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| Foto: Marcos Santos/USP Imagens

É sempre bom lembrar o papel do Banco Central do Brasil (BC), atribuído pelo Decreto 3.088 de 1999: estabilidade monetária via metas de inflação. A autoridade monetária brasileira recebe uma meta do Conselho Monetário Nacional e deve usar seus instrumentos – basicamente, a taxa de juros Selic – para atingir somente a meta de inflação. Obviamente o BC acumula outras funções, como supervisão do sistema bancário, mas, em termos de política monetária, seu objetivo é garantir a inflação na meta.

Apesar do clamor de diversas figuras públicas para que o BC reduza os juros para estimular a atividade, já que estamos em uma profunda recessão, qualquer movimento nesse sentido é um equívoco. Baixar os juros para que a atividade econômica melhore em detrimento da meta de inflação é, em termos gerais, não só um erro de política monetária, mas também uma falácia econômica. Já vimos esse filme antes e não queremos pagar o ingresso e a pipoca novamente.

Dito isso, vamos ao que interessa: em sua mais recente reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) finalmente reduziu a Selic de 14,25% para 14%, pois viu que as condições necessárias para redução dos juros estavam dadas, mesmo que a inflação neste ano esteja projetada para fechar acima da meta.

Somente o fato de o BC voltar a cumprir seu papel de entregar a inflação na meta em 2017 já é motivo de comemoração

Tais condições foram mencionadas na reunião anterior e no Relatório Trimestral de Inflação, quando a autoridade monetária deixou bem claro que a queda dos juros somente ocorreria caso os preços dos alimentos dessem um alívio; a questão fiscal fosse equacionada; e os preços mais sensíveis à taxa de juros mostrassem certo arrefecimento.

Dito e feito! Como todos estão acompanhando, a famigerada PEC 241 (a do teto de gastos) está em vias de ser aprovada, o que garante a materialização da segunda condição. Faltavam as outras duas. E o que vimos nos dados de inflação em setembro surpreendeu a todos e parece ter dado o sinal verde para uma redução dos juros. O mercado esperava inflação de 0,25% no mês e o IPCA veio abaixo disso: 0,08%. E com números ainda mais animadores para os alimentos (queda no mês e dissipação do aumento anterior, na avaliação do BC) e para os preços sensíveis à política monetária – leia-se serviços.

Apesar de ser somente um mês, algo muito importante em política monetária parece que está voltando à normalidade e permitiu tal movimento: as expectativas para a inflação. As projeções para o IPCA estão em queda e em 2017, segundo dados de mercado e simulações do BC, retornaremos à meta de 4,5%, algo não atingido desde 2009. Parte da formação dessas expectativas se dá não somente pelos dados econômicos, mas também pela seriedade da equipe econômica no cumprimento da meta. Isso mesmo: em política monetária, tão importante quanto usar corretamente os instrumentos à disposição é demonstrar conhecimento do problema e de suas soluções.

A queda dos juros ainda é pequena. Somente 0,25 ponto porcentual parece não afetar o bolso das pessoas imediatamente, mas o que está em jogo é o início de um ciclo de queda da Selic, permitido pela expectativa menor de inflação. Isso nos deixará ao fim de 2017, segundo projeções, com juros reais (taxa Selic menos IPCA) na casa dos 6%, perto de nossa média histórica. O que isso significa? Inflação em 4,5% e Selic em 10,5%.

Apesar da muito bem-vinda queda, não esperemos que isso seja responsável por estimular a economia brasileira. Somente o fato de o BC voltar a cumprir seu papel de entregar a inflação na meta em 2017 , ainda mais com taxa de juros em queda, já é motivo de comemoração. Afinal, após anos de leniência com a inflação e voluntarismo com a taxa de juros, o BC retornar ao seu papel de guardião da moeda já vale uma celebração.

Leonardo Palhuca é mestre em Economia pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg e editor do site Terraço Econômico .
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