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Tanque do exército turco segue para fronteira com a Síria, 8 de outubro de 2019
Tanque do exército turco segue para fronteira com a Síria, 8 de outubro de 2019| Foto: BULENT KILIC / AFP

Menos de 24 horas depois de o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciar a retirada das tropas que guardavam a fronteira norte da Síria, a Turquia começou a atacar alvos curdos e a milícia Forças Democráticas da Síria (FDS), que se opõem ao ditador sírio Bashar Assad e ocupam posições em território sírio e iraquiano, alegaram agências da região e as Forças Democráticas da Síria.

No domingo, 6, em uma grande mudança de diretriz, Trump declarou que os EUA não se oporiam a uma operação de Ancara contra os curdos. A decisão conseguiu um fato raro: unir democratas e republicanos contra uma medida da Casa Branca - em um momento delicado, em que Trump enfrenta um processo de impeachment na Câmara dos Deputados.

Ao justificar sua decisão, Trump argumentou que seu objetivo é acabar com as "guerras sem fim" nas quais os EUA estão envolvidos e disse que cabe aos atores da região resolver a situação. Imediatamente, a Turquia informou que preparava um ataque no norte da Síria para "limpar" a região dos "terroristas" que ameaçam sua segurança.

O problema é que os "terroristas" aos quais o governo turco se refere - os curdos - foram os maiores aliados dos EUA na luta contra os jihadistas do Estado Islâmico (EI), no norte da Síria e do Iraque. A medida de Trump foi considerada por curdos, aliados europeus e congressistas americanos como um gesto de traição, que emitiria um sinal negativo para outros aliados que se arriscam a lutar ao lado dos americanos na região.

Tentando reverter o mal-estar, Trump ameaçou nesta segunda-feira 7, "aniquilar" a economia da Turquia, caso o país passe dos limites na Síria. "Como disse antes, e só para reiterar, se a Turquia fizer algo que eu, em minha grande e inigualável sabedoria, considerar fora do limite, destruirei e aniquilarei totalmente a economia da Turquia", escreveu Trump no Twitter.

"Já fiz isso antes", acrescentou o republicano, em referência à queda da lira turca, que perdeu 25% do valor em agosto, quando os EUA pressionavam pela libertação do missionário Andrew Brunson, que estava preso na Turquia desde outubro de 2016, acusado de colaborar com terroristas.

O início da retirada das tropas americanas, no fim de semana, deixou o caminho livre para uma operação turca contra a milícia curda das Unidades de Proteção Popular (YPG). A decisão foi denunciada como uma "facada nas costas" pelas forças lideradas pelos curdos.

EUA mudam tropas de lugar

O Pentágono, o Departamento de Defesa dos EUA, confirmou nesta terça-feira que reposicionou suas tropas no norte da Síria após a decisão da Turquia de conduzir uma operação própria contra os combatentes curdos.

Em comunicado, o porta-voz do Pentágono, Jonathan Hoffman negou relatos de que o presidente Trump não teria informado autoridades como o secretário da Defesa, Mark Esper, sobre a sua decisão de retirar as tropas americanas.

"Apesar de contínuas declarações incorretas, o secretário Esper e o diretor Milley foram consultados nos últimos dias pelo presidente sobre a situação e os esforços para proteger as forças americanas no norte da Síria em face de uma ação militar da Turquia", diz o comunicado.

"A posição do Departamento tem sido e continua sendo a de que estabelecer uma zona segura no norte da Síria é o melhor caminho a seguir para manter a estabilidade. Infelizmente, a Turquia optou por agir unilateralmente. Como resultado, retiramos as forças americanas do norte da Síria do caminho de uma possível incursão turca para garantir sua segurança. Não fizemos alterações no número de nossas forças na Síria até o momento".

Ofensiva militar

Pouco antes da divulgação do comunicado do Pentágono, o Centro de Coordenação de Operações Militares das Forças Democráticas da Síria relatou um ataque a uma de suas posições em Ras al-Ain, que em curdo é conhecida por Sere Kaniye, na fronteira entre Turquia e Síria.

"O exército turco está bombardeando um de nossos postos em Sere Kaniye na fronteira com a Turquia. Não houve feridos em nossas forças. Não respondemos a esse ataque não provocado. Estamos preparados para defender as pessoas do nordeste da Síria", afirmou o centro de operações militares das FDS.

Os curdos são a mais relevante minoria do Oriente Médio sem um Estado próprio. São entre 25 milhões e 35 milhões de pessoas espalhadas por Turquia, Irã, Iraque e Síria.

Segundo a agência oficial síria Sana, as forças turcas atacaram posições curdas na cidade de Al-Malikiyah, no norte da Síria. A agência turca Anadolu informou que a Força Aérea turca "neutralizou" três alvos do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), na região de Gara, segundo o Ministério Nacional da Defesa da Turquia.

As YPG são o principal grupo na luta contra o EI e contam com apoio dos EUA e de outros países ocidentais. Mas a Turquia considera as YPG um grupo "terrorista" por seus laços com o PKK, organização curda que, desde 1984, trava uma sangrenta luta no território turco.

Os curdos da Síria haviam advertido nesta segunda que uma invasão militar turca provocará o ressurgimento do EI. As FDS afirmaram que a operação terminará com anos de cooperação para derrotar os jihadistas e permitirá o retorno de alguns dos líderes do EI que sobreviveram.

Em decisão repentina no ano passado, Trump anunciou a retirada das tropas americanas da Síria - cerca de 2 mil soldados - após dizer que os EUA tinham derrotado o EI. O anúncio acabou levando à renúncia de seu então secretário de Defesa, Jim Mattis, que não concordava com a medida.

O Senado, liderado pelo republicano Mitch McConnell, conteve o ímpeto do presidente ao aprovar uma resolução condenando a retirada, da qual Trump desistiu em janeiro. Nesta segunda-feira McConnell voltou a condenar a saída da Síria. "A retirada precipitada das forças americanas só beneficia a Rússia, o Irã e o regime de Assad. E aumentaria o risco de o EI e de outros grupos terroristas se reagruparem", afirmou McConnell.

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