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O Ministro da Economia, Paulo Guedes, durante o seminário Declaração de Direitos de Liberdade Econômica – Debates sobre a MP 881/19.
O Ministro da Economia, Paulo Guedes, durante o seminário Declaração de Direitos de Liberdade Econômica – Debates sobre a MP 881/19.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A leitura dos 18 artigos e centenas de parágrafos, incisos e alíneas que compõem a MP 881, de 30 de abril de 2019, que “institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, estabelece garantias de livre mercado, análise de impacto regulatório e dá outras providências”, põe certo que não há quaisquer temas que digam diretamente às relações de emprego reguladas pela velha, recém “embotocada” (pela reforma de 2017) e ainda útil Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que rege algo como 34 milhões de trabalhadores e milhares de empresas no Brasil.

Já no Legislativo, com relatoria do deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS), a MP da Liberdade Econômica recebeu 301 (sim, 301) emendas, boa parte rejeitada e porção menor – mas significativa – acolhida. A MP tramita como Projeto de Lei de Conversão (PLC) 17/19.

Dentre as proposições do PLC há temas genuinamente trabalhistas, como a Carteira Digital; o trabalho em domingos e feriados; a exclusão de Cipa, conforme definido pela Secretaria do Trabalho; a aplicação da legislação trabalhista limitada a quem ganha até 30 salários mínimos; e, ainda, no tema do processo de multas administrativas, cogita criar Conselho Recursal Tripartite, para apreciar recursos contra multas por infrações à legislação trabalhista, um “Carf trabalhista”, por assim dizer.

Fique claro: de logo, a MP não trazia temas trabalhistas e as emendas parlamentares que tratam de tais questões, rigorosamente, podem ser consideradas como a “continuação” da reforma trabalhista que aconteceu no governo Temer.

Se as tais “emendas trabalhistas” forem votadas e transformadas em Lei, podem ser questionadas no Supremo Tribunal Federal

Adotando a linguagem coloquial que o Brasil está tristemente assimilando, sem qualquer resistência ou indignação, e já descambando para o tagarelar vulgar: Pode isso, Arnaldo?  Resposta: não.

Quando há relevância e urgência, a Constituição Federal permite que o presidente da República edite medida provisória, com força de lei ordinária, obrigado a prontamente encaminhá-la ao Congresso Nacional, pois é deste a missão constitucional de fazer leis, tanto que pode ele – o Parlamento –, por inação, levar à caducidade daquela iniciativa. Obviamente, também, é do Legislativo o poder de “emendar”, pela prerrogativa constitucional de ser ele o produtor de leis.

No caso em comento, é possível dizer que parte dos membros da Comissão Mista que analisou a MP da Liberdade Econômica viu e aproveitou a oportunidade de, no rescaldo, inserir o que supõe ter faltado na “reforma trabalhista” de 2017.

Parece razoável admitir que as tais “emendas” de cunho “trabalhista” são “jabutis” postos na árvore-tronco da MP da Liberdade Econômica e, rigorosamente, não tenham a necessária relação de pertinência, ou afinidade lógica (como ensinam os livros), com o objeto de sua proposição.

E, mais adiante, se as tais “emendas trabalhistas” forem votadas e transformadas em Lei, podem ser questionadas no Supremo Tribunal Federal, que indicou um norte na ADI 5.127-DF, com relatoria do ministro Edson Fachin, e na qual o STF decidiu que emendas de “conteúdo temático distinto daquele originário da medida provisória” são “prática em desacordo com o princípio democrático e com o devido processo legal (devido processo legislativo)”.

Que a Câmara e o Senado – como caixa de ressonância da sociedade – não acolham as “emendas” e, se estão convencidos de que a legislação trabalhista, reguladora de milhões de brasileiros, carece de alteração, emenda e nova reforma, que assumam o protagonismo que lhes cabe, nunca esquecendo que a atividade dialogal com os diretamente interessados é sempre necessária, se não prudente.

O meio ambiente – e os jabutis – agradecem. Empresários e trabalhadores também, eis que a ambos interessa a boa e velha segurança jurídica.

Hélio Gomes Coelho Júnior é advogado e professor de Direito do Trabalho da PUCPR.

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