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O Banco Central Europeu procura a estabilidade de preços na Zona do Euro e tem sua sede em Frankfurt, na Alemanha.
O Banco Central Europeu procura a estabilidade de preços na Zona do Euro e tem sua sede em Frankfurt, na Alemanha.| Foto: Bigstock

Sempre tive grande admiração pela Alemanha. Visitei o país algumas vezes, li sua história, analisei seus feitos e sempre admirei a capacidade espetacular do povo alemão em conseguir se recuperar, em muito pouco tempo, de derrotas e fracassos monumentais. Primeiro, intriga-me que a Alemanha tenha oferecido ao mundo poetas de alto nível, escritores fantásticos, os maiores nomes da música clássica, cientistas geniais e os maiores nomes da filosofia mais refinada, ao mesmo tempo em que se tornou um celeiro na produção de máquinas e equipamentos da mecânica pesada.

Em segundo lugar, sempre me perguntei como pôde a Alemanha ter percorrido, com sucesso, um caminho difícil e duríssimo: foi derrotada na primeira guerra mundial (1914-1918), castigada com pesada punição imposta pelo Tratado de Versalhes (pelo qual perdeu território e sofreu elevada multa financeira), passou por uma hiperinflação demolidora entre 1921 e 1923, foi impactada pela grande depressão dos anos 1930, elegeu Hitler em 1933 e, em apenas seis anos, apareceu diante do mundo como um gigante militar, iniciou a Segunda Guerra Mundial em 1939, e foi longe na tentativa de dominar grande parte do mundo.

Vi muita gente apressada tentando explicar esse fenômeno. Li autores dizendo terem encontrado a explicação, mas ao final ninguém conseguiu explicar satisfatoriamente a conexão última entre causas e efeitos. Sabe-se que Stálin aliou-se à Hitler e o ajudou a rearmar o país com a intenção de deixá-lo fazer o trabalho sujo de invadir e tomar países para, depois, a União Soviética ter o trabalho de atacar apenas a Alemanha e estender o império comunista por toda a Europa, e além dela.

Em palestra que fiz, falei a respeito desse assunto e um ouvinte reagiu dizendo que Stálin nunca ajudou Hitler no rearmamento da Alemanha, e que essa tese era um delírio. Sugeri a ele que lesse ao menos o livro O Grande Culpado – O Plano de Stálin para iniciar a Segunda Guerra Mundial, escrito por Viktor Suvorov (1947-), ex-oficial de inteligência militar soviética que desertou para o Reino Unido e publicou vários trabalhos sobre a história da guerra.

Suvorov conta que Stálin já tinha data planejada para atacar a Alemanha, e seria em agosto de 1941. Stálin enviou tanques potentes, de forma camuflada, até as fronteiras da Alemanha, mas errou ao não prever a descoberta de seus planos pelo serviço de espionagem alemã, coisa que acabou acontecendo. Hitler foi informado dos planos de Stálin, este tentou invadir a Alemanha antes que o governo nazista pudesse reagir, mas não conseguiu e, em 22 de junho de 1941, o exército alemão invadiu a Rússia.

Viktor Suvorov, que está vivo, faz seu relato baseado em documentos secretos dos arquivos da ex-URSS, que ele conhecera por dentro durante os anos que lá trabalhara. O resto da história é conhecido. Hitler cometeu erros, suas tropas foram castigadas pelo frio na invasão da Rússia, e foram derrotadas. Hitler suicidou em 29 de abril de 1945, e a guerra acabou. De novo, nas duas décadas seguintes a Alemanha se recuperou magistralmente, aderiu à democracia, implantou um capitalismo liberal e tornou-se uma das maiores potências econômicas desde os anos 1970.

Pois bem, agora, a revolução tecnológica está assombrando nações inteiras, as estruturas produtivas estão mudando, e a Alemanha está assustada e temendo ser deixada para trás na corrida tecnológica e na nova economia. A própria primeira-ministra Angela Merkel se pronunciou recentemente alertando para o risco de a Alemanha perder a corrida e ficar para trás, fazendo coro com economistas, empresários e líderes classistas. O alerta veio acompanhado de algumas intrigantes constatações.

Na Alemanha, não há empresas parecidas com a Amazon, Apple, Google e outras gigantes da nova economia. Há 20 anos, o valor de mercado da Apple era 10% do valor da Siemens, que era a maior empresa alemã. Hoje, a Apple sozinha supera as 30 maiores empresas da Alemanha. Esse fato é, segundo matéria do jornal Valor Econômico, mais do que uma singularidade estatística, é um exemplo do risco que a economia alemã corre de ser deixada para trás na revolução tecnológica do século 21.

O chefe da consultoria europeia Interbrand, Simon Thun, declarou que existe a consciência de que a Alemanha pode ser o próximo dinossauro. Carsten Brzeski, economista do ING Bank, afirmou: “O quadro global é o de que perdemos o trem em termos de tecnologia. Os próximos 20 anos serão dominados pelo comércio eletrônico, pela internet das coisas e pela inteligência artificial. Em todas essas áreas, a Alemanha está atrasada”. Se a Alemanha está tão assustada, o que pensar do Brasil?

De qualquer forma, a julgar pela história, em pouco tempo o povo alemão vai, de novo, promover surpreendente recuperação e manter seu país no topo das nações desenvolvidas. Quanto a nós, brasileiros, bem... seguiremos lutando contra nossos velhos problemas, alguns típicos do século 19.

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.

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