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A presidente Tsai Ing-wen, durante as comemorações do Dia Nacional taiwanês
A presidente Tsai Ing-wen, durante as comemorações do Dia Nacional taiwanês| Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

Historicamente, nações lutam para se tornar independentes de um império ou de uma metrópole. Essa foi a história de parte da África e de toda a América. Entretanto, o caso de Taiwan é especial, pois essa ilha luta para manter-se independente da China continental já há algum tempo.

Com o fim da Dinastia Qinq, na China continental – algo que durou cerca de 2 mil anos –, e com a disputa pelo poder entre os comunistas e os nacionalistas pelo poder na China da década de 1940, a vitória dos comunistas formou, no continente, a República Popular da China. É o país que conhecemos hoje como potência comunista e foi liderado por Mao Tsé-Tung. A derrota dos nacionalistas no continente forçou a fuga do nacionalista Chiang Kai-Shek e outros líderes para a ilha de Taiwan, formando a República da China, um território independente, democrático e com características bastante especiais. Logo, na prática existem duas Chinas; essa visão, contudo, é algo inadmissível para Pequim, e este é um dos maiores problemas da atualidade.

Surgimento de conflitos com escala internacional também sugere que os maiores problemas geopolíticos e militares devem emergir da Ásia.

A rápida industrialização e o notório crescimento de Taiwan durante a segunda metade do século 20 foram chamados de “Milagre de Taiwan”; hoje o país é considerado um dos “quatro tigres asiáticos”, ao lado de Hong Kong, Coreia do Sul e Cingapura. O domínio japonês antes e durante a Segunda Guerra Mundial gerou mudanças nos setores público e privado, principalmente na área de obras públicas, o que possibilitou comunicações rápidas e facilitou o transporte em boa parte da ilha. Os japoneses também melhoraram a educação pública e a tornaram obrigatória para todos os residentes de Taiwan.

Em 1945, a hiperinflação estava em alta na China continental e em Taiwan, como resultado da guerra contra o Japão. Para isolar Taiwan do continente, o governo nacionalista criou uma nova área monetária para a ilha e iniciou um programa de estabilização de preços. Esses esforços reduziram significativamente a inflação.

Hoje, Taiwan tem uma economia dinâmica, capitalista e voltada para a exportação, com envolvimento do Estado gradualmente decrescente em investimentos e comércio exterior. Seguindo tal tendência, alguns grandes bancos públicos e empresas industriais estão sendo privatizados. O crescimento real do PIB foi, em média, de aproximadamente 8% durante as últimas três décadas. As exportações forneceram o principal impulso para a industrialização. O superávit comercial é substancial, e as reservas estrangeiras estão em torno de US$ 540 bilhões – a quinta maior reserva do planeta, enquanto no Brasil temos cerca de US$ 370 bilhões e estamos em 11.º lugar.

Com esse rápido desenvolvimento, Taiwan, Hong Kong e Macau, territórios com língua chinesa independentes, tornaram-se um problema para os comunistas, que acreditam na política de “uma única China”. Macau nunca foi um grande problema para o modelo “um país, dois sistemas”; recentemente, Hong Kong está cada vez mais dentro do sistema continental comunista chinês, graças à nova Lei de Segurança Nacional. No entanto, esses dois territórios foram devolvidos à China continental dentro de um contexto de ex-colônias do Reino Unido e de Portugal. Por outro lado, Taiwan nunca passou por essa situação, apesar do período da ocupação japonesa. A ilha sempre foi independente da China comunista continental, e Pequim considera a ilha uma província rebelde, de modo que apenas 14 nações do planeta têm laços oficiais com Taiwan, embora o país negocie e tenha, na prática, prestígio de nação independente diante de toda a comunidade internacional.

Europeus, americanos e japoneses, apesar de não se envolverem diretamente para apoiar um processo de independência mais forte de Taiwan, pressionam Pequim para manter o status quo da situação, principalmente no Mar da China, onde a situação vem se agravando nos últimos meses. Recentemente, Pequim mandou 50 caças militares para a região, mostrando poder de intimidação e alertando para o fato de que poderia, em breve, tomar a ilha pela força, se necessário, por mais que, no aniversário de 110 anos do fim das dinastias imperiais chinesas, Xi Jinping tenha colocado a “independência de Taiwan” como um dos maiores desafios da “reunificação chinesa”, afirmando que procuraria realizar essa reunificação por meios pacíficos.

Já para a presidente de Taiwan, Tsai Ing-Wen, “Taiwan não deseja confronto militar e espera uma convivência pacífica, estável, previsível e mutuamente benéfica com seus vizinhos. Todavia, Taiwan também fará o que for preciso para defender sua liberdade e seu modo de vida democrático”. A ilha gasta mais de 15% do orçamento nacional em armas militares, compradas principalmente dos Estados Unidos, seu importante parceiro comercial, militar e político na região. As relações entre Taipé e Pequim nunca estiveram tão desgastadas e conflitos militares podem ocorrer, gerando uma intensa desestabilização na região e envolvendo players regionais, como a Rússia e o Japão.

Muitos pesquisadores e economistas especularam que o século 21 seria o século da Ásia pela ascensão da China e da Índia sob o ponto de vista econômico e social. Entretanto, o surgimento de conflitos com escala internacional também sugere que os maiores problemas geopolíticos e militares devem emergir da Ásia, e isso deverá provocar um ponto de inflexão entre europeus, americanos e também aqui no Brasil, principalmente pela nossa importante relação no grupo dos Brics.

Igor Macedo de Lucena é economista e empresário, doutorando em Relações Internacionais na Universidade de Lisboa, membro da Chatham House – The Royal Institute of International Affairs e da Associação Portuguesa de Ciência Política.

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