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 | Alexandre de Mari/
| Foto: Alexandre de Mari/

Vivemos em tempos de absoluto relativismo, cuja consequência mais grave é a perda da consciência de si. Quem sou? Para que existo? Para onde vou? De onde vim? Todo ser humano carrega um sentido para existir e não encontra paz enquanto não estiver convicto do mesmo e pleno em sua realização.

É unânime o desejo em todos que buscam o processo terapêutico da descoberta de si; vêm com esta expressão: “estou aqui, pois quero saber quem sou”.

As pessoas encontram-se confusas quanto aos seus sentimentos, conceitos, perdendo-se em seus afetos e desafetos. Faltam-lhes referências da verdade. Sim, a verdade! Ela existe! Mas onde e como encontrá-la?

A verdade como referência mais elevada, onde encontram-se valores universais, está contida dentro do mais profundo de cada ser. Há uma dimensão na interioridade de cada um de nós, repleta de potências ainda por serem ativadas e atualizadas. Por isso nossa consciência, que é nosso Ser Mesmo, como descreve o filósofo Louis Lavelle, não repousa em paz, enquanto essas potências não forem atualizadas, deixando-nos a sensação de que algo falta ou que ainda estamos incompletos.

Assim nos diz Louis Lavelle: “Toda a infelicidade dos homens vem de que não existe nada mais difícil, para cada um deles, do que discernir seu próprio gênio. Quase todos o desconhecem, desconfiam dele, são ingratos para com ele. Empenham-se até em destruí-lo para colocar em seu lugar uma personalidade de empréstimo que lhes pareça mais espetacular. Todo o segredo da potência e da alegria consiste em descobrir-se e ser fiel a si mesmo, tanto nas menores coisas como nas maiores. Até na santidade trata-se de realizar-se. Quem desempenha melhor o papel que é o seu, e que não pode ser desempenhado por nenhum outro, é também o mais afinado com a ordem universal: ninguém pode ser mais forte ou mais feliz.”

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Essa essência é intacta no decorrer da nossa existência. Carregamos capacidades, potências, sabedoria. Em muitos momentos, clarões da verdade nos invadem, mas o mundo das ideias nos rouba desses clarões e logo essa verdade se esconde. Aí entra a necessidade das nossas relações, pois o convívio com o outro é que nos possibilita o encontro consigo mesmo e nesta dinâmica levamos o outro a tornar- se si mesmo.

Porém, as marcas que trazemos de nossas vivências, as referências distorcidas que carregamos, os condicionamentos aos quais nos sucumbem, nos desviam do nosso eu mais essencial. Do nosso eu mais puro.

Por consequência, não se consegue fazer o bem que se quer e faz-se o mal que não se quer.

Uma confusão muito frequente, devido às distorções que se carregam, ocorre na nossa capacidade de amar e ser amado; na vivência da afetividade e da sexualidade, que é apenas uma das expressões do amor. A construção dos laços afetivos nos primeiros anos de vida é determinante na forma de expressar e receber os afetos na vida adulta, então as pessoas passam a cobrar o afeto do outro no sentido de completar ou corresponder ao afeto que lhe foi rompido ou negado na infância. Motivo este de muitas frustações e sofrimentos nos relacionamentos.

Outro problema atual é a falta de sentido. Os jovens não estão sendo formados para encontrar um sentido na sua existência, ou seja, encontrar algo pelo qual valha a pena viver, gastar a vida. Para isso, é preciso o autoconhecimento e a consciência de seus talentos e potências. Infelizmente, eles estão sendo instruídos a ganhar dinheiro, a buscar o puro prazer, o que lhes afasta de uma autêntica realização, trazendo com isso, a frustração e o vazio existencial.

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Também a ansiedade, reforçada pela avalanche das redes sociais, onde a comunicação acontece de forma instantânea, é um problema. Pois estamos perdendo com isso a paciência, a espera, quando o resultado de algo depende dos processos humanos. Percebem-se pessoas doentes física e emocionalmente devido ao problema da ansiedade.

A desestruturação das famílias, como consequência da falta de referencial da vocação da mulher enquanto mãe e esposa/companheira, bem como a falta de referencial da vocação do homem enquanto pai e esposo/companheiro, tem deixado nossas crianças, adolescentes, jovens sem uma identidade própria. Pois não têm referência de quem eles podem e devem ser. Irão encontrar referência na massa, na sociedade, onde por N razões lhes dão uma referência distorcida e contrária a sua própria essência, o que agrava mais ainda suas confusões.

É frequente encontrar na desestrutura do ser humano a negação do que se é para não ser como o pai e como a mãe, principalmente na capacidade de amar dos mesmos, e então não conseguem ser o que se deveria ser na sua essência.

Esses são alguns pontos pelos quais se faz necessário uma psicoterapia que oportunize a pessoa a encontrar essas referências saudáveis. Encontrar seu gênio e, acima de tudo, a tomar consciência de si e do sentido de sua existência, para fazê-la valer a pena. Um processo terapêutico que permita este olhar pra dentro de si e encontrar ali a mais linda e preciosa obra de arte que o “escultor” da vida humana poderia ter esculpido, com um propósito irrepetível e único. Afinal, esta vida não é um rascunho, já é nossa escrita definitiva.

Liseane Selleti é psicóloga, formada pela PUC/PR, especialista em Terapia Comportamental Cognitiva, especialista e preceptora do método ADI/TIP, membro do grupo de estudos: Edith Stein e questões de gênero e frequenta disciplinas isoladas no programa do PPT mestrado e doutorado em Teologia-PUC/PR.
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