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Manifestantes exibem cartazes com foto do primeiro-ministro Erdogan caracterizado de Hitler | Benoit Tessier/Reuters
Manifestantes exibem cartazes com foto do primeiro-ministro Erdogan caracterizado de Hitler| Foto: Benoit Tessier/Reuters

Entrevista

Protestos mobilizam liberais e conservadores contra Erdogan

Os protestos que começaram na última semana estão chamando a atenção do mundo para a Turquia. De acordo com a cientista política Dilek Zaptcioglu, eles fizeram com que a Turquia fosse jogada num cenário de incerteza.

Por que tantas críticas ao governo de Recep Tayyip Erdogan?

A população não está satisfeita com o governo conservador islâmico, pois existe o receio de que, aos poucos, seja introduzido na Turquia um regime islâmico como o do Irã. Os principais motivos de críticas são, além do estilo autoritário de Erdogan, as tentativas de impor gradualmente na Turquia um regime islâmico.

Quem são as pessoas que participam desses protestos?

No início, eram jovens. Mas agora todo mundo vai protestar na Praça Taksim. As pessoas gritam, os carros buzinam, é uma catarse coletiva. Não são apenas os liberais que vão às ruas. Entre os manifestantes, também vi mulheres com lenços na cabeça. Em outras palavras, religiosas e conservadoras também estão participando.

É verdade que o Exército estaria apoiando os manifestantes?

O Exército procura adotar uma posição neutra. Alguns soldados deram aos manifestantes máscaras de gás depois que a polícia tinha lançado várias granadas de gás lacrimogêneo contra os manifestantes, mas isso foi isolado.

Existem elementos fundamentalistas islâmicos, como já sugeriu o premier?

Os extremistas são minoria, mas tentam se infiltrar nesses movimentos populares, e manipular os protestos conforme a própria agenda. Podem tentar provocar uma escalada, mas por ora os protestos ainda estão pacíficos.

Que danos a onda de protestos pode trazer ao governo de Erdogan?

Dá para perceber que uma explosão social está começando. Como ela vai terminar, eu não sei. Os protestos contaminaram a população, e ninguém sabe como terminarão. Observando o exemplo dos países árabes, receio que a situação escale e vire uma guerra civil. Erdogan vai perder muito, com certeza.

Dilek Zaptcioglu, cientista política

Agência O Globo

Bulent Arinc, vice-premiê da Turquia, desculpou-se ontem pela repressão policial às manifestações no país. Ele afirmou que se encontraria com as lideranças responsáveis pela onda de protestos para discutir suas demandas.

Mais cedo, o governo havia confirmado a segunda morte durante os levantes – Abdullah Comert, 22 anos, atingido por um disparo na província de Hatay, próxima à fronteira com a Síria. Comert era membro da oposição turca. Não está claro quem foi o autor do disparo, que o atingiu na cabeça.

Na noite de domingo, um rapaz de 20 anos foi morto quando um carro dirigiu rumo à multidão durante protesto contra o primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan.

A Turquia assistia ontem a seu quinto dia consecutivo de manifestações. A revolta foi iniciada quando uma multidão protestou contra a construção de um complexo comercial na região de Taksim, no centro de Istambul.

Após repressão policial, a manifestação rapidamente voltou-se contra o governo de Erdogan, visto por setores seculares como demasiadamente conservador. Recentemente, por exemplo, foi aprovada restrição à venda de bebidas com álcool no país.

Dinheiro e religião

"Como todos os protestos da região, esse começou com algo pequeno e esotérico", diz Anat Lapidot-Firilla, professora de relações internacionais da Universidade Hebraica de Jerusalém.

Os planos, segundo Lapidot-Firilla, resumem três das principais críticas dos seculares ao governo de Erdogan. Ao construir um shopping caracterizado como um quartel otomano e uma mesquita, o país mistura questões como dinheiro, pensamento imperialista e religião.

"Os manifestantes acreditam que a construção força esses valores na população, e eles não vão aceitar isso", diz.

Essa é, para o turco Ali Ozgur, também uma "questão urbana". Ele faz parte do projeto Urbanmayor, que registra questões problemáticas como construções ilegais e restrições ao movimento de deficientes físicos na cidade.

Ozgur nota, porém, que as manifestações não têm necessariamente o intuito de derrubar o governo. "Não é como a Primavera Árabe."

"Não queremos que vire uma crise democrática. O que precisamos é de participação pública na tomada de decisão e de mais diálogo."

Produto de exportação

Gás lacrimongêneo usado em protestos é produzido no Brasil

Parte do arsenal de gás lacrimogêneo utilizado pela polícia na Turquia para conter os protestos traz, em seu verso, um selo de "Made in Brazil". Foram encontradas latas vendidas pela empresa brasileira Condor, de tecnologia não letal, com sede no Rio. São do tipo GL-310, identificado como "granada lacrimogênea bailarina" pela característica de movimentar-se no solo.

"Os produtos não letais são projetados especificamente para incapacitar temporariamente as pessoas, sem causar danos irreparáveis ou morte", afirmou a empresa em comunicado.

O uso de gás lacrimogêneo pela polícia na Turquia tem sido criticado por manifestantes, que acusam o governo pela violência registrada na repressão.

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