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Pedro Castillo, candidato à presidência do Peru
Pedro Castillo, candidato à presidência do Peru| Foto: EFE

A apuração oficial do segundo turno da eleição presidencial no Peru já foi encerrada, com o esquerdista Pedro Castillo, do Peru Livre, à frente por uma margem apertada de 0,25% de vantagem, ou cerca de 44 mil votos, sobre Keiko Fujimori, do partido de direita Força Popular. No entanto, um vencedor ainda não foi proclamado, enquanto as autoridades eleitorais avaliam contestações apresentadas pelo fujimorismo.

Caso a vitória de Castillo seja confirmada, o novo presidente terá que lidar com baixo apoio popular e minoria no Congresso para governar um país altamente dividido e que passou por grande instabilidade política nos últimos anos.

Diante desse cenário, o eventual governo de Castillo ainda é uma incógnita; não se sabe se ele adotará uma postura mais moderada, como durante sua campanha no segundo turno, ou se vai apelar para uma nova constituinte para conseguir implementar as mudanças que pretende. Assim como foi difícil a previsão do resultado do primeiro turno da eleição presidencial peruana, que tinha sete candidatos tecnicamente empatados em primeiro lugar, também parece complicado para os especialistas prever quão radicais serão as políticas de Castillo.

“Vejo o Castillo muito mais como um típico populista latino-americano”, avalia Vinícius Vieira, professor de relações internacionais da FGV. “Ele pode ser visto como intervencionista na economia e conservador nos costumes, nessa linha histórica do que foi a tradição populista caudilhesca latino-americana”.

Para Vieira, essa mistura não deve funcionar. “Não é uma receita que funciona. Pelo contrário, é uma receita que, como a experiência histórica demonstra, gera mais contradições e tensões sociais no longo prazo”, opina.

Castillo, por sua inexperiência, por ter vencido com uma margem mínima e por contar com minoria no congresso, teria que se acomodar ao sistema para se manter no poder durante o seu mandato, na avaliação de Vieira. Essa acomodação seria do interesse tanto de Castillo, para não arriscar o seu mandato, quanto das elites peruanas, que querem evitar os solavancos vistos nos últimos anos, por causa do efeito Odebrecht no país.

“Historicamente, políticos com margem pequena [de votos], quando tentam fazer grandes mudanças, ou reformatar as instituições de maneira brusca, tendem a fracassar e ser expulsos do poder, seja de modo autoritário, seja pelos mecanismos institucionais”, diz o professor, que não vê condições para que Castillo convoque uma nova constituinte, porque isso teria um custo político muito alto para o esquerdista.

Para Carmen Beatriz Fernández, professora de comunicação política na Universidade de Navarra (Espanha), Castillo, a quem descreve como “genuinamente um radical de esquerda”, chega ao poder com a firme convicção de fazer grandes mudanças. “Porém, uma coisa é querer, outra é poder”, afirma, explicando que não será fácil para ele implementar as mudanças que deseja, por enfrentar um congresso dividido, além de não ter forte apoio popular.

A base eleitoral real de Castillo é a que ele conquistou no primeiro turno das eleições, quando obteve menos de 19% dos votos, aponta Fernández. “Com essa base, pode-se dizer que ele tem a maioria do país contrária [a ele]”.

Possibilidade de ruptura

As posições políticas de Castillo renderam comparações entre ele e o venezuelano Hugo Chávez, inclusive porque uma das propostas do candidato peruano é mudar a Constituição do país andino. O plano de governo do Peru Livre apresentado antes do segundo turno traça como um de seus objetivos convocar, por meio de referendo, uma Assembleia Constituinte para redigir uma nova constituição.

Por meio dela, ele poderia mudar políticas econômicas no país de maneira mais profunda para, entre outras coisas, nacionalizar setores de energia e mineração no país ou modificar contratos com as empresas destes setores para que elas paguem mais impostos.

“É previsível que Castillo apele à constituinte como figura de ruptura. A constituinte seria para Castillo uma fórmula de ruptura que o permitiria solucionar o problema do congresso”, diz Fernández, explicando que ele poderia apelar para a lógica de que o poder popular – referendo – está acima do poder constituído. Contudo, ela ressaltou que mesmo a aprovação de uma constituinte não seria fácil para ele.

“Ele está chegando ao poder por uma minoria e está sustentado por uma minoria. Então, ele tem que demonstrar enormes dotes de equilibrista para que esse equilíbrio instável se mantenha. E não sabemos se ele os tem – é justamente isso que, nesse momento, está posto à prova”, afirma a pesquisadora.

Diante deste cenário, e considerando também que Castillo facilmente pode sofrer uma moção de vacância (semelhante ao impeachment no Brasil) no Congresso, Vieira acredita que tudo aponta para uma situação de relativa fraqueza do esquerdista como presidente, fazendo com que ele tenha que se adaptar ao sistema para que construa sua força política. “O que implica em ser menos revolucionário e radical, e muito mais em adotar uma postura de conformismo em relação ao sistema que está sendo dado a ele”.

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