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Lançarei hoje em Curitiba o livro com o mesmo título deste artigo. Tendo em vista que muitos leitores da Gazeta do Povo já vêm me acompanhando através desses artigos, gostaria de aproveitar para motivá-los a comparecer ao evento, através da resposta à pergunta que o título instiga: Afinal, qual é a alma da escola que queremos vislumbrar para este século?

Sou da opinião de que algumas políticas educacionais presentes estão orientando a formação dos professores e suas práticas pedagógicas apenas para satisfazer a dimensão terrena dos alunos – isto é, ocupar um espaço no mercado de trabalho – desprezando outras mais elevadas. Desde os tempos mais remotos, a tarefa de educar sempre objetivou em primeiríssimo lugar que o aluno fosse uma pessoa humana completa, integrando dimensões racionais, volitivas, afetivas, sociais e espirituais. Nunca poderemos esquecer, como apontaram diversos filósofos antigos, que o Homem é um animal racional e dependente dos outros. Tem alma e corpo, e está destinado a ser feliz somente na harmonia consigo mesmo e com os demais. Para isso precisa educar tanto a alma quanto o corpo.

Ninguém se realiza conseguindo apenas um emprego, por mais qualificado e prestigioso que seja. O aluno precisa descobrir, já na escola, que há uma dimensão ética profunda na realização de seu futuro trabalho, que o levará a amadurecer ao longo da vida e a viver feliz.

Este processo difícil e demorado de formação ética é algo que deve ser priorizado tanto na educação familiar quanto na escolar, especialmente nos dias atuais. O descuido com esse aspecto essencial da educação é o que está causando a morte da "alma" da escola e, consequentemente, da dos pais, professores e alunos. Parece que, atualmente, as escolas estão muito preocupadas com o seu "corpo" – boas instalações, computadores, esportes, viagens, aprovação no vestibular, sucesso acadêmico e econômico a todo o custo –, mas estão desprezando a "alma". Fica fácil intuir, portanto, porque muitos sistemas educacionais estão em processo de putrefação.

Os alunos que se formam saem dos colégios inanimados, porque não foram formados nessa dimensão ética e transcendental. Muitos conseguirão sucesso acadêmico e profissional, mas não conseguirão responder a questões essenciais da vida: Para que existir? Para que trabalhar? Para que sofrer? Para que morrer? Para que amar?

O livro quer convidar o leitor à reflexão acerca de temas em torno da necessidade de ressuscitar a alma da escola. Esta, sem dúvida, deve ser uma responsabilidade primeiríssima da família, junto com a escola. É preciso resgatar uma educação mais personalizada, que considere cada pessoa como única no universo, e educá-la a partir daí, ensinando-lhe a vivência das virtudes que a capacitem para o outro.

A formação pessoal se caracteriza pelas notas de singularidade, autonomia e abertura. Uma escola que respeita a singularidade sabe sujeitar o trabalho e as relações escolares à capacidade, interesse, ritmo, particularidades do sexo e circunstâncias sociais de cada estudante, e estimula sua criatividade e o desenvolvimento de suas peculiaridades. Quando defende a autonomia, favorece sua participação na dinâmica da escola e nas escolhas pedagógicas possíveis, sempre dentro dos limites éticos.

Infelizmente, esta visão da educação esbarra em dois inimigos, muito presentes na maioria das escolas: o falso conceito de autonomia do aluno e o relativismo. Segundo algumas pedagogias modernas, o aluno deve desenvolver-se por si mesmo, sem imposições por parte dos demais nem de nenhuma autoridade. Esta apenas forneceria o suporte a seu autodesenvolvimento, sem, no entanto, envolver-se no processo educacional. Essas posturas, em geral, estão permeadas de visões relativistas da vida, que afirmam não existir, na prática, uma verdade objetiva que precisa ser descoberta através da educação. Quem pensa assim não percebe que está dando um cheque em branco para a mentira, matando a alma do aluno e a da escola. Mais cedo ou mais tarde, as paixões e tudo o que elas trazem consigo, para tristeza de todos, as asfixiarão.

João Malheiro, doutor em Educação pela UFRJ. E-mail: malheiro.com@gmail.com

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