA.

Em janeiro, Bagley conversou com o Washington Post para uma história sobre Joaquín "El Chapo" Guzmán Loera, que na época estava sendo julgado no Brooklyn.

"Você não pode cortar a cabeça", disse Bagley, referindo-se ao cartel de Sinaloa. "A descentralização torna difícil rastrear, capturar e prender todos os tentáculos, e há muito dinheiro fluindo pela organização".

As acusações contra Bagley

Nos últimos anos, dizem os promotores, Bagley começou a usar seus conhecimentos para canalizar dinheiro "que se acredita derivar de suborno e corrupção em conexão com projetos de obras públicas na Venezuela" para os Estados Unidos.

Registros estaduais mostram que Bagley e sua esposa eram sócios de uma empresa chamada Bagley Consultants Inc. em 2005. A empresa, referida como "Empresa-1" na acusação, mal atuou durante sua primeira década de existência e, em 2017, o Departamento de Estado da Flórida a dissolveu por não apresentar um relatório anual.

Mas antes que isso acontecesse, dizem os promotores federais, Bagley abriu uma conta bancária em nome da empresa. Então, em novembro de 2017, ele começou a receber depósitos mensais de aproximadamente US$ 200.000 por vez. O dinheiro veio de uma conta bancária nos Emirados Árabes Unidos, que supostamente pertencia a uma empresa de alimentos, e de outra conta localizada na Suíça, que usava o nome de uma empresa de gerenciamento de patrimônio com sede nos Emirados Árabes Unidos.

Na realidade, dizem as autoridades, o dinheiro era proveniente de um indivíduo colombiano sem nome e "representava o produto de suborno e peculato estrangeiro roubado do povo venezuelano". O professor teria admitido isso em uma conversa com outra pessoa, conhecida apenas como "Indivíduo 1", quem o ajudou a movimentar o dinheiro.

De acordo com a acusação, Bagley e o "Indivíduo 1" tinham uma rotina. Eles iam ao banco de Bagley - localizado em Weston, na Flórida, no coração da diáspora venezuelana do sul da Flórida - e usavam um cheque administrativo para transferir dinheiro para a conta do "Indivíduo 1". Aproximadamente 90% do dinheiro arrecadado foi destinado ao "Indivíduo-1" e o restante foi transferido para a conta pessoal de Bagley.

Para esconder a verdadeira fonte do dinheiro, Bagley assinou "contratos falsos" com o nacional colombiano, disseram os promotores em comunicado divulgado na segunda-feira. Ainda assim, o banco encerrou sua conta comercial em outubro de 2018, citando "atividades suspeitas". Segundo a acusação, a resposta de Bagley foi abrir outra conta bancária para que ele pudesse continuar recebendo as transferências em dinheiro e pegando sua parte.

Os registros do tribunal não especificam o que levou os investigadores a examinar mais de perto as finanças de Bagley, mas, em fevereiro, eles lançaram uma operação isca para verificar se ele aceitaria um depósito bancário de US$ 224.000. O professor supostamente foi informado de que o dinheiro veio de subornos e outras transações corruptas na Venezuela, mas mesmo assim ajudou a passar adiante o dinheiro, mantendo US$ 44.000 para si.

Embora Bagley esteja baseado na Flórida, o caso está sendo tocado pelo promotor dos EUA no Distrito Sul de Nova York porque o dinheiro passou pela cidade de Nova York antes de ser depositado nas contas dele. Ele responde a dois processos por lavagem de dinheiro e um por conspiração para cometer lavagem de dinheiro, e pode enfrentar uma sentença de até 20 anos de prisão por cada acusação, se condenado.

"As acusações de lavagem de dinheiro e conspiração devem servir como uma lição objetiva para Bruce Bagley, que agora enfrenta um possível mandato em prisão federal", disse Geoffrey S. Berman, advogado dos EUA no Distrito Sul de Nova York, em comunicado na segunda-feira.

Bagley, que foi libertado na segunda-feira sob fiança de US$ 300.000, não foi encontrado para comentar a reportagem. Seu advogado, Daniel Forman, disse ao Herald que planeja "defender diligentemente" o caso no tribunal e espera que a justiça seja feita.

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