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| Robson Vilalba/Thapcom
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A mais recente eleição da OAB–Paraná experimentou saudável disputa entre duas chapas, a XI de Agosto e a Algo de Novo. Nada obstante o calor e o natural entusiasmo em alguns momentos, fato é que o debate, por si só, é sempre positivo. Como se dá na academia, nos esportes e na política, também a OAB precisa ser submetida a desafios. Nem sempre é fácil ou agradável, mas todos necessitamos ser postos à prova, refletir empaticamente e entender quais são as propostas dos que pensam diferente. Disso é feita a democracia.

Afinal, a OAB–PR tem passado, presente e futuro de glórias quando o assunto é democracia. Basta que pensemos na Conferência Nacional, promovida em Curitiba em 1978, que conclamou a volta do Estado Democrático de Direito, e no apoio dado à série de reportagens desta Gazeta do Povo sobre os “Diários Secretos” da Assembleia Legislativa, que culminou no ato público “O Paraná que Queremos”, em 2010. As gestões mais recentes – e também as oposições – têm prestigiado essa característica que tanto nos honra. O exercício da profissão de advogado tem representantes que justificam a razão de ser da OAB.

As ditaduras, em suas mais variadas formas de expressão, sempre agridem aqueles que guardam segredos invioláveis

Mas, hoje, há um tema cuja importância ressalta, eis que unânime na recente disputa eleitoral. Se algo uniu as duas chapas, foi a defesa das prerrogativas – constitucionais, legais e estatutárias – da advocacia. É sintomático que tal assunto tenha unido ambos os programas. Isso é muito bom, mas revela algo desalentador. Não se trata de capricho ou acaso. Lamentavelmente, muitas das autoridades constituídas – que receberam os seus poderes das mesmas fontes normativas que garantem o exercício da advocacia – têm violado as imunidades e direitos dos advogados. Não são poucos os casos de quebra de sigilo cliente-advogado; violação a documentos e desprezo à dignidade primária de todos e de cada um dos profissionais da advocacia. Tais desvios têm se intensificado ultimamente, colocando em foco a razão de ser da defesa de tais direitos fundamentais da profissão.

Isso porque as prerrogativas não existem em favor do advogado, mas sim da dignidade da justiça e de todas as autoridades constituídas. Tais garantias dirigem-se ao exercício de profissão “indispensável à administração da justiça”, como diz o artigo 133 da Constituição. São privativas do advogado e indisponíveis: nem que queira, pode o advogado abdicar delas. Não está na sua esfera de disponibilidade. Por isso que a OAB há de defender o advogado, inclusive dele próprio. O que está em jogo, portanto, não é o sujeito advogado, mas a segurança de profissão própria de Estados que se pretendam Democráticos de Direito.

Opinião da Gazeta: O futuro da OAB-PR em jogo (editorial de 20 de novembro de 2018)

Leia também: OAB, democracia e impeachment (artigo de Estefânia Maria de Queiroz Barboza, publicado em 4 de abril de 2016)

Afinal, as ditaduras, em suas mais variadas formas de expressão, sempre agridem aqueles que guardam segredos invioláveis. Frequentemente buscam vergar o sigilo que caracteriza algumas profissões. Assim como acontece com padres, médicos e psicólogos, os advogados recebem informações que não podem compartilhar com terceiros, sob pena de subverter a confiança que lhes é depositada. Ocorre que, nos dias de hoje, tais dados são transmitidos pessoalmente, mas também por telefone, e-mail, WhatsApp e demais mídias digitais. Todos este conjunto de meios de comunicação não pode ser profanado por quem quer que seja – nem mesmo pelo próprio advogado. O que se diga das demais autoridades constituídas.

Assim como as imunidades da magistratura, do Ministério Público e da imprensa dizem respeito à defesa das instituições (e não deste ou daquele juiz, promotor ou jornalista), o mesmo se diga da proteção – institucional e intransigente – que a OAB tem o dever de prosseguir em favor do livre exercício da advocacia. Tão grave quanto remover o juiz da comarca contra a sua vontade, impedir que o promotor ofereça a denúncia criminal ou proibir que certa reportagem seja publicada, é a violação da dignidade da advocacia. Tais desrespeitos têm o mesmo odor, pois cheiram a fascismo: o governo de ameaças e proibições; do medo, pelo medo e para o medo. Os poderes constituídos que assim procederem estarão, quem sabe, respondendo a ansiedades instantâneas. Porém, atentarão contra as suas próprias garantias: a partir do momento em que desrespeitarem as prerrogativas da advocacia, estarão também violando o seu mister.

Leia também: Independência e dignidade na advocacia (artigo de Cássio Lisandro Telles, publicado em 11 de agosto de 2018)

Leia também: De Curitiba, um brado pela liberdade (artigo de José Augusto Araújo de Noronha, publicado em 15 de maio de 2018)

Como declarou em recente entrevista publicada na Folha de S. Paulo, o advogado norte-americano Ira Sorkin recebeu até ameaças de morte por ter defendido Bernard Madoff, condenado por fraude financeira que levou milhares de indivíduos à miséria. Disse ele que as pessoas “que criticam os advogados só criticam se não precisam de um advogado. Quando eles precisam, não são tão críticos. Há um certo nível de hipocrisia”. Aqui entra em cena a OAB, a fim de os defender das ameaças e fazer com que os advogados possam estar seguros em cumprir o mandato que lhes foi outorgado e colaborar no prestígio à ideia de justiça.

Assim como os agentes funerários, os advogados não devem se despedir de seus clientes dizendo “volte sempre!” ou “até breve!”. Espera-se que resolvam os problemas por meio de soluções que perdurem no tempo. Advogados bons são como bons encanadores: funcionam bem quando não nos lembramos deles. Mas, para que isso possa acontecer, precisam desenvolver sua profissão de modo destemido, sempre em favor daquele que lhe outorgou o sagrado mandato, sem qualquer discriminação ou preconceito. Por isso a OAB é importantíssima, ao conclamar todos os advogados a seguirem em frente, pois ela estará vigilante, a defender as prerrogativas indispensáveis ao exercício da profissão.

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