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| Foto: Marcos Tavares/Thapcom

Atualmente, algumas de nossas universidades públicas têm verdadeira aversão à aproximação com o setor produtivo e com os governos. Dessa maneira, quantidade expressiva de trabalhos acadêmicos desenvolvidos no Brasil acaba sem valor de mercado; vários deles, estritamente teóricos, não têm qualquer aplicação prática.

É claro que não se deve negligenciar a importância da pesquisa pura. No entanto, nosso país é tão extremamente carente em tantas áreas (saúde, segurança, educação e infraestrutura) que passa a ser um desperdício de talentos não utilizar o elevado potencial de cérebros e conhecimento das nossas instituições de pesquisa e ensino superior para minimizar tais deficiências.

Marcos Cesar Pontes, tenente-coronel na reserva da Força Aérea Brasileira, foi o primeiro astronauta do país a ir ao espaço. A partir de janeiro de 2019, ele vai gerir o Ministério da Ciência, Tecnologia e Comunicações no governo Jair Bolsonaro. Uma das medidas que Pontes já anunciou é a busca de aporte de dinheiro privado em instituições afins e a aproximação de todas as universidades com a iniciativa privada e com os governos.

Os brasileiros precisam tomar consciência de que nossas instituições públicas de ensino e pesquisa custam bastante para a população

É certo que a necessidade crescente de conhecimentos científicos e tecnológicos para alcançar progresso e o encurtamento do ciclo das inovações demanda práticas de cooperação entre os atores envolvidos no processo de geração, manutenção e difusão de competências e inovações: a chamada “hélice tríplice”, conceito do qual vários países mais adiantados já se valem. Com ele, setor produtivo e governo se voltam às universidades visando obter soluções para seus problemas. E os resultados são comumente excelentes! Muitos bons projetos já foram e são desenvolvidos pelas universidades, ou por esses atores em conjunto. Nesse arranjo, governos e empresas suprem as necessidades práticas, sem o quê trabalhos acadêmicos de aplicabilidade concreta morreriam nas prateleiras das bibliotecas universitárias, sem gerar real valor socioeconômico.

Ademais, há hoje um amplo entendimento sobre as limitações dos governos para gerar desenvolvimento sustentável, rápido, efetivo e de excelência. Até há pouco, essa discussão centrava-se em torno de apenas dois atores, que juntos poderiam fomentar mudanças e benefícios à sociedade: governos e iniciativa privada (note-se o crescimento do número, no país, de Parcerias Público-Privadas, PPPs). Porém, atualmente, percebe-se o elevado potencial de contribuição das universidades para o desenvolvimento socioeconômico do país, de suas regiões, estados e municípios, em particular quando há demanda por projetos de desenvolvimento científico-tecnológico.

O estímulo à realização de projetos dessa natureza está centrado no argumento de que tais interações favorecem o acesso aos conhecimentos e habilidades científico-tecnológicas dos parceiros, além de minimizarem os riscos financeiros inerentes às atividades de pesquisa e desenvolvimento, ao mesmo tempo que possibilitam novo aporte de recursos a essas atividades.

Leia também: Os eixos do governo Bolsonaro (editorial de 11 de novembro de 2018)

Leia também: A tecnologia e o futuro do emprego (artigo de José Pio Martins, publicado em 29 de março de 2018)

Assim, a estratégia da hélice tríplice ‒ em que governos, universidades e empresas se unem em prol do desenvolvimento social, econômico, científico e tecnológico ‒ tem sido amplamente utilizada para convencer as universidades a cooperar com o setor privado e com os governos, trazendo mútuos benefícios duradouros.

No entanto, no Brasil, o aumento da consciência sobre a necessidade de transferir à sociedade os resultados da pesquisa e desenvolvimento financiados com recursos públicos ainda não tem sido acompanhado de ações concretas. Faltam medidas para viabilizar essa transferência de conhecimento, o que levaria à absorção, pelos demais atores, do que é gerado na universidade. Tal cenário agrava-se pela carência de canais, institucionais ou não, de intercâmbio entre esses agentes, o que acaba acentuando a desvinculação entre a oferta e a demanda, acarretando desperdício de conhecimentos e tecnologias com possível interesse público, social ou econômico.

Marcos Pontes está fazendo uma excelente proposição. Os brasileiros precisam tomar consciência de que nossas instituições públicas de ensino e pesquisa custam bastante para a população, que as financia. E as próprias universidades ou centros de pesquisa particulares não podem se omitir de exercer o papel social que lhes é inerente. É crucial que tais instituições devolvam à sociedade parte desse investimento ou ofereçam parcela de suas conquistas no cumprimento de seus papéis sociais. Assim, hão de gerar produtos e serviços inovadores para governos e empresas, amenizar nossas carências e promover o desenvolvimento que todos almejamos.

Marcos de Lacerda Pessoa, mestre, Ph.D. e pós-doutor em Engenharia, é autor de “Sementeira de Inovação”, organizador e editor de “Pinceladas de Inovação”, proprietário do centro de apoio à inovação futuri9.com e da aceleradora de projetos de energia Octane.
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