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Um remédio preventivo para essas "doenças", que progridem como epidemias, consiste na prática dos valores morais, e o primeiro deles é o da Regra Áurea

Sei que você tem dinheiro aqui, em algum lugar da casa, é melhor dizer onde está!

Já disse que juntamos todo o dinheiro. Não temos mais nenhum dinheiro!

Assim respondia a senhora octogenária, tentando conter o seu pânico, diante de um casal jovem que havia entrado na sua casa para roubar. O rapaz parecia mais equilibrado; a moça estava totalmente alterada e, com certeza, drogada. Ao mesmo tempo em que espetava o canivete aguçado no pescoço da senhora, gritava: "Ou você me dá o dinheiro, ou eu te mato". A idosa lhe disse que poderia revirar a casa, pois realmente não tinha mais nada. E assim, tal jovem revirou gaveta por gaveta. Não se sabe como, a moça desistiu e o casal se foi.

Esse episódio poderia ter sido inventado, mas não foi. Poderia ter um desfecho trágico, mas não teve. No entanto, faz pensar na questão da psicologia da violência. O seu centro motivador pode variar muitíssimo, a lembrar, por exemplo, do episódio, de Crime e Castigo de Dostoievski. Conta que, Raskolnikov, um jovem estudante, intelectual, que encarnava algo de Maquiavel e Nietszche, achava-se um super-homem. Para realizar a sua sina de transformação social, necessitava de dinheiro, e para isso: "Porque não matar uma velhinha ruim e avarenta, e usar o seu dinheiro para um fim mais nobre?" Fato é que sucumbiu à tentação e cometeu o crime. No entanto, algo não saiu como previa. Foi visto pela sobrinha da agiota perversa. Se o primeiro crime foi planejado, e friamente cometido, o segundo, o de matar a sobrinha inocente, foi fruto do infortúnio.

O criminoso, que se achava acima do bem e do mal, experimentou algo imprevisto. Mesmo sem outras testemunhas começou a ser atormentado pela sua própria consciência, e aí iniciou o seu castigo.

Os fatores motivadores da violência são muito variáveis. Entretanto, na volúpia pela droga pode acontecer de tudo. O atrativo não se apoia simplesmente na curiosidade pelo proibido. Qual é o fator decisivo da procura? É a dependência criada pela droga. Esse imperativo da psicologia alterada leva a inúmeros crimes. Se no caso de Raskolnikov, a causa foi um sentido deformado sobre a sua existência, no caso da drogadição, o fator decisivo é a ausência de sentido existencial que propicia a vulnerabilidade das crianças e jovens. Viktor Frankl, o fundador da logoterapia, conseguiu comprovar a correlação da incidência da drogadição, com a falta de sentido ou significado para a própria existência. O projeto existencial elevado, comparativamente ao projeto de vida medíocre, reduz a incidência de drogadição.

Comprovamos a crescente incidência das neuroses de massa como a depressão, a agressão e a toxicodependência. Todas se intensificam atualmente devido à falta de objetivos de vida.

A intensificação da violência, da drogadição e da erotização, que verificamos nos noticiários, são a ponta do iceberg. A causa está no aspecto invisível. A crise de valores morais que assola a família e a sociedade, a falta de perspectiva de muitos jovens, faz pensar na necessidade de atores sociais preparados para abrir perspectivas de sentido e significado às pessoas.

Um remédio preventivo para essas "doenças", que progridem como epidemias, consiste na prática dos valores morais, e o primeiro deles é o da Regra Áurea. Significa aprender a querer o bem dos outros como se quer o próprio. À medida que disseminamos a sua vivência, no âmbito familiar e escolar, é possível aumentar a densidade de solidariedade compartilhada na sociedade. Olhar para a parte imersa do iceberg é o trabalho preventivo de formular políticas públicas, e isso exige a preparação de profissionais que promovam a educação para o sentido e significado da existência pessoal e da sociedade.

Paulo Sertek, professor da FAE, doutor em Educação pela UFPR e autor dos livros Responsabilidade Social e Competência Interpessoal; Empreendedorismo; e Administração e Planejamento Estratégico. E-mail paulo-sertek@uol.com.br+

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