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Durante mais de 40 anos de monopólio estatal, as reservas provadas de petróleo do Brasil não ultrapassaram 2 bilhões de barris, e o país era obrigado a importar quase todo o óleo necessário para movimentar sua frota de veículos e sua indústria. Qualquer choque de preço internacional, como os decretados pela Opep em 1973/74 e 1979/80, empobrecia os brasileiros, turbinava a inflação e aumentava a dívida externa.

O monopólio também inibiu o financiamento da pesquisa e a exploração de novas reservas.

Há pouco mais de 10 anos, esse quadro mudou, graças à Emenda Constitucional n.º 9 e à Lei 9.478, de 1997: o monopólio foi flexibilizado, a abertura de concorrência de empresas nacionais e internacio­­nais tornou a Petrobras mundialmente competitiva e possibilitou a conquista da autossuficiência.

Nesse período, as reservas provadas atingiram 12,6 bi de barris, a produção quase dobrou, e a participação do petróleo no PIB pulou de 3% para 12%. Tudo isso se deu no marco regulatório do modelo de concessão, em que as empresas concorrem dentro das normas estabelecidas pela Lei de Licitações e sob fiscalização da Agência Nacional de Petróleo (ANP).

É lamentável que, para aproveitar a riqueza do pré-sal, queira o governo Lula abandonar esse modelo vitorioso, como indicam os projetos de lei que submeteu ao Congresso. Assim, o PL 5.941/09 estabelece o monopólio da Petrobras nas áreas do pré-sal e aumenta a participação da União no capital de empresa, com a finalidade de consolidá-la como seu acionista majoritário. Já o PL 5.938/09 troca o regime de concessão (Poder Público remunerado pelas companhias petrolíferas em dinheiro, com royalties; participações especiais; aluguel das áreas exploradas; bônus de assinatura para a participação nas licitações; e impostos) pelo de partilha de produção (as empresas ficam com parte da produção para fazer frente aos custos e garantir seu lucro e entregam a outra parte ao governo, em barris de petróleo). Enfim, o PL 5.939/09 cria a estatal Petro-Sal, encarregada do gerenciamento dos contratos de partilha e da comercialização da parte de petróleo e gás no pré-sal correspondente ao go­­verno. Em miúdos: sem um único centavo investido, nem a menor responsabilidade pelo sucesso/fracasso do empreendimento, a Petro-Sal, ainda assim, participará de comitê de gestão do pré-sal, com metade dos integrantes e poder de veto sobre todas as decisões de exploração e produção!

Para a Petro-Sal está previsto quadro de 130 funcionários, a serem contratados muito antes de as novas reservas virem a ser comercialmente viabilizadas, algo esperado apenas para os próximos 7 a 9 anos. Quando foi criada, em 1972, a Infraero esperava funcionar com 600 empregados. Hoje, sua folha de pagamento sustenta 28 mil servidores. O perigo de inchaço, "captura" político-partidária e corrupção é uma ameaça real!

O governo pretexta haver-se inspirado na estatal norueguesa Petoro (só 70 funcionários) para modelar a Petro-Sal, mas não é verdade. A Petoro foi criada para administrar fundo soberano formado pelas receitas de participação do Estado na exploração do petróleo, com a missão primordial de financiar as despesas da previdência social no longo prazo. Aqui, a Petro-Sal vai participar, não nos riscos, mas apenas nos resultados, deixando para a Petrobras o monopólio do risco... E, como a concepção da Petro-Sal evidencia, já pensa em "gastar por conta" de recursos cuja exploração levará anos. (Detalhe: a Noruega opera no regime de concessão e sem exclusividade.)

Por fim, a visão governista do pré-sal alimenta a velha ofensiva do PT contra as agências reguladoras, concebidas na era FHC para fiscalizar a infraestrutura a salvo de pressões eleitoreiras. Ao propor que a Petro-Sal se encarregue da gestão de contratos, hoje exercida pela ANP, o Planalto pretende esvaziar a agência. No mais, o alarido marqueteiro esconde o perigo de retrocesso para a nossa matriz energética, até agora bem mais verde que a média mundial, graças a fontes limpas e renováveis como a hidreletricidade e a biomassa. Se estimulado a esbanjar as reservas do pré-sal, o Brasil cairá na rabeira da nova tendência mundial de descarbonização das economias para redução das emissões de efeito estufa.

Eduardo Sciarra é deputado federal pelo DEM/PR e presidente da Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara

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