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Presidente dos EUA, Donald Trump| Foto: MANDEL NGAN/AFP

Depois de concluir um acordo comercial de Fase Um com a China em janeiro de 2020, o presidente Donald Trump sugeriu que pode não haver uma Fase Dois. “Não estou interessado em conversar com a China no momento”, disse Trump à CBS na semana passada, antes de criticar a forma com que Pequim lidou com a pandemia do coronavírus. O desgosto repentino nas negociações de acordos comerciais lembra muito o envolvimento do presidente com a Coreia do Norte, que também começou com um compromisso público e empolgado até fracassar sem realizar nada concreto. Andy Warhol uma vez opinou que “qualquer coisa pode ser uma obra de arte”. Aparentemente, Trump pensa o mesmo sobre política comercial.

Como as coisas desmoronaram tão rápido?

Em 15 de janeiro deste ano, o governo Trump assinou um acordo comercial de “Fase Um” com a China, assim nomeado porque representava apenas os primeiros passos do que supostamente seria um processo mais longo. O acordo incluía compromissos da China de aumentar as compras de mercadorias dos EUA em US$ 200 bilhões em dois anos, intensificar os esforços para proteger os direitos de propriedade intelectual dentro de suas fronteiras e melhorar o acesso de empresas americanas ao seu mercado de serviços financeiros. Por sua vez, os EUA se comprometeram a reduzir a tarifa de 15% sobre cerca de US$ 120 bilhões em exportações chinesas para 7,5%, mantendo a tarifa de 15% sobre outros US$ 250 bilhões em exportações chinesas.

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Mas nos meses que se seguiram, a pandemia de coronavírus atingiu a economia global com força e fez com que a relação EUA-China se deteriorasse, a ponto de questionarmos se a China cumprirá todos os compromissos firmados no acordo. Consideramos dois cenários:

1. A China honra metade de seus compromissos e os EUA reclamam ou decidem que podem viver com esse resultado, pelo menos por enquanto. Talvez Trump passe os quatro meses até o dia das eleições alegando que conseguiu algo significativo com o acordo, diminuindo, assim, a probabilidade de realmente alcançar algo significativo no futuro. Nesse cenário, a China recebe elogios de aliados e concorrentes mundiais por conseguir uma vitória rápida com os EUA. Mesmo que os EUA se queixem e a China seja forçada a melhorar sua conformidade com o acordo, a percepção é de que a aposta valeu a pena para o presidente Xi Jinping.

2. A China cumpre todos os seus compromissos do acordo e há um evento fotografável, além de mensagens autocongratulatórias. A opinião na China continua sendo a de que a boa vontade americana é um prêmio efêmero. Não parece haver muito respeito mútuo entre os dois governos, mas o cumprimento da Fase Um por parte da China torna a perspectiva de uma Fase Dois muito mais tentadora. Trump pode afirmar que sua estratégia foi validada.

A teoria dos jogos nos diz que o segundo cenário é improvável, pois produz os piores resultados da perspectiva chinesa. Na verdade, estando no Ministério das Relações Exteriores da China, há dois princípios orientadores em relação à conformidade: 1) Fazer o mínimo possível para cumprir o acordo sem que pareça estar em desacordo; 2) Tornar o processo longo e complicado para reduzir o apetite dos EUA por negociações adicionais.

Assim, é provável que o primeiro cenário ou algo parecido seja tudo o que os EUA podem esperar extrair da Fase Um. Não há base para acreditar que os benefícios das tarifas impostas por Trump excederão os custos para a economia americana, tornando todo o processo um ferimento auto-infligido. Trump pode reivindicar uma vitória na Fase Um, mas será difícil para alguém com visão objetiva levar a reivindicação a sério.

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Aqui é onde você pode perguntar: e as tarifas? Trump não pode aplicar mais ou menos qualquer nível de tarifas a qualquer quantidade de exportações chinesas para os EUA, e esse poder não lhe dá influência sobre a China nas negociações? Em teoria, sim. Mas a alavancagem que a ameaça de tarifas lhe proporciona só é preservada se continuar sendo uma mera ameaça. Cumprir a ameaça prejudicaria ambas as economias igualmente. É verdade que Trump demonstrou vontade de impor tarifas no passado, ignorando o custo econômico, mas os chineses parecem estar inclinados a apostar que é improvável que ele faça isso novamente, considerando o estado frágil da economia americana.

Também é provável que os chineses acreditem que os EUA não removerão as tarifas de mercadorias chinesas que permanecem em vigor, porque isso equivale a afirmar que os problemas que o governo tem com a política comercial chinesa foram resolvidos. Rompendo com o foco tradicional da América no acesso a mercados, o governo Trump agora define sucesso em termos de eliminar o déficit comercial, uma meta que nenhuma mudança na política chinesa poderia alcançar.

Em outras palavras, o governo Trump se colocou em uma sinuca de bico. Não tem a capacidade de melhorar ou piorar a situação do comércio bilateral. Desperdiçou qualquer vantagem com a qual começou, e não há motivo para a China responder às suas demandas (em vez de fingir ser responsiva).

Dada essa situação, é justo perguntar: em vez de aumentar as tarifas sobre a China, por que Trump não reduz as tarifas para os países que cumprem as regras, tornando os produtos chineses menos competitivos sem prejudicar a economia dos EUA? Se ele fosse sábio, faria isso. Mas como a mesma lógica incentivou o Acordo de Parceria Transpacífica que Trump abandonou ao assumir o cargo, é improvável que ele a adote agora.

Finalmente, há a questão da honra. Independentemente das tolices ou méritos econômicos do que Trump fez, o lado chinês não sente a obrigação de cumprir seus compromissos? Você pode até pensar isso, mas a história sugere o contrário. Em milhares de anos de interações com nações estrangeiras, a China enfrenta regularmente estranhos beligerantes que fazem ameaças e demandas. Como resultado, os chineses aperfeiçoaram a arte de receber líderes hostis, com gentileza e um pouco de chá e mandando-os de volta para casa - a arte de identificar o menor preço que pode ser pago para que a outra nação os deixe em paz. Toda probabilidade indica que a China vê a Fase Um do acordo como mais um gesto desse tipo, e está mais preocupada em parecer cumprir seus termos do que cumpri-los de fato.

Essa é a conclusão: conformidade real não é do interesse próprio da China, não devemos, portanto, esperar isso. Trump amarrou suas próprias mãos, excluindo as estratégias alternativas que poderiam afetar os resultados que ele tanto deseja nas negociações comerciais com Pequim. A China fará alguns gestos vazios e conciliadores, oferecerá um chá aos americanos e os mandará de volta para casa.

* Frank Lavin atuou como subsecretário de Comércio Internacional no governo George W. Bush. Atualmente, é CEO da Export Now, empresa que ajuda marcas dos EUA na China.

© 2020 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

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