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O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei
O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, durante uma exposição da força aérea da Guarda Revolucionária Islâmica| Foto: Divulgação/Khamenei.IR/AFP

A tensão entre os Estados Unidos e o Irã está alimentando a preocupação global de que ambos os países estejam perigosamente se aproximando da guerra e também chama a atenção para a rede de forças do Irã em todo o Oriente Médio.

Na quinta-feira (13), o secretário de Estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, listou uma série de ataques que ele disse que foram cometidos por "representantes iranianos" desde o início de maio, descrevendo-os como parte de "uma campanha inaceitável de crescente tensão por parte do Irã".

Pompeo e outro membro do alto escalão da administração Trump disseram que responsabilizarão Teerã por quaisquer ataques realizados por suas forças de milícia aliadas e especialistas dizem que os "proxies", grupos que representam interesses do Irã, podem se tornar ativos poderosos para a República Islâmica se a crise se transformar em guerra.

Por que o Irã usa proxies?

A ênfase do Irã no desenvolvimento de forças que o representem remonta à revolução de 1979 que depôs o xá apoiado pelos americanos e deu origem à República Islâmica. A teocracia xiita procurou exportar sua revolução e capacitar grupos xiitas no Oriente Médio desde o início. O membro sênior do Instituto do Oriente Médio, Alex Vatanka, chamou esse ethos expansionista de "parte do DNA do Irã".

Muitos dos grupos patrocinados pelo Irã - embora não todos - são xiitas. Enquanto a ideologia desempenha um papel na política externa do Irã, especialistas afirmam que o principal objetivo do regime é projetar poder em todo o Oriente Médio para combater a influência americana, israelense e saudita.

O sucesso da estratégia do Irã depende em grande parte de sua capacidade de capitalizar os vácuos de poder no Oriente Médio, disse Vatanka. Mais recentemente, o Irã ampliou seu alcance ao apoiar milícias no Iêmen e na Síria, países devastados pela guerra, em meio ao caos promovido pelas revoltas da Primavera Árabe em 2011.

Como o Irã faz isso? Principalmente através da Força Quds, da Guarda Revolucionária Iraniana (GRI), um braço especial militar focado em operações externas – a administração Trump designou a GRI como uma organização terrorista estrangeira em abril. Liderada pelo major-general da GRI, Qasem Soleimani, que responde diretamente ao líder supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei, este braço organiza e treina combatentes com milícias aliadas e os fornece armas, de acordo com um relatório recente do Soufan Center. O Irã também usa soft power (influência por meios culturais ou ideológicos) para cimentar alianças econômicas com países como o Iraque, onde o Irã apoiou milícias locais na luta contra as forças americanas após a invasão do Iraque em 2003 e depois na batalha contra o Estado Islâmico.

Quem são os houthis?

Os rebeldes houthis no Iêmen estão sob maior escrutínio desde o início de maio, quando intensificaram ataques com drones contra alvos sauditas.

Os houthis, que fazem parte da seita Zaydi do islamismo xiita, têm combatido uma coalizão liderada pelos sauditas no Iêmen desde 2015. O grupo há muito tempo era uma força de oposição no Iêmen, mas atraiu apoio iraniano depois que a Arábia Saudita se envolveu no conflito, de acordo com Vatanka. O que começou como uma guerra civil durante a Primavera Árabe se transformou em uma guerra por procuração entre o Irã e a Arábia Saudita, com o Irã fornecendo apoio financeiro e militar aos houthis, e os Estados Unidos fornecendo amplo apoio militar à Arábia Saudita.

Não está claro quanto controle operacional o Irã exerce sobre os houthis, disse Vatanka, mas os dois atores certamente compartilham prioridades estratégicas - especificamente, contra a Arábia Saudita.

Uma série de ataques aéreos tem marcado a mais recente escalada do conflito entre os rebeldes houthis e a Arábia Saudita. Os houthis assumiram a responsabilidade por um ataque de drone a um aeroporto civil de Abha, na Arábia Saudita, na segunda-feira (17), embora a Arábia Saudita ainda não tenha confirmado o ataque. Os rebeldes houthis também assumiram a responsabilidade por um ataque com míssil de cruzeiro na semana passada que feriu 26 pessoas no mesmo aeroporto.

No domingo, o Pentágono acusou o Irã de ajudar o houthis a abater um drone norte-americano em 6 de junho. A Arábia Saudita também culpou os houthis por ataques a duas de suas instalações de petróleo.

Não está claro se esses ataques estão ligados às explosões em dois navios-tanque no Golfo de Omã. "É uma coincidência que isso tenha acontecido ao mesmo tempo em que há uma intensa pressão sobre o Irã? Provavelmente não", disse Vatanka. Mas isso não significa necessariamente que o Irã está dando as ordens para os houthis, acrescentou.

Apesar dessa incerteza, Pompeo e os líderes da Arábia Saudita foram rápidos em conectar os ataques instigados por houthis ao Irã. Em uma entrevista com o site de notícias pan-árabe Asharq al-Awsat no fim de semana, o príncipe herdeiro saudita Mohamed Bin Salman acusou os rebeldes houthis de "avançar a agenda do Irã sobre os interesses do Iêmen e de seu povo".

Os rebeldes houthis veem esses ataques como autodefesa contra a Arábia Saudita, que foi acusada de bombardear indiscriminadamente civis no Iêmen e de alimentar uma enorme crise humanitária. O pesquisador Samuel Ramani argumentou que os ataques de houthis a instalações de petróleo da Arábia Saudita no mês passado foram motivados principalmente pelo desejo dos houthis de demonstrar coesão interna e obter apoio popular - em vez de servir aos interesses de Teerã.

Como o Hezbollah se encaixa no quadro?

O Hezbollah, um grupo paramilitar e partido político xiita no Líbano, é o mais antigo e bem-sucedido proxy do Irã. E continua sendo o mais poderoso dos aliados não-estatais do Irã no Oriente Médio. Formado durante a guerra civil libanesa em 1982, o Hezbollah transformou-se desde então de um pequeno grupo de clérigos e combatentes em uma grande força política no Líbano - com assistência crucial da GRI.

O Irã forneceu armas ao Hezbollah durante a guerra de 2006 contra Israel. Mais recentemente, mobilizou a intervenção do Hezbollah em nome do ditador Bashar al-Assad na sangrenta guerra civil de oito anos da Síria. Uma avaliação do Departamento do Tesouro dos EUA em 2018 calculou o apoio do Irã ao Hezbollah em US$ 700 milhões por ano.

O membro sênior do Atlantic Council Nicholas Blanford, especialista em Hezbollah, descreveu o grupo paramilitar como "o mais extraordinário de todos os representantes iranianos no Oriente Médio" - e seu papel ativo em esmagar a rebelião na Síria deu ao grupo uma experiência de combate adicional.

Apesar de seu peso militar regional, poucos esperam que o Hezbollah entre em um conflito que envolva os Estados Unidos. O grupo provavelmente recorreria a ataques secretos de menor nível contra alvos americanos na região, disse Blanford.

Mas, ele acrescentou, "se parecer que o regime islâmico em Teerã está enfrentando algum tipo de ameaça à sua existência se um conflito surgir, então todas as apostas serão canceladas".

Qual é a relação do Irã com as milícias iraquianas?

Começando com a guerra do Irã com o Iraque na década de 1980, Teerã apoiou várias milícias xiitas poderosas que se opunham ao ditador Saddam Hussein. Depois que ele foi derrubado, na invasão americana do Iraque em 2003, muitas dessas milícias foram organizadas para combater as tropas dos EUA.

O Pentágono atribuiu 603 mortes de americanos no Iraque, desde 2003, a milícias apoiadas pelo Irã. Mas quando o Estado Islâmico realizou uma ofensiva pelo Iraque em 2014, essas mesmas milícias tornaram-se ativos essenciais para conter a expansão dos militantes e lutaram de perto com as forças iraquianas para finalmente reduzirem a ocupação territorial do Estado Islâmico a zero.

Isso deu a eles poder político sem precedentes no Iraque, com muitas figuras importantes ganhando cadeiras no parlamento do país no ano passado. Sua presença deu ao Irã uma influência adicional sobre o cenário político do Iraque.

Autoridades americanas pediram repetidamente ao Iraque que combata essa influência.

Em uma visita não programada ao Iraque em maio, Pompeo alertou os líderes iraquianos sobre o que ele descreveu como uma crescente ameaça iraniana no país. "Não queremos que ninguém interfira no país deles… e houve concordância total", disse Pompeo a repórteres na época.

Em uma ligação com o primeiro-ministro iraquiano, Adel Abdul Mahdi, na quinta-feira passada, Pompeo prometeu que os Estados Unidos ajudariam a fortalecer as forças de segurança iraquianas. Ele também elogiou os "esforços contínuos de Abdul Mahdi para combater as ameaças à soberania do Iraque das milícias apoiadas pelo Irã", disse o porta-voz do Departamento de Estado, Morgan Ortagus, em um comunicado.

Enquanto isso, receosos de serem arrastados para outra guerra, os iraquianos têm assistido com nervosismo à crescente tensão no Golfo Pérsico nos últimos dias.

Que papel essas milícias poderiam desempenhar se o conflito aumentasse?

O governo Trump rotulou o Irã como "Estado patrocinador do terrorismo" e tentou ligar Teerã a ataques realizados por grupos paramilitares aliados.

A campanha de "pressão máxima" da administração Trump provavelmente não convencerá Teerã a desistir do apoio a representantes estratégicos como o Hezbollah, disse Blanford, que considera as exigências americanas para o Irã "destinadas ao fracasso".

Enquanto as tensões permanecerem confinadas à sabotagem econômica, disse Vatanka, grupos como o Hezbollah e os houthis provavelmente ficarão de fora da disputa. "O Irã vai chamá-los para ajudar se isso se transformar em um conflito", disse ele. "Quantos deles realmente farão alguma coisa? Essa é uma questão em aberto".

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