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O novo imperador do Japão, Naruhito, discursa ao lado da Imperatriz Masako na cerimônia de ascensão ao trono no Palácio Imperial em Tóquio em 1 de maio de 2019
O novo imperador do Japão, Naruhito, discursa ao lado da Imperatriz Masako na cerimônia de ascensão ao trono no Palácio Imperial em Tóquio em 1 de maio de 2019| Foto: STR/Japan Pool/AFP

Pela primeira vez em 200 anos, um imperador japonês cedeu seu lugar no trono imperial.

Em 30 de abril, o imperador do Japão, de 85 anos, Akihito, abdicou e foi substituído no dia seguinte por seu filho de 59 anos, o príncipe herdeiro Naruhito.

Naruhito e sua esposa, a princesa herdeira Masako, são um casal moderno. Ambos estudaram no exterior – ele na Universidade de Oxford, ela na Rússia, Inglaterra e nos Estados Unidos. Nascido após a Segunda Guerra Mundial, Naruhito é o primeiro imperador japonês não moldado pelo levante que a guerra trouxe ao seu país.

Muitos japoneses estão esperançosos de que esses membros da realeza possam dar uma nova cara ao antigo “Trono do Crisântemo” do Japão. Mas mudar uma monarquia do século 14 para refletir os novos tempos não será fácil.

Uma democracia com um imperador

O Japão tem a mais antiga monarquia contínua do mundo.

O recém-aposentado imperador Akihito foi o 125º em uma linhagem real de sucessão oficialmente fundada no século VII. Segundo a lenda japonesa, no entanto, o trono de crisântemo remonta a 2.600 anos - desde a fundação do país em 660 a.C. pelo imperador Jimmu, um descendente da deusa xintoísta do sol Amaterasu.

Apesar de seu status sagrado, os imperadores japoneses tradicionalmente reinam, mas não governam o país. Durante a maior parte de sua longa história, governos militares ou oligarcas governaram o Japão no dia-a-dia.

Em 1947, dois anos depois de sua rendição às forças aliadas, o Japão se tornou uma democracia, com vários partidos políticos, o parlamento e um primeiro-ministro. A monarquia também mudou profundamente após a Segunda Guerra Mundial.

(COMBO)Fotos de arquivo mostram três gerações da família real do Japão: Imperador Hirohito (E); seu filho, o Imperador Akihito (C); e e seu neto, o novo Imperador Naruhito | Foto: AFP
(COMBO)Fotos de arquivo mostram três gerações da família real do Japão: Imperador Hirohito (E); seu filho, o Imperador Akihito (C); e e seu neto, o novo Imperador Naruhito | Foto: AFP| AFP

O imperador Hirohito – avô do novo imperador do Japão, Naruhito – renunciou “a falsa concepção de que o imperador é divino” em 1946, sob pressão das forças aliadas. A constituição escrita em 1947, com grande influência americana, reduziu oficialmente o imperador a um papel figurativo.

Ainda assim, a monarquia continuou. E Hirohito permaneceu no trono até sua morte aos 88 anos em 1989.

O imperador do povo

Filho de Hirohito, o Imperador Akihito era, segundo a maioria dos relatos, um monarca extremamente popular – alguém que colocou sua marca pessoal nessa instituição.

Como um jovem príncipe herdeiro no Japão ocupado pelos EUA, Akihito estudou a língua inglesa e a cultura ocidental, e seu tutor americano procurou incentivar a independência em seu jovem estudante. Akihito mais tarde rompeu com a tradição real japonesa de casamentos arranjados para se casar com uma plebéia, Michiko Shoda, a quem conheceu jogando tênis.

Akihito também aproximou a monarquia e o povo do Japão nos últimos 30 anos.

Ele passou mais tempo fora dos limites de seu palácio, interagindo com japoneses comuns, do que com seu pai distante. Ele e sua esposa também fizeram visitas oficiais a cerca de 35 países.

Depois do terremoto e do tsunami de 2011 que desencadearam a crise nuclear de Fukushima, o imperador Akihito fez uma aparição histórica na televisão, pedindo que seu povo não perdesse a esperança, e visitou refugiados em um centro de evacuação.

Em um discurso de 2016, Akihito sinalizou indiretamente sua intenção de abdicar, dizendo que sua idade avançada e a saúde em declínio dificultavam o desempenho de suas funções.

Renunciar foi o último ato modernizador do reinado de 30 anos de Akhito.

O novo imperador do Japão, Naruhito, diz que espera copiar o toque pessoal de seu pai - para "compartilhar as alegrias e tristezas do povo".

Controvérsia sobre sucessão totalmente masculina

A abdicação de um imperador vivo criou um problema legal para o Japão, onde a lei imperial define a sucessão imperial somente após a morte.

O último monarca japonês a renunciar, o Imperador Kokaku, o fez em 1817 por razões desconhecidas, e antes que o Japão se tornasse uma democracia. Simplesmente não havia precedente moderno para a decisão de Akihito.

Alterar a lei imperial japonesa para acomodar a abdicação teria aberto a outras mudanças. Especificamente, muitos legisladores japoneses e a maioria do povo japonês queriam permitir que as mulheres herdassem o trono.

Isso seria um grande impulso simbólico para as mulheres em um país onde mulheres ocupam menos de 1% dos cargos de gerência.

As forças conservadoras na legislatura, no entanto, bloquearam as chamadas para mudar a tradição de sucessão masculina do Japão. Em vez de alterar a lei imperial, eles simplesmente aprovaram uma lei especial que permitia a Akihito renunciar.

Isso significa que Aiko, a filha do novo imperador e imperatriz do Japão, não pode suceder seu pai. O próximo da fila, ao contrário, é o irmão mais novo de Naruhito, o príncipe Fumihito, de 53 anos. Fumihito será seguido por seu filho, Hisahito.

Imperador Naruhito, o ambientalista

Eu tive a oportunidade de conhecer o então príncipe Naruhito em 1990, em uma conferência acadêmica no Japão.

Como um estudioso da história japonesa, falei sobre as viagens de um samurai proeminente no início do Japão moderno. Naruhito – há muito um defensor global da água – apresentou sua pesquisa, conduzida na Universidade de Oxford, sobre o transporte de água medieval inglês.

Naruhito continuou desenvolvendo suas atividades ambientais desde então. Em 2007, ele foi nomeado presidente honorário do Conselho Consultivo do Secretário Geral das Nações Unidas para Água e Saneamento.

O engajamento cívico global de Naruhito mostra como esse membro da realeza buscou seguir seu próprio rumo na vida.

Sua esposa, Masako, também é diferente de qualquer imperatriz da história japonesa.

Filha de diplomata e fluente em várias línguas, Masako formou-se em Harvard em 1985 como bacharel em economia e depois estudou direito na Universidade de Tóquio. Em 1987, ela era uma das três únicas mulheres – em um grupo de 800 candidatos – a passar no vestibular do Ministério de Relações Exteriores do Japão.

Nahurito pediu Masako em casamento três vezes antes de ela concordar em se casar com ele, em 1993. Essa decisão forçou-a, relutantemente, a desistir de sua carreira diplomática.

A mudança de estilo de vida parece ter sido difícil para Masako.

Foto de novembro de 2002 mostra o então príncipe herdeiro Naruhito, sua esposa Masako e a filha Aiko | Foto: AFP
Foto de novembro de 2002 mostra o então príncipe herdeiro Naruhito, sua esposa Masako e a filha Aiko | Foto: AFP| AFP

Como princesa da coroa, ela ficou sob intensa pressão para produzir um herdeiro do sexo masculino. Oficiais da casa real também limitaram suas viagens ao exterior e monitoraram de perto seus movimentos.

Em 2001, oito anos após o casamento, Masako deu à luz a uma garota, Aiko. Pouco depois, ela desapareceu da vida pública. De acordo com seus médicos, Masako sofreu um "distúrbio de adaptação" – o que os observadores externos podem identificar como depressão.

Naruhito rompeu com uma tradição real de discrição e falou publicamente sobre a luta de sua esposa para se adaptar à sua nova existência restrita.

"Houve movimentos para negar a carreira de Masako e sua personalidade, que foi influenciada por essa carreira", disse ele a repórteres em 2004.

Masako começou a reaparecer em público novamente somente em 2014. Ela expressou tanto ansiedade quanto otimismo em se tornar imperatriz, dadas as tensões e deveres cerimoniais daquele cargo.

O imperador Naruhito, por sua vez, diz que vai trabalhar para mudar a forma como a família real do Japão opera, atualizando a casa imperial para refletir os tempos de mudança.

O objetivo do seu reinado, ele diz, é trazer "uma brisa fresca" para o Trono do Crisântemo.

*Constantine Vaporis é professor de História do Japão e do Leste Asiático na Universidade de Maryland, no Condado de Baltimore.

The Conversation
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