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Primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, durante a Cúpula da União Europeia no edifício Europa em Bruxelas, em 2019| Foto: Aris Oikonomou / AFP

A democracia enfrenta "desafios importantes" em diversos países europeus, concluiu um relatório da União Europeia divulgado nessa quarta-feira (30).

O documento, que chama atenção especialmente para a Polônia e a Hungria, dois países governados por nacionalistas de direita, é uma resposta a temores sobre o fortalecimento de tendências autoritárias no continente, e aponta riscos ao Judiciário nos dois Estados.

O lançamento do relatório, o primeiro deste tipo, coincidiu com a aprovação inicial de um compromisso que condiciona o repasse de recursos da UE ao cumprimento do Estado de Direito, medida que não teve o apoio dos governos húngaro ou polonês.

Ela não só acompanha discussões sobre o orçamento do bloco para o período entre 2021-2027, como também a negociação dos detalhes do fundo de reconstrução pós-pandemia de € 750 bilhões (R$ 4,57 trilhões) – dois dos principais assuntos da cúpula europeia que começou na quinta-feira.

O documento menciona preocupações sobre a situação em diversas partes do continente, mas são Varsóvia e Budapeste que roubam, mais uma vez, os holofotes. Desde que Viktor Orbán chegou ao poder na Hungria, há 10 anos, "a direção das mudanças deu à luz a graves preocupações" sobre a independência judicial, diz o texto.

O primeiro-ministro impôs controles sobre os tribunais, tenta silenciar a oposição e usa o dinheiro público para favorecer veículos midiáticos pró-governo, ressalta o documento.

Já na Polônia, desde 2015, as reformas implementadas pelo governista Lei e Justiça (PiS) geram preocupações sobre o respeito às liberdades de expressão, da imprensa e do Judiciário por exemplo: "A dupla função de ministro da Justiça e procurador-geral levanta preocupações particulares", diz um trecho do relatório, afirmando que isso facilita a politização dos processos. "Ações do governo que miram grupos LGBT, incluindo a prisão e a detenção de alguns de seus representantes e campanhas de difamação levantaram mais preocupações", diz outro trecho.

Polônia e Hungria criticam

Ambos os governos já foram alvos de processos para perderem seus direitos a voto. Para que isso se concretize, no entanto, será necessário unanimidade entre os outros 26 estados-membros, o que não ocorre porque Budapeste e Varsóvia se protegem mutuamente.

"A União Europeia foi criada como um antídoto para tendências autoritárias", disse a responsável pela fiscalização da democracia no bloco, Vera Jourova.

O relatório é, em parte, uma resposta às críticas húngaras e polonesas de que estariam sendo alvo injustamente. Todos os países europeus foram alvos da auditoria, que avaliou quatro pilares: sistemas de Justiça, marcos anticorrupção, liberdade de imprensa e outros controles.

Croácia, República Tcheca, Malta, Bulgária e Eslováquia foram criticadas por escândalos de corrupção, por exemplo. Estas duas últimas nações, ao lado da Romênia e da Croácia, também foram advertidas por não garantirem a total independência de seus Judiciários.

A Hungria rapidamente emitiu um relatório repudiando o documento chamando-o de "falacioso", "absurdo" e "sem fundamento" metodológico.

Anteriormente, já havia dito que fundaria, junto com a Polônia, seu próprio instituto para avaliar o cumprimento do Estado de Direito, pois considera o bloco parcial. Um dia antes, Orbán havia pedido a demissão de Jourova, acusando-a de realizar um "ataque político direto contra seu país".

A demanda, ignorada pela UE, era uma resposta a um comentário feito pela representante do Executivo europeu: à revista Spiegel ela havia dito que o premiê "tem orgulho de dizer que está estabelecendo uma democracia iliberal", mas que, a seu ver, tratava-se mais de uma "democracia enferma".

Respondendo ao premiê nesta quarta, Jourova disse que nunca ofendeu o povo húngaro, mas que respeitá-lo não é sinônimo de ficar em silêncio sobre as ações de seu governo.

Orçamento em xeque

Agora, o bloco tenta vincular a liberação de fundos ao respeito ao Estado de Direito, esperando que a pressão financeira surta efeito em Varsóvia e Budapeste.

O objetivo é que a medida, capitaneada pela Alemanha, já valha tanto para o orçamento dos próximos anos quanto para o pacote de ajuda firmado há dois meses.

O texto, que ainda deverá passar pelo crivo do Conselho Europeu, prevê a redução e até a suspensão dos repasses caso as violações aos princípios do Estado de Direito em um determinado país "afetem (...) a boa gestão financeira ou a proteção dos interesses financeiros" da UE.

As desavenças ao seu redor, no entanto, ficaram claras já na fase preliminar, com Hungria e Polônia votando contra. Outros cinco países - Finlândia, Holanda, Dinamarca, Suécia e Bélgica - também se opuseram, mas por outro motivo. Eles consideram a proposta apresentada pela Alemanha muito mais branda que o rascunho original. Áustria e Luxemburgo se abstiveram.

A ministra da Justiça húngara, Judit Varga, chamou a medida de "chantagem". Em represália, Budapeste e Varsóvia ameaçam vetar uma autorização para que o bloco assuma dívidas para financiar o plano de recuperação, cuja aprovação demanda unanimidade entre os 27 Estados.

Uma reforma no Gabinete polonês, anunciada nesta quarta, deve jogar o governo ainda mais à direita, levantando a possibilidade de novos atritos com a UE. A reformulação, que levou o chefe e líder histórico do PiS, Jaroslaw Kaczynski, a assumir o posto de vice-premiê inclui a designação de Przemyslaw Czarnek como ministro da Educação. Czarnek, um professor de 43 anos de uma universidade católica, já deu declarações como não considerar homossexuais "iguais às pessoas normais".

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